As férias dos juízes

O Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Cezar Peluso, traz mais uma vez à tona a sua defesa institucional do fim das férias de sessenta dias dos juízes (não obstante a sua posição pessoal favorável).

Em anterior entrevista ao “Consultor Jurídico”, o Ministro Cezar Peluso fora enfático:

“Pouco antes de assumir a presidência, o senhor afirmou que defenderia a redução das férias dos juízes, de 60 para 30 dias. O que aconteceu?
Cezar Peluso — Já fui ao Senado, já respondi em audiência pública sobre isso. Tem um projeto que está lá para ser analisado.
Sua posição continua igual?
Cezar Peluso — A mesma. Eu acho que o juiz brasileiro trabalha muito. Acontece que a sociedade hoje é tal que soa como um privilégio [as férias de 60 dias] e isso não é bom para o prestígio da magistratura. Eu acho que férias de 30 dias é o ideal. Mas, pensando sobretudo nos advogados sugiro que haja 30 dias de férias para o juiz e, para todos, tem que haver um período de recesso onde os próprios advogados possam ter férias.”
(in http://www.conjur.com.br/2011-jun-27/peluso-defende-recesso-advogados-20-dezembro-10-janeiro).

Entidades representativas de magistrados levantam-se contra a ideia e apresentam justificativa para as férias dos magistrados serem de sessenta dias, e não trinta, como sucede com as demais carreiras do serviço público e com os trabalhadores em geral.

Com efeito, a Associação dos Magistrados Federais (AJUFE) sustentou, em nota, que

"Os juízes brasileiros são responsáveis pelo estudo e julgamento dos processos que lhe são distribuídos e são cobrados pelo cumprimento de metas arrojadas, estando constantemente sujeitos a jornadas de trabalho superiores a 40 horas semanais, além dos plantões forenses e da frequente necessidade de trabalhar durante os finais de semana e feriados, sem qualquer compensação financeira (…)
(…)
Entende a Ajufe que as férias de 60 dias são, portanto, uma justa compensação por não terem direito à jornada fixa semanal de trabalho nem ao recebimento de horas extras, compatível, inclusive, com regimes de trabalho adotados pela iniciativa privada para funções similares.”

(confira em http://www.pernambuco.com/ultimas/nota.asp?materia=20110727141847&assunto=81&onde=Brasil).

Ouso divergir. Não é que os motivos apontados pela AJUFE não sejam verdadeiros; ao contrário, é fato que magistrados, federais e estaduais, no país inteiro, são extremamente dedicados e comprometidos com a importante função jurisdicional que exercem, trabalham mais de quarenta horas por semana, dão plantões, levam trabalho para casa e trabalham nos fins de semana e feriados.

Todavia, essa realidade de compromisso com a causa pública, de submissão a extenuantes jornadas de trabalho e alto nível de responsabilidade nas funções que exercem não é exclusividade dos magistrados; para citar exemplos em outras áreas que não propriamente jurídicas, registre-se o caso de médicos e enfermeiros, controladores de vôo, policiais civis e militares, que, a despeitos de submissão a uma mesma sorte de pressões e responsabilidades, possuem férias de trinta dias, como os demais trabalhadores.

Nesse sentido, o sempre preciso jornalista JÂNIO DE FREITAS:

“As tensões e responsabilidades dos que julgam são acompanhadas, por exemplo, pelas dos cirurgiões, as dos que ficam 12 e mais horas no desconforto e nas apreensões de uma cabine de pilotagem, as dos obstetras, e as de tantas outras atividades em que mal há as férias normais. E, entre estas, aquelas nas quais os vencimentos e as aposentadorias integram as formas de injustiça e mesmo de humilhação” (“As marcas do atraso”, in Folha de São Paulo, caderno “poder”, página A8).

A garantia de acesso a um Poder Judiciário independente e efetivo é essencial ao Estado Democrático de Direito, e é uma garantia da sociedade. Para concretude dessa independência, os juízes gozam das prerrogativas constitucionais da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios. Além disso, no contexto brasileiro, os juízes são muito bem remunerados e desfrutam de uma estabilidade em suas vidas que o brasileiro médio gostaria de possuir. As férias de sessenta ou trinta dias não alteram o quadro de prerrogativas dos juízes. Noutras palavras: os juízes não serão menos independentes se passarem a gozar de férias de trinta e não de sessenta dias.

Ora, nesse quadro, a manutenção das férias de sessenta dias para os magistrados se apresenta mesmo como um privilégio inadmissível numa República democrática. Já é hora mesmo de rever essa norma, sem maiores traumas, como medida republicana, mas sem qualquer ilusão de que isso vá significar, por si só, maior efetividade e celeridade da prestação jurisdicional.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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