O cinismo anda de mãos dadas com a descrença. É aquilo de olhar para trás e não se enxergar mais como antes. A pessoa amadurece ao passar por problemas (oK), mas, não existe algo mais denso do que não ser mais o mesmo, se perceber outro, torna-se um cínico com relação aos fatos do mundo, às pessoas que nos cercam. Esta triste conclusão faz parte do se tornar adulto, tendo que aceitar as relações como elas são (cheias de defeitos e nada suscetíveis ao amor idealizado nos livros).
A consciência do agora é uma vitória, e, perdedor é quem não se transforma em cínico para mais uma vez apostar em situações já arruinadas anteriormente. Fazer sempre a mesma coisa, se machucar sempre da mesma forma é aprendizado nulo. Apostar cartas numa mesa de canalhas é fazer parte do jogo, beber do mesmo copo. Só deveríamos dividir nosso copo com quem confiamos. Ser cínico é mais do que uma atitude, é um estado de espírito.
O perdão nada mais é do que o cinismo disfarçado. Ninguém esquece os maus presságios. Ninguém esquece o tapa recebido. Aquela coisa de dar a outra face não existe mais, é bobagem e machuca. O sadismo caiu de moda no final da década de 90. Queremos mais é fingir que nada aconteceu para deixar o cinismo aflorar, o que é maravilhoso. É sábio levar a vida na baila, na valsa. Ser cínico é gozar várias vezes no mesmo lençol.
Para evitarmos o cinismo, o mais saudável seria evitarmos os enganos. Assim, não criaríamos os cínicos que nos rodeiam. Mas ser humano é errar mesmo, é pisar feio no freio e descer ladeira abaixo… Vixe, lá vai ele mais uma vez metendo os pés pelas mãos, fazendo das tripas coração por uma atitude que não o levará a nada, a não ser ao cinismo. Tudo é um carnaval de bobagens. Choramos pelos problemas sem nos dar conta de que somos os causadores de todas as nossas próprias desgraças. Quem perdoa sem cinismo automaticamente entrega a outra face e não deve reclamar quando o pior lhe acontecer. Ao perdedor, o cinismo!
Quando a coisa já estivesse perdida, deveria ser nos dado o direito de fazermos um acordo lavrado em cartório. Em sua única página estaria escrito, em poucas palavras, algo libertador: Te perdoo se você assinar o termo aceitando meu cinismo daqui para frente. Não me criticando, muito menos me cobrando que volte a ter confiança em suas palavras, pois “você abusou, tirou partido de mim, abusou”. Assim mesmo, com direito a samba-canção, pois a música ameniza o sofrimento. Já imaginou a alegria dos tabeliães? Os cartórios viveriam cheios de pessoas com seus contratos de desculpa e os analistas, coitados, vazios.
Os cínicos não precisam de Freud, Lacan ou qualquer ajuda psicológica, talvez um pouco de Schopenhauer – para cultivar a descrença nas palavras alheias. O ser – cínico já resolveu aceitar a natureza do outro e com isso se sobressaiu aos problemas, os tais perrengues do cotidiano, a falta do que é normal. Ele pode customizar uma camiseta estampando o seu “Free Right Now”, pois agora, ele mesmo manda em seus pensamentos. Acabando assim, a imagem errônea de que o outro é alguém puro, sem erros ou falhas de caráter.
Viveríamos mais felizes se olhássemos para todos com desconfiança. Os mais espertos já são cínico por natureza e chegam aos maiores cargos dentro das empresas (viram nossos representantes, politicamente falando). É um jogo de perdas e ganhos. Se eu tivesse que assumir alguma coisa que valha a pena nesta vida, diria que sim, estou na categoria dos novos cínicos. Quer dizer, ainda estou no processo disso tudo. E o caminho é longo, caso você deseja trilhá-lo também.
A primeira lição que aprendi é que nunca devemos pedir conselhos. Os cínicos não precisam disso, nem de nada, porque não se importam mais com a opinião externa. Do que adianta ouvir algo e não seguir? Muitas palavras ganhariam mais significado se nunca fossem emitidas, pronunciadas.
A segunda, e mais importante dica, é nunca confiar em elogios. Sem levantar fortes expectativas, fica mais tranquilo aceitar as críticas. Os cínicos dão mais valor à crítica construtiva do que ao elogio rasgado, sem costura. A partir do momento que ouvimos algum comentário verdadeiramente interessante (bom ou ruim), sobre quem somos, ou alguma avaliação sobre o nosso trabalho, podemos melhorar, mas, não para que possamos nos enaltecer do avanço, do nosso bom desempenho perante o olhar do outro, mas sim para que evitemos que os elogios supérfluos permaneçam. A babação oca, feita em momentos de confraternizações ou melindres é inútil.
Por favor, obrigado, não!