Ensaio sobre a nova adolescência

Houve um tempo em que ser adolescente era sinônimo de liberdade. O que observo hoje é que a transição para a vida adulta torna-se a cada dia uma constante desgraça. Se por conta das mudanças corporais, esse período por si só já traz instabilidade emocional, relações estremecidas com familiares e amores; ser adolescente nesses tempos modernos é quase que andar vendado numa rua bem movimentada. E nos dois sentidos.

 

A experimentação ganhou ares de algo legal, mas, seco e sem razões conscientes. Quando deveria ser apenas uma demonstração para o algo maior. Só. O prazer ficou mais carnal. O amor? Volúvel. Como se o amor em seu gene já não trouxesse caprichos. O terreno da paixão é semeado por gestos de um “grande-amor” que passa tão rápido quanto o estalar dos dedos. Fica-se mais do que se pensa. Sabe, ninguém quer mesmo flertar e assim se perde a chance de escolher o substancial do outro. Ficando apenas com o superficial de uma roçada ao som de um Axé qualquer. É um tal de gozar nas pernas sem fim. Ah, deve “ser um saco” ser adolescente. É muito aqui e agora ao invés de sereno.

 

Os iniciantes no mundo da juventude se cansam rápido das coisas, o que deve ser reflexo dos espelhos que o cercam. Falar sobre esse assunto remete automaticamente à vida adulta contemporânea. Os adolescentes apenas repetem de forma mais atrevida o que os novos-adultos (aqueles na faixa dos 35) fazem de suas vidas. Culpa-se o convívio com a tecnologia, mais precisamente a Internet e em menos escala a tevê, para justificar as atitudes desmedidas e impensadas realizadas como se a vida a cada momento fosse uma novelinha vespertina ou um suspense típico de novela das oito (que agora começa nove da noite). Dá tudo no mesmo.

 

Não existem arreios, apenas esporas. “Meu bem, meu bem, você tem que acreditar em mim. Ninguém pode destruir assim, um grande amor. Não dê ouvidos à maldade alheia e creia..”. Todos estúpidos. Todos previsivelmente estúpidos, só isso mesmo. “O mundo não é mais lugar pra quem toma decisões na vida, sem pensar”. Chega a ser de uma tolice estranha esse modo de levar a vida com sangue nos olhos. O adolescente desse início de século não é tão esperto quando supõe os mais velhos. Eles são ágeis, mas agilidade e inteligência nem sempre convivem juntas. É preciso mais. Leitura? Quem sabe. Auto-analise? Também.

 

Querer sem adulto ao invés de curtir a solidão de se descobrir virou a questão. Drogas baratas, bebidas sem procedências, numa ressaca moral que se resolve colocando apenas uns óculos escuros (também de procedência duvidosa). Em menos de duas semanas, me vi cercado por dilemas de vários adolescentes em plena ebulição. A primeira pessoa que me fez pensar sobre esse assunto, estava jogada num canto de boite bêbada e sozinha. Tinha chegado com amigos, que voltaram (dividindo o táxi, numa vaquinha sofrida), deixando-a. Até porque, penso eu, não teriam como voltar num táxi que só levaria no máximo quatro pessoas. Eles tinham chegado em cinco pessoas. De ônibus. Depois de curtirem suas bebidas (baratas) abandonaram-na com uma facilidade. Sem muito tempo para repensar alternativas. Os adolescentes de agora largam as coisas de lado, talvez porque não saibam ler, muito menos dialogar sobre seus próprios sentimentos. Usam tantas abreviações em suas comunicações digitais que não sabem se relacionar sem um download. Algo nefasto.

 

Sim, mas voltando a adolescente que vi abandonada no canto da boite. Me despertou um misto de ira e pena. Sentimentos dúbios, que por vezes se completam em situações que não sabemos distinguir. Ela foi carregada pelo segurança para fora do lugar. Algumas poucas pessoas ao redor. Muitos curiosos, numa espécie de velório simplório e de gente odiada. Sabe aquela ideia de que a pessoa tem que ser boazinha para ter muita gente em seu sepultamento, algo participativo, talvez aplausos? Era algo mais ou menos assim só que ao contrário. Quase ninguém para presenciar a morte irreal. Simbólica. Sei que os poucos que estavam ali jamais farão comparação igual. São opacos.

 

Me assusto com isso, mas as casas noturnas não pedem identificação de ninguém. O lucro cairia com isso. A noite está recheada de menores em busca de feitos grandioso. Cada um é mais cool que o outro. Cada um tem as maiores histórias e por que não as melhores? Cada um tem um grande motivo para encher a cara e contar suas vantagens, principalmente desgraças. Quanto mais trágica a história, melhor! Guardem seus segredos. Eles não sabem de quase nada que não seja virtual. A maioria dos adolescentes de 2009 é chata. Salvo os que transformam suas “dores” em arte, os que se impregnam em movimentos sociais e os que leem – porque serão adultos conscientes de suas próprias vontades e vidas.    

 

As portas dos shoppings estão fedendo ao perfume nacional teen vendido em grande escala. Os pais (irresponsáveis) deixam seus filhos sozinhos num complexo de luxuria repleto de orgias. Os banheiros desses locais são laboratórios de análise empírica para a sexualidade. Meninos e meninas se descobrem em meio às vezes e urinas. Um horror sem tamanho. O que se converterá em lágrimas para as tradicionais famílias, que não deveriam chorar pelas secreções derramadas, mas pela falta de educação que não proporcionaram aos seus. Adultos, pais: comprem livros, proporcionem viagens (nada muito longe). Mostrem a realidade da vida nem que seja através de um documentário de Coutinho, sei lá!

 

Acho que o único legado que a década de 80 deixou não foi o Rock nacional, muito menos a questão batida da democracia do voto. Nada disso. Os que sobreviveram ao boom das cores cítricas podem se orgulhar de terem vivido o melhor da vida, pós a década de 60 e sua contracultura. Viveu-se “a sorte de amor tranqüilo, com sabor de fruta mordida”, cantou Cazuza. As pessoas eram livres por conta própria. As roupas grotescas, mas a cabeça em busca de um sentido. E só por essa procura já merecem aplausos. Quando se busca o desconhecido de forma consciente se chega melhor ao almejado, porque se avalia a causa e o efeito das escolhas. O resultado é mais satisfatório. Sei que Sobrevivi.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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