Adriana Mendonça Cunha
Doutoranda em História pela Casa de Oswaldo Cruz (PPGHCS/COC/Fiocruz).
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq).
E-mail: adriana@getempo.org.
Em agosto de 1945, os Estados Unidos lançaram bombas nucleares sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, forçando a rendição incondicional do Japão na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O conflito entre os dois países, que disputavam influência na região do Pacífico desde o início do século XX, eclodiu após o ataque japonês à base naval de Pearl Harbor, no Havaí, em dezembro de 1941.
Terminada a guerra, os Aliados (EUA, URSS e Inglaterra), liderados pelos Estados Unidos, ocuparam o Japão derrotado, promovendo uma série de reformas políticas, econômicas e educacionais. A nova Constituição, promulgada em 1947, e vigente ainda hoje, determinava o comprometimento do país com a paz, abdicando o direito à guerra. Sob o comando do general estadunidense Douglas MacArthur, o Japão se transformou de inimigo em aliado, representando o principal parceiro dos Estados Unidos na Ásia.
A ocupação transformou a economia e a política japonesa, inserindo o país na nova ordem global que se desenhava no pós-guerra. As reformas educacionais e a influência cultural estadunidense modificaram o papel do imperador na sociedade japonesa, causando incômodo entras as gerações criadas sob o Yamato Damashii (espírito japonês). Tais conflitos foram brilhantemente retratos pelo escritor Kasuo Ishiguro (Prêmio Nobel) em Um Artista do Mundo Flutuante (1986).
A história acompanha um idoso vivendo no Japão recém-ocupado. Ono foi um pintor famoso que retratou a grandiosidade do seu país em obras reconhecidas e encomendadas pelo governo do pré-guerra. E, a partir desse passado glorioso, ele narra o presente, apresentando ao leitor sua vida e os rumos que sua família tomou após a vitória dos Aliados. Na obra, conhecemos um pouco de um Japão que não mais existia e os conflitos de um país que se reconstruía sob os olhos do inimigo.
O choque cultural é, sem dúvida, o ponto alto da sua narrativa. O velho Ono se vê perdido, excluído da família “americanizada”, entristecido diante do neto que idolatrava o Zorro ao invés dos samurais. Em vários momentos, o personagem se mostra chocado com os colegas japoneses que procuravam se desvincular do Japão pré-guerra, com o desprezo das novas gerações pelo país de anos atrás.
O livro de Ishiguro é um relato potente, tocante e nos faz refletir sobre as transformações que aquele país viveu entre 1945 e 1952, o impacto que a ocupação teve no coletivo, na cultura e no emocional de uma nação que se acreditava gigante, o “império do sol nascente”, mas que se viu na sombra do Tio Sam.
Para saber mais:
ISHIGURO, Kasuo. Um artista do mundo flutuante. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.