Msc. Ana Luiza Araújo Porto
Em tempos tão conturbados faz-se necessário pensar qual o lugar da História que se ensina nas escolas no projeto de país e de Educação Pública que se quer construir. Nesse sentido pode-se dizer que a História está no currículo escolar desde o século XIX como disciplina responsável por situar o cidadão dentro dos marcos da Nação. A disciplina entra no universo escolar ao mesmo tempo em que ganha ares de conhecimento científico.
Ela torna-se uma Ciência a partir do estabelecimento de regras que permeiam a produção científica e que são materializadas no método histórico. Franceses e alemães foram responsáveis por codificar procedimentos de pesquisa que ainda hoje norteiam a atividade dos historiadores. Entre os procedimentos do método histórico está a defesa de que sem documento não há História. Isso parece óbvio, mas não havia esse compromisso antes do século XIX.
Ainda que o conceito de documento histórico tenha se alterado profundamente ao longo do século XX e que os historiadores se utilizem de uma gama variada de fontes, no Brasil atual recorre-se a um revisionismo histórico sem articulação alguma com documentos históricos, desprovidos, portanto, de qualquer evidência histórica. A situação é por demais preocupante sobretudo porque milhares de jovens têm sido levados a reproduzir estereótipos e preconceitos de toda ordem no que se refere à revisão de acontecimentos históricos de alcance mundial como é o caso da Segunda Guerra Mundial e de outros eventos históricos. Com o advento das redes sociais a situação se complica já que a disseminação de informação toma uma proporção nunca antes vista e acaba por haver uma competição com a instituição escolar na formação de crianças, jovens e adultos.
A disciplina vem superando paulatinamente uma História de cunho patriótico tão em voga durante a última ditadura militar vivenciada pelo Brasil. Essa superação tem ocorrido sobretudo pela influência das escolas históricas ligadas ao Marxismo e aos Annales em que se renovou principalmente a ideia de sujeito histórico. Dos homens ligados ao universo da política entraram em cena os homens comuns, mulheres, crianças, negros, homossexuais, indígenas…
A História Escolar vem incorporando gradativamente o uso de fontes históricas de modo a trabalhar com os alunos a construção da narrativa histórica evidenciando que a História é uma construção pautada por múltiplas questões como o lugar social do historiador, o recorte temporal a estudar, a problematização do objeto em questão, a ideia de História como processo, entre outras nuances.
Respondendo à questão inicial deste texto, a História se faz necessária no currículo escolar pelo papel que exerce na formação dos jovens evidenciando os processos históricos já vividos pela humanidade. Ainda que sejamos pautados pela singularidade histórica e saibamos que a História não se repete, ela nos mostra como períodos de intensa crise econômica como o que estamos vivendo podem se desdobrar em situações de extrema violência e supressão dos direitos humanos fundamentais tais como a liberdade.
A História deve se fazer presente no currículo escolar por atuar na formação da identidade de crianças, jovens e adultos. Ela é responsável pela formação da consciência histórica que entre outras coisas permite a orientação no tempo e a construção em alguma medida da articulação entre passado, presente e futuro.
A construção de um projeto de país minimamente democrático passa necessariamente pela organização de um sistema educacional que contemple uma História voltada para a diversidade do país e para nossos problemas internos. A História Ensinada precisa pautar-se também pelo olhar das populações marginalizadas indígenas e negras, inclusive denunciando nossos arranjos sociais que revelam extrema desigualdade. Superar o mito da democracia racial é tarefa das mais urgentes e só o entendimento do nosso processo histórico é capaz de formar crianças, jovens e adultos conscientes das fragilidades de nosso tempo e da necessidade de construção de um projeto coletivo de país.