Ensaio sobre o pavor que nos cerca

Ando apavorado com o que me cerca. Entendo muito bem os que possuem suas síndromes, seus pânicos. Sair de casa, às vezes, parece uma quase nomeação para uma guerra estúpida, dessas que norte-americano adora. Como ser comunicador e não querer contato alheio? Impossível. Então tenho que domar minhas atitudes para assim sobreviver, como milhões de outras pessoas que também sentem isso.

Bater a porta de casa, sair em retirada para o trabalho, por exemplo, não é mais tranquilo. Quisera fazer tudo de casa. Entendo os escritores que se isolam do mundo, para construir seus próprios mundos. Trata-se de segurança e não modismo. O que presencio diariamente é um espetáculo de grosserias sem tamanho. Cada uma tem nome, idade e atitude e estão sempre por perto. Ninguém pede mais desculpas, não existem palavras pela metade.

É como se não conhecêssemos mais ninguém. Os conselhos dos mais velhos estão virando pragas que acontecem. Ninguém está seguro. Falta docilidade, falta sinceridade, falta vontade de encarar as verdades, é isso. Nós seres humanos estamos mais céticos, com isso mais dispostos à agressão oca, que permite o prazer do agora em troca de nada amanhã.

Tenho pavor de quem não conheço. Os meus amigos (todos), eu confio, mas não sei como estender isso aos demais. Sabe aquilo que nos separa dos outros animais, o tal do discernimento? Acabou. Ninguém pensa mais duas vezes antes de falar, agir, não se conserta mais os danos. Muito pelo contrário, queremos para agora o que seria favorável com o tempo.

Sinto falta de minha infância, quando meus problemas eram pertencentes aos meus parentes. Cada dia que vejo o pavor das pequenas coisas me rodando, me sondando, fico menor. Sei que posso ser atingido a qualquer momento, porque não depende exclusivamente de mim. Sinto uma agonia que ultrapassa qualquer brisa de felicidade e que me toma de forma tão séria, que não sei descrever. [desculpe].

Não consigo acreditar em ninguém. Parece que todos ficaram estranhos do dia pra noite. Não sinto confiança nos olhares de amizade, nas caricias de amor, nas escritas de antes. Tudo fake, cheirando a perfume importado que não combina com o clima quente do nordeste. Tenho pena de quem não se conhece e assim assusta o outro, massacra o outro por não saber lidar com o diferente, por não se aceitar. Tenho pena.

Já tinha pensado para o ensaio desta semana algo mais fácil de ser digerido. Queria falar sobre uma receita de comida que cultuo em meu gosto há anos. Mas minha cabeça falhou no desenvolvimento desse texto inicial e fiquei me perguntando qual o motivo? Daí caiu a ficha. Tratava-se de uma falha mental ocasionada pelo instalado em mim já algum tempo. Não sei bem como evitar ou tirá-lo, porque me pertence e não foi dado por alguém, mas pressentido algumas vezes e ficou.

Talvez o leitor possa julgar que o que sinto seja depressão, mas chamarei de conscientização. A vida não se trata de brincadeira, não é fácil, porém é oportunista. Quando não saiu de casa suscetível à agressão alheia, saiu de casa para agredir. São duas pessoas convivendo dentro de mim, de forma combatente. Não nego que prefiro sair armado ao invés de desprotegido. Mas me canso de ficar esperando o mal (seja ele de que forma for).

A armadura social que nos veste é pesada demais. As relações estão tão frágeis que nem mesmo nos damos conta disso. Não nego que já supliquei atenção, mas cansa! Aprender que é cada um por si é super valioso, do ponto de vista que acabamos desenvolvendo uma casca impenetrável, que nos isola e protege. Mas como sobreviver assim? Para nos sentirmos protegidos temos que nos isolar? Isso anula tudo que se pregou até hoje sobre convívio em sociedade. Não se convive mais, se protege em sociedade, essa é a grande verdade.

Os poetas que me ajudem, mas como assim não posso falar o que quero, nem pensar sobre mim mesmo (sem antes ter que responder aos questionamentos)? Isso é loucura. Por isso, existem os dias que não quero interagir, nem comunicar, nem me comunicar [coisas distintas].

Quando me forço demais para entender os outros, construo um novo eu e também desconstruo o meu melhor. Assim vou me fabricando diariamente entre morder e ser mordido, morrer e viver, o que na maioria das vezes é apenas sobreviver.

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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