Na praça da Matriz da cidadezinha do interior, com o pequeno parque de diversões armado com suas atrações, os quiosques e vendedores de lá para cá, rapazes e moças passeavam uns se batendo nos outros, em meio a dichotes com licença mas que lindos olhos você tem, a sibitez de uma donzela: sai daí abacaxi que tomei leite, olhe por onde pisa, mas foi você que me cegou com sua beleza, coisas desse gênero. Era dia de festa de Natal, meia-noite haveria a missa do galo e então chegaria mais gente.
Em um banco da praça, um rapaz de terno xadrês, parecia alheio a tudo, mas era toda atenção aos movimentos das moças. Especialmente aquela, baixinha, os seios apontando na blusa, cabelos arredondados. Quando ela passou perto dele, o rapaz atirou-se aos seus pés, gritando:eu te amo e tu não me queres! A confusão foi grande e quando viu a platéia formada, ele pegou um revólver do bolso e deu um tiro na própria cabeça. Mas antes de apertar o gatilho, sussurrou uma frase não muito clara. O delegado indagou se alguém ouvira a última frase do morto e uma moça informou: “ele disse: viva Nelson Rodrigues!”. Tudo bem, retrucou o delegado, mas eu preciso conhecer esse sujeito.
(Este ano, Nelson Rodrigues, maior dramaturgo brasileiro, polêmico e grandioso também na crônica, no conto, no romance e no jornalismo completa 27 anos da sua morte e 95 do seu nascimento).