É preciso um novo amanhecer da política

Ontem Aracaju viveu um dia histórico. O cenário e o clima do início da manhã revelavam que poderíamos assistir na capital sergipana a um episódio semelhante ao que aconteceu na Ocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos, em janeiro de 2012. O aparato policial – com cavalarias, helicóptero, armamento, carros e mais carros -, estava montado desde as primeiras horas da manhã nas proximidades da Ocupação Novo Amanhecer, no bairro 17 de Março. A ordem era garantir a desocupação da área. Do outro lado, o povo sedento por direitos essenciais como moradia digna, saúde, educação e água, estava decidido a permanecer resistindo.

A reivindicação principal das 311 famílias que (sobre)vivem na Ocupação Novo Amanhecer é algo que está previsto tanto na Constituição Federal quanto nas mais importantes normas e pactos internacionais de direitos humanos: uma moradia digna, um lugar para viver com os seus familiares. Porém, cotidianamente a história dá provas de que – mais do que as leis – a organização e a resistência populares é que são capazes de garantir os direitos da sociedade. Foi essa resistência de homens, mulheres, idosos, jovens e crianças – debaixo de sol durante a manhã e a tarde de ontem – que pressionou o Governo do Estado a acionar a Justiça para suspender a reintegração de posse.

Mas a decisão judicial de manter as famílias na Ocupação Novo Amanhecer demonstrou também outro aspecto que merece ser frisado: a importância da articulação entre a organização e resistência populares, os representantes públicos que têm os seus mandatos a serviço do povo e as instituições do Estado.

Por isso, se a resistência das 311 famílias foi essencial para que não tivéssemos um Pinheirinho em Aracaju, não se pode negligenciar também a participação ativa da Defensoria Pública e da Presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, a deputada estadual Ana Lúcia, nas negociações e, consequentemente, na suspensão da desapropriação. Tanto a parlamentar do PT quanto defensores públicos estiveram presentes na Ocupação, ouvindo as famílias, acolhendo as suas reivindicações e, ao mesmo tempo, dialogando com o Governo do Estado sobre a necessidade de uma medida que garantisse a integridade das famílias.

Mas não basta a suspensão da desapropriação. É preciso mais. Cabe agora à Prefeitura de Aracaju e ao Governo do Estado abrir o diálogo transparente com as famílias, ouvir os seus anseios e, mais do que isso, garantir os direitos dos sergipanos e sergipanas que vivem e resistem na Ocupação Novo Amanhecer. Cabe agora à Prefeitura de Aracaju e ao Governo do Estado implementar um conjunto de políticas públicas que visem superar o estágio de desigualdade social que a capital e o estado ainda enfrentam, em especial na moradia.

Cabe agora à Prefeitura de Aracaju, Governo de Sergipe, Assembleia Legislativa, Defensoria Pública e demais instituições públicas seguir o que há muito se deseja: um novo amanhecer da política, uma política que respeite os direitos do conjunto da população e que priorize a garantia dos direitos humanos em detrimento de privilégios para poucos.

Já os que negam integralmente a política partidária, os representantes políticos e as instituições do Estado (sentimento expresso em algumas das manifestações de junho/julho através de gritos como “fora partido!”) deveriam olhar mais para exemplos como o que aconteceu ontem na Ocupação Novo Amanhecer. O processo de articulação que culminou com a suspensão da desapropriação demonstra que a boa política, o diálogo e a articulação entre a resistência popular e a luta institucional são boas receitas para os avanços democráticos.

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