Por Eunice Guimarães
Na antiga cidade de São Cristóvão, onde o tempo se demora nas fachadas coloniais e o vento parece carregar vozes do passado, o mês de agosto encerrou-se como um poema. De 22 a 24, o III Simpósio Nacional de Confrarias e Academias de Ciências, Letras e Artes transformou o Convento São Francisco em um templo vivo da cultura brasileira.
Logo na abertura, a Capela, sagrada por natureza e história, foi cenário de homenagens profundas: o Troféu Fênix de Ouro e a Medalha Beatriz Nascimento foram entregues como gestos de reconhecimento e memória — não apenas a pessoas, mas a ideias que resistem, brilham e renascem. E foi sob essa luz que a Professora Doutora Ana Flávia Magalhães (UnB) nos conduziu por outras formas de contar o Brasil — um país possível à luz de Beatriz Nascimento. Sua fala, intensa e necessária, revirou certezas e plantou inquietações férteis.
No dia seguinte, a cidade viveu um duplo encantamento: o Sarau Literário e a Feira Literária, que aconteceram em sinergia, celebrando a palavra em todas as suas formas. Poetas, escritoras, escritores, declamadoras e amantes da arte vieram de várias partes do país, transformando o Convento num grande palco de escuta, riso, emoção e troca.
E foi ali no Sarau Literário, que diferentes vozes roubaram a cena — com versos fortes e ternos, como quem borda a vida com poesia
A Feira Literária, por sua vez, espalhou livros, histórias e ideias pelas mesas e pelos olhares. Foi mais que um mercado de palavras: foi um ponto de encontro entre a produção literária contemporânea e o afeto dos leitores.
No dia 23, o historiador João de Souza Lima trouxe à tona um capítulo pouco contado da história: “As Mulheres no Cangaço”. Com sensibilidade e precisão, revelou o protagonismo feminino nesse universo árido e complexo, ampliando os limites do que conhecemos como resistência no sertão. Ao seu lado, o Grupo Sergipano de Estudo Sobre o Cangaço deu ainda mais força à preservação dessa memória viva.
E se agosto não é tempo de Semana Santa, foi como se fosse: a Exposição do Fogaréu resgatou um dos rituais mais simbólicos da cidade, trazendo para dentro do Simpósio os sentidos e os passos desse cortejo de fé e tradição. As chamas simbólicas não queimavam iluminavam.
Ainda houve tempo para homenagens emocionantes ao poeta cearense Paulo Neves, ao cordelista João Cabral e à mestra das rimas, Alaíde Souza Costa nomes que mantêm acesa a chama do cordel, da oralidade e da cultura popular nordestina.
No último dia, como em uma despedida que não quer ser adeus, os participantes foram conduzidos por um city tour histórico pelas ruas de São Cristóvão. À frente, o idealizador do evento, Comendador Adailton Andrade, guiava com paixão e sabedoria. A surpresa ficou por conta da presença do também historiador e escritor Thiago Fragata, que se uniu ao grupo e conjuntamente com Adailton, transformaram a caminhada numa verdadeira aula viva onde cada parede contava uma história, e cada passo era parte de uma narrativa maior.
O Simpósio encerrou-se com a leveza de quem cumpriu seu papel: provocar encontros, acender ideias, reviver memórias. E, como todo grande acontecimento, deixou mais perguntas do que respostas, mais caminhos do que chegadas.
Porque quando a história abraça a poesia, e a tradição se junta à palavra escrita, não há fim. Há legado.
Parabéns a todos os envolvidos, em especial à Comissão Organizadora, que construiu um encontro inesquecível. Que venham mais edições, mais troféus, mais saraus e mais fogaréus acesos pela cultura.