Fui criado pelo meu padrinho, um homem caladão, que nunca disse quem eram meus pais. Frequentei a escola alguns anos, depois fui trabalhar, ajudando meu padrinho e a sua mulher, nos afazeres de casa e de um pequeno sítio. Mas esse sítio rendia pouco, mas dinheiro não faltava em casa, por causa da profissão do meu padrinho. Ele esclareceu logo que eu seguiria sua profissão e me ensinou a atirar com revólver, escopeta e fuzil. Não tinha irmão nem parentes dentro de casa, somente a mulher, que eu chamava de dona Maria.
Quando ele envelheceu, não tive dúvidas: assumi os compromissos do meu padrinho e comecei a receber direto pelos serviços que fazia. Nunca tive dúvidas nem pensei em mais nada. Era realizar com competência as encomendas e pronto; agora eu sabia a causa do respeito que todos tinham, nesta cidadezinha, pelo meu padrinho e agora por mim. E ninguém indagava quando, com a camioneta, ganhávamos a estrada, retornando depois de alguns dias.
As encomendas chegavam, vez por outra, o mensageiro vinha, geralmente com dois envelopes, em um a metade do dinheiro pelo trabalho, no outro uma ou mais fotos do cidadão, com um papel registrando endereço e outras informações. E só. Depois, era a execução da encomenda.
Mas no dia em eu matei aquele cara, já envelhecido, meu coração ficou abalado. A mulher me chamou e me disse, sem protestar e sem aquela chama de ódio que todas ficavam, quando nos conheciam. Somente falou: o que faço com esse dois meninos? Um tinha 3 , o outro 4 anos de idade.
O senhor deveria levar eles, eu não tenho como sustentar e nem conheço parentes. Subitamente, tomei uma decisão: peguei as duas crianças e as coloquei dentro do carro. A mulher era jovem e perguntei: quer vir também? Quero, respondeu; foi buscar umas trouxas de roupas e entrou na boleia.
Agora, aqui estou eu, na nossa casa, com uma mulher e dois meninos. E mais um casal de velhos. E continuarei na mesma profissão. Vou ensinar as crianças a me chamar de padrinho.