Cartas do Apolônio
Cascais, 2 de setembro de 2005
Caros amigos de Sergipe:
Dizem que as mudanças são necessárias ao desenvolvimento do homem, pois o habilitam para novos desafios. Tomara que seja verdade, pois acabo de me mudar para Cascais onde sou vizinho de uma loura monumental. A rapariga é um desafio e tanto.
Sinceramente, não gosto de ficar mudando de alhos pra bugalhos, mas a situação na minha velha mansarda lisboeta estava insustentável. Depois que Zenóbia, minha ex-patroa sexagenária deixou aquela casa, o lugar transformou-se num verdadeiro Caminho de Santiago de Compostela das hostes libidinais. Era um entrar e sair de raparigas de dar inveja até ao velho Kid Bengala. Bastava olhar pela janela para se observar a romaria diária de mulheres ávidas por um contubérnio, ou no mínimo um colóquio com este velho escriba. Tinha que tomar uma providência ou definharia até a morte, por força dessa inebriante luxúria pós-separatória como diria o Odorico.
Resolvi colocar tudo no caminhão de uma transportadora e vir morar em frente ao mar. Aliás, o traslado foi um capítulo à parte. Feita pela insuspeita empresa ‘Paquito e & Pepito’ de dois irmãos mexicanos amigos da Sulamita, minha secretária bilíngüe e boazuda, a mudança por pouco não se transformou num autêntico desastre automobilístico.
É que os mexicaninhos em questão são grandes apreciadores da velha tequila e fizeram o trabalho completamente mamados, digamos assim. Arranharam móveis, tiraram fino em vários caros na auto estrada e até deixaram cair da carroceria do veículo, uma caixa de papelão com as cauçolas da Etevalda. As peças logo se espalharam, ao sabor dos ventos pela entrada da nova cidade, constituindo-se na diversão da criançada que disputava as referidas à tapa em meio a uma algazarra descomunal. Foi um papelão mesmo! Mas, como dizia o Tom Jobim, “não há situação no mundo, por pior que possa
parecer, que uma mulher não consiga piorar”. Pois não é que a Etevalda Fausta conseguiu entornar ainda mais o caldo? Embalada pelas ondas do oceano e, certamente, pelo bafo tequileiro dos briosos trabalhadores do volante, a mulata isoneira das terras cabralinas resolveu que tínhamos que fazer amor de janelas abertas para inaugurar imediatamente a nova moradia.
Um tanto enfastiado cedi aos caprichos daquela verdadeira Kama Sutra ambulante. Em dado momento, a mulher começou a urrar ensandecida tal qual uma Messalina doidivanas. O fato atraiu outra romaria. Desta vez foram os vizinhos que imaginando um homicídio na moradia recém ocupada, forçaram a porta da casa e nos flagraram Com as respectivas bocas nas butijas, se é que me faço entender.
Passada a indignação das estupefatas senhoras que adentraram à nossa alcova, despachei a tresloucada de volta à Lisboa, mas sinceramente ainda não me livrei do constrangimento de encarar as novas vizinhas na fila da padaria ou no balcão da locadora. Quem estava por cima era eu.
Até semana que vem
Um abraço do
Apolônio Lisboa.