Convite a tomar juízo.

“Tome juízo, menino!” Era assim a recomendação de pais e mestres àqueles que, por desordem, preguiça e desleixo exibiam comportamento inadequado ou um ruim desempenho nas obrigações escolares.

Em alguns casos, a paciência dos mestres não continha a frustração de todo um esforço coletivo: “Você é um estroina, está roubando o dinheiro de seus pais, que paga o colégio e está jogando tudo fora”.

O mote da falta de juízo, ou do desajuízo generalizado, vem à mente para falar da Rio+20, o evento que o Brasil tanto se vangloriou em patrocinar, sem poupar gastos imoderados, para discutir o conservacionismo ambiental, esta nova religião, moderno altar sem Deus, erigido sem qualquer deus, e sem deles necessitar.

Afinal o mundo acolheu, por unanimidade aguerrida ou indiferença consentida, esta ideia boba, maluca e irresponsável de querer discutir tudo numa assembleia. Inclusive o multilateralismo esta ideia surda à velha lição de Tobias Barreto ainda plena de vigor: “O direito internacional se apoia na boca do canhão”.

Mas nestes conciliábulos todos podem externar seus músculos e gargantas com asneiras pacifistas.

Ali somos os verdadeiros cientistas e especialistas. Mesmo em baixa leitura ou esforço apolíneo, posamos de luminares matemáticos, físicos, químicos, filósofos, astrônomos, geógrafos, historiógrafos, mesmo sendo analfabetos em maioria, num apedeutismo generalizado, pintados como índios fora de moda, mas eminentes conhecedores e pesquisadores, sobretudo se o debate exibir vária apresentação de sovaco mal cheiroso, cabeleiras convidativas de lêndeas e piolhos, e sorrisos entremeados de tártaros lodosos, num verdadeiro testemunho de boa relação com a natureza, ou melhor; tudo sem ofensa a natureza.

Mas, não só por estes pregadores conservacionistas como por outros indiferentes predadores e consumistas iguais a mim, a natureza é violentada desde a primeira micção matinal.

Depois vem o banho, a espuma do sabonete, o bochecho da escovação dental, o papel higiênico que poupa a sujeira da cueca, a descarga de mictórios, latrinas ou gabinetes, enfim; efluentes e cloacas que deveriam ensejar a modernidade e o saneamento.

Mas o mundo está morrendo, diz o ambientalista que resolve andar para traz. Porque andar para frente não é bom exercício. Em marcha ré, dizem estes iluminados amparando-se até em holística. Involuir, retrogradar, retroceder, andar de costa sem mirar o retrovisor é bom exercício para os hemisférios cerebrais. Os dois: o lúdico e o racional.

E nesta brincadeira de volta às origens primevas de mata virgem, eu me lembro em viagem à Índia onde a paisagem matinal exibia uma fila de homens e mulheres satisfazendo suas necessidades naturais à margem das estradas.

Mas, eis uma nova religião: “Viva a natureza!” Espécie de ruminação da contracultura hippie, dos cabeludos ao musical Hair, minha preferência enquanto jovem, tempo em que os regimes comunistas mimetizavam a nós todos, ou quase todos, enquanto as atrocidades de Pol Pot ainda não eram conferidas, e aquele bom nativo das florestas cambojanas era um bondoso selvagem, um silvícola de Rousseau em perspectiva.

“Tomem juízo!” Este foi o recado das grandes nações ao Rio+20.

O grande problema do mundo é a geração de emprego e renda! É a produção para conseguir alimentar a incontrolável e irresponsável proliferação de famélicos, de famintos, de insaciavelmente esfomeados, a requerer todas as benesses da natureza!

E a natureza não é tão boa assim como os ambientalistas a pregam!

Porque o homem é muito frágil perante a sua ambiência. O camponês sabe que tem que “samiar”, “alimpar” o terreno do espinho, da urtiga e da praga para conseguir colher o “de comer” da própria subsistência, tudo suado e esforçado.

O bicho homem, o mais delicado da natureza, não consegue se alimentar de silício, roer pedra, mastigar e ruminar areia, nem degustar goladas do oceano. Ele tem que beber água pura, puríssima: floculada, filtrada, clorada, ozonizada ou desinfetada por ondas curtas, mesmo que sua sede o leve a sorver lama, em face de sua imprevidência contra o estio, por consequência natural dos movimentos eólios e das precipitações húmidas ainda não controlados a seu favor.

Isso sim, um objetivo a ser conquistado pela ciência; porque não basta prever a seca, o vendaval, a tempestade e o furacão, muito menos contemplar a força nuclear atômica. É preciso dominá-los, realizar o seu controle, utilizar a sua energia inesgotável, para melhor servir ao homem.

É isso que o homem precisa. Nós somos, e bom repetir, nós somos o ser mais débil entre os viventes; do pé ao pelo, da força ao casco. E o nosso viver sempre foi sinônimo de luta e cansaço para não ceder refém desta anatomia fragílima perante tudo na ambiência; do vírus ao maior ser, sei lá, o tiranossauro rex ou o macaco guigó, nosso contemporâneo ancestral ou conjuntural.

Ah se o homem tivesse o pé do boi, a pele do rinoceronte, o lar da tartaruga, a rapidez do coelho, o chifre do bode, o membro viril do jumento, o fôlego do peixe, a dentição do camundongo e ainda por cima pudesse comer areia como minhoca, mastigar pedra, deglutir quartzo, tendo o feldspato como repasto! Tudo isso com goladas de águas marinhas!

Que beleza! Ah, se fôssemos assim, construídos e constituídos de todo arsenal contemplado, da pertença de outros animais!

Num mundo assim, não haveria sapato, chinela ou chapelaria. Idem para as alfaiatarias, em desemprego de alinhavadores, modistas e delicados estilistas!

De igual modo não iria carecer nem prediação, nem casario, cidades, casebres ou palácios, com a consequente economia na remuneração de pedreiros, marceneiros, arquitetos e decoradores, esta louvável especialização de embelezamento de lares e seus interiores!

Também não iria existir memória nem a cidadania, para fazer história, estudos de sociologia e excesso de demagogia!

Já pensou, caro leitor, se tudo isso fosse possível, mascando pedra granítica como se fora chicletes? E dando goladas de águas salinas, dos diversos oceanos?

Ah! Deixemos tudo como está; o homem com seus maus olhados, misto de inveja e miserabilidade perante a criação que o fez sagaz, audaz e inteligente, mas voraz e persistente em ousá-la, conquistá-la e dominá-la ao seu uso e talante. Ou não?

Natureza onde os frágeis sucumbem para que os fortes sobrevivam, e sofram com a cobiça, a ignomínia e o mau olhado. Este olhar graúdo e venenoso, que nem os três oceanos conseguem fornecer o necessário descarrego iônico. Ou não?

Porque o mau olhado existe. E neste particular nem sempre uma boa benzedeira resolve, murchando folha de vassourinha, para provar o feito do mal feito vizinho.

Ah, mas um monte de cientista está a demonizar o mundo civilizado culpando-lhe de um não provado aquecimento ambiental.

E há quem fale até da sua quantificação em graus Celsius ou Fahrenheit, com termômetros bem aferidos, conferidos e aleatoriamente distribuídos em todas as latitudes e longitudes, azimutes para todos os desfrutes, contanto que pare o progresso e dê um basta à geração vitoriosa de energia: da termelétrica à nuclear, e até da hidroelétrica de Belo Monte lá no Xingu.

E em nova caça de hereges, quem não aceitar o tal aquecimento global tem que ser extirpado da verdadeira ciência, se possível torrado na fogueira dos maus penitentes.

Mas não há nada de novo debaixo do Sol, que brilhando continua, permanentemente, pelo menos é assim analisado perante o contexto possível da vida.

O que há de novo é a algaravia multilateralista, querendo que a ONU se curve perante um excesso de despreparadas minorias, e a cauda cotó balance o cachorro que bem morde sem latir.

E o efeito estufa? E a camada de ozônio ameaçada por tantos aviões e automóveis? O mundo vai se acabar com as precipitações ácidas e os oceanos inóspitos!

Não parece o replay da estória da saúva que iria acabar com o Brasil?!

Voltemos, portanto, às carroças ou ao saudável deslocamento no passo e na corrida, bom para o coração e melhor para a procriação, sem fumos, nem CO2.

Sim, porque até os eunucos e os de fraca ereção sempre encontram causas que justifiquem sua inapetência ou impedimento, algo de recomendável por proibição.

Ora, os da minha geração na juventude gritavam nas ruas: “É proibido proibir!”

Hoje querem proibir da carne vermelha ao camarão, sobretudo se obtido por empresarial produção.

Gordura e açúcar nem se fala! Só os de manuseio artesanal.

Porque a comida não caseira deixa o mundo diabético e com coronárias entupidas, embora a química esteja a fluidificar as artérias e a engenharia conceba pontes, extensores e alargadores de vasos, e choques elétricos compassados para reforçar os nossos corações.

Tudo conquista humana; o homem querendo até sonhar com a própria imortalidade por reposição de peças, repiques de células vitais, reproduções artificiais, clones e outras coisas tais, tudo que representa horror a um bom ambientalista que se preze; os de piolho e lêndea, e aqueles de tártaro por escudo de dentina.

E é este pessoal que deseja parar tudo que ofende a sua crença. Daí juntar um monte de desocupados na Rio+20, esta festa paga pelo erário, para definir como deve ser a agricultura e a produção, não só aqui, sem mecanização ou adubo, como alhures onde vige a miséria e a fome.

Não seria bem melhor para o Brasil conhecer-se a si mesmo e às suas mazelas, contemplando não a baía de Guanabara, bonita e charmosa, mas a de Sepetiba, sua irmã esquecida e mal cheirosa? E o que dizer do desaguar Tietê em Pirapora, e dos grandes lixões das nossas cidades? Não constituem exemplos de desafio à nossa inteligência viva em plena desorganização pátria?

E quando nos ousamos a ditar rotas de multilateralismo, me vem à lembrança o meu rio Sergipe, num tempo em que não era o esgoto que ficou, com Aracaju obrando ali, incontrolavelmente, em diarreia crescente!!! E nós queremos ditar ao mundo como tratar o vil efluente!!!

E haja cocô! Saindo por onde deve e por onde não devia, no falar. Até do meu falar, por desagrado de quem não é obrigado a me ler.

Um desafio a não causar insônia a prefeitos e governantes, todos verborrágicos e comensais.

Assim, entre uma economia verde que ninguém sabe o que seja, mas deseja, e um desenvolvimento de sustentabilidade pueril, quimérica ou psicodélica, é preferível posar de trânsfuga no bloco da cajaranas ou desfilar na parada gay, por mascaradas mais engraçadas, mais chamativas e melhor coloridas que o oba-oba da Rio+20, e a comunidade dos povos ali reunidos.

Talvez tenha sido assim o porquê do mundo, por seus líderes maiores, terem olhado de banda e soslaio para o grandalhão Brasil, preferindo grevear a reunião.

Na gazeta por ausência, o recado das grandes nações não foi outro; um convite a tomarmos juízo!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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