MUSIQUALIDADE, por Rubens Lisboa

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Cantora: NANA CAYMMI

CD: “SEM POUPAR CORAÇÃO”

Gravadora: Som Livre

 

Primeiro CD lançado por Nana Caymmi após as mortes de seus pais, Dorival e Estela, ocorridas no ano passado, “Sem Poupar Coração” (que aportou recentemente nas lojas através da gravadora Som Livre) é – logicamente – dedicado carinhosamente aos mesmos. Produzido (como de costume) por José Milton, o novo e aguardado álbum traz quatorze faixas e conta com a participação especial de Erasmo Carlos em “Não Se Esqueça de Mim”, dele e Roberto (bisando o que já havia acontecido no disco “Resposta ao Tempo”, de 1998), tema já incluído na trilha sonora da telenovela global “Caminho das Índias”.

Nana é uma artista ímpar da nossa MPB: intérprete admirada por nove entre dez de seus colegas de profissão, é conhecida pela sinceridade e contundência de suas opiniões. Dona de uma voz límpida, grave e possante, continua em plena forma, consolidando-se como uma de nossas melhores intérpretes, como se pode depreender através do trabalho recém-lançado. Com um timbre belo e encorpado, ela passeia por um repertório eminentemente romântico, onde os desencontros e as dores de amores possuem lugar cativo. E é por aí que predominam boleros, como a dolorida “Contradições” (de Cristóvão Bastos – maestro que assina alguns dos arranjos – em parceria com o letrista Aldir Blanc), a ótima “Bons Momentos” (de Zé Luiz Lopes e Márcio Proença) e a apenas razoável “Dúvida” (do desconhecido Márcio Ramos).

O exímio e incansável letrista Paulo César Pinheiro é quem se faz mais presente: ele assina três canções, talvez não por acaso os melhores momentos do disco: a inspirada faixa-título (em parceria com Dori Caymmi), a delicada modinha “Senhorinha” (com melodia de Guinga) e a obra-prima seresteira “Violão” (ao lado de Sueli Costa). Outro destaque fica por conta de “Caju em Flor” (ricamente adornada por luxuoso som de sanfona), a qual traz a grife de João Donato (em mais uma parceria com Ronaldo Bastos), canção aparentemente simples, mas construída sobre harmonia intrincada e que resulta muito gostosa de se ouvir.

A família de Nana, porto seguro de sua carreira e também da vida pessoal, como não poderia deixar de ser, faz-se presente. Estão lá o irmão Dori (que, além de ser o responsável por alguns arranjos e pela já citada “Sem Poupar Coração”, assina ainda, em parceria com Chico Buarque, a pouco conhecida “Fora de Hora”), o outro irmão Danilo (que, ao lado de Manu Lafer, contribuiu com “Visão”) e a sobrinha Alice (praticamente estreando no meio musical com o pseudo-maracatu “Diamante Rubi”, único instante mais alegre de um álbum que prima pela melancolia).

Completam o set list a monocórdia “Confissão” (de Antonio Carlos Bigonha e Simone Guimarães, que tenta, sem êxito, seguir a trilha de Tom Jobim), “Pra Quem Ama Demais” (momento menos inspirado da quase sempre excelente Fátima Guedes) e “Esmeraldas” (de Rosa Passos e Fernando de Oliveira, decerto a faixa menos interessante do disco).

Se não é este, decerto, um dos melhores títulos da discografia, o CD ora em resenha chega em muito boa hora não apenas porque traz várias canções inéditas (fato que não ocorria desde 2001, quando ela lançou o CD “Desejo”), mas também porque comprova que a artista, apesar do duplo baque sofrido com a perda de seus entes queridos, segue firme naquilo que mais sabe fazer: cantar bonito. Avante, guerreira!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantor: FRED MARTINS

CD: “GUANABARA”

Gravadora: SETE SÓIS

 

O niteroiense Fred Martins chega ao quarto CD com disposição para mergulhar em outras praias. É que o novo trabalho do cantor e compositor homenageia as águas plácidas da Bossa Nova. Não que tenha resgatado antigos sucessos e os regravado sob sua ótica. Nada disso! Admirador confesso de João Gilberto, Tom Jobim & cia, ele compôs várias canções que têm tudo a ver com o famoso banquinho & violão (tanto nos contornos melódicos quanto nos temas abordados nas letras) e as reuniu no CD “Guanabara”, o qual acaba de chegar ao mercado através da gravadora Sete Sóis e que conta com a contribuição dos costumeiros parceiros Marcelo Diniz, Manoel Gomes, Fred Girauta e Francisco Bosco.

Fred Martins interessou-se por música desde a infância e já aos onze anos começou a tocar violão. Três anos após, capitaneando uma banda, demonstrou talento para a composição e, no final da década de oitenta, iniciou seus estudos em contraponto (com Hans-Joachim Koellreuter), arranjo (com Ian Gest) e harmonia funcional (com Sergio Benevenuto), realizando paralelamente o trabalho de transcrição de partituras para vários songbooks produzidos por Almir Chediak.

Foi somente em 2001 que ele estreou no mercado fonográfico com o álbum “Janelas” e o fez com o pé direito. Canções como “Flores” e “Novamente” foram descobertas e gravadas por Zélia Duncan e Ney Matogrosso, avalizando, assim, o talento do artista (mais recentemente, uma outra canção sua, “Sem Aviso”, ganhou pungente interpretação da exigente Maria Rita). “Raro e Comum”, o segundo CD, veio em 2005 e ratificou a habilidade de Fred em criar músicas bem construídas e de fácil assimilação, a exemplo da inspirada faixa-título e da bela “De Novo”. No ano seguinte, por ter-se sagrado vencedor do 9° Prêmio Visa de Música Brasileira – Edição Compositores, ele lançou, nos formatos CD e DVD, “Tempo Afora”, projeto que, de certa forma, fez um apanhado geral de sua carreira.

Quanto ao disco recém-lançado, ele é, de fato, um trabalho bem diferente dos anteriores nos quais Fred fincou pé no pop, mostrando-se um compositor criativo e antenado, mas acima de tudo eclético, qualidade fundamental para qualquer autor que não queira se perder rapidamente no limbo da mesmice. Corajoso, ele optou por lançar um álbum temático, decerto mais difícil de ser assimilado que os antecessores, pois, em alguns momentos, termina soando demasiadamente homogêneo. É por este motivo que o ouvinte mais cuidadoso necessitará de repetidas audições a fim de poder se familiarizar com as (boas) canções apresentadas.

Mesmo tendo como protagonista a já citada Bossa Nova (estilo que predomina no repertório de treze faixas), Fred termina rendendo homenagens, ainda que por vias transversas, mas por conta das influências melódicas, a três grandes nomes do nosso cancioneiro. É que se ouvem ecos de Caetano Veloso, João Bosco e Chico Buarque na faixa-título, em “Asas do Desejo” e em “Tudo Teu”, respectivamente, todas elas grandes momentos.

Fred canta bem legal (com timbre e dicção definidos) e os arranjos soam bastante apropriados para as canções, com destaque para as sensíveis cordas que realçam as sutilizas harmônicas da bonita “Amo Tanto” e da soturna “Dormir”. Os maiores destaques ficam, contudo, com a excelente “Por um Fio” (com acento mouro), com a criativa “Olhos em Chamas” e com a delicada “Breve Primavera” (na qual Fred se basta ao violão).

Trata-se de uma tentativa arriscada, mas o verdadeiro artista só consegue se satisfazer por inteiro quando se lança em inteligentes vôos artísticos. Fred Martins decidiu se mostrar agora mais linear visando, contudo, poder ressaltar um outro lado de sua pluralidade…  Ouça!

 

 

N O V I D A D E S

 

 

·                     Marco Vilane estará lançando, ainda este mês, seu terceiro CD intitulado “Varal Diverso”. Baiano de nascimento, sergipano de coração e ora radicado em São Paulo, Vilane apresentará um disco recheado de canções inéditas. Quem já conhece o trabalho do artista sabe que virá coisa muito boa por aí!

 

·                     A gravadora Som Livre porá no mercado, um CD duplo que comemorará os setenta anos que o cantor Wilson Simonal teria completado em 2009, caso vivo estivesse. A idéia é que a seleção de repertório (que está a cargo de Max de Castro, seu filho) cubra todas as fases da carreira fonográfica de Simonal. A propósito: seguido essa linha de homenagens, a gravadora EMI relançará a caixa “Wilson Simonal na Odeon 1961 – 1971″ que agora virá com um disco inédito no Brasil, “México 70”.

 

·                     Uma coletânea dupla por enquanto lançada somente na Europa (“Roots of Bossa Nova 1948 – 1957”) está causando o maior frisson por conta da inclusão de duas gravações bastante raras da fase inicial da carreira do cultuado João Gilberto (“Quando Ela Sai” e Meia Luz”), feitas em agosto de 1952 sob a batuta da orquestra do maestro Orlando Silveira. Outros nomes presentes na compilação (que deverá chegar em breve ao Brasil) são: Sylvia Telles, Tito Madi, Silvio Caldas, Johnny Alf, Doris Monteiro, Maysa e Garoto.

 

·                     Depois de um período de recesso, a cantora Marina Lima volta à tona cheia de planos. Este ano ela estará lançando o registro do show “Primórdios”, captado ao vivo no palco do Auditório Ibirapuera (SP) em 2006, o qual apresentará, nos extras, duas canções novas. Já para 2010, a artista anuncia o lançamento de um álbum de inéditas.

 

·                    Atualmente contratada pela gravadora Biscoito Fino, Maria Bethânia terá DVD posto no mercado pela Universal, sua antiga casa. Trata-se do registro ao vivo do show “As Canções que Você Fez pra Mim, realizado em 1994 e que teve a direção de Gabriel Vilella. O repertório é totalmente centrado em canções assinadas pela dupla Roberto e Erasmo Carlos. E por falar na Abelha Rainha, a filha mais famosa de Dona Canô mostra fôlego ao confirmar o lançamento, no segundo semestre, de dois álbuns recheados de canções essencialmente inéditas. Compositores presentes em sua discografia deverão estar presentes, como é o caso de Chico César, Adriana Calcanhotto, Vanessa da Mata, J. Velloso e Roque Ferreira.

 

·                      Meu Nome” é o título do novo CD da cantora Ceumar. Produzido pelo holandês Ben Mendes, o álbum possui vinte faixas, das quais oito são assinadas somente pela cantora que se assume de vez compositora. Nas restantes, a artista mostra parcerias suas com nomes como Mathilda Kóvak, Gero Camilo, Kléber Albuquerque, Tata Fernandes, Dante Ozzetti, Sérgio Pererê e o pianista cubano Yaniel Matos.

 

·                     Seguindo os passos de Toni Garrido, Da Gama (o ex-guitarrista da banda Cidade Negra) estará em breve lançando o seu primeiro CD solo já intitulado de “Violas e Canções”. Dentre os compositores selecionados para o repertório estão Marcos Valle, Liah e George Israel.

 

·                     Romulo Fróes lança um CD duplo recheado de canções inéditas através dos quais mostra os novos caminhos de sua música. A maioria das faixas pertence a ele e a seus parceiros Clima e Nuno Ramos. O CD 1 intitula-se “Cala Boca Já Morreu” e traz como destaques as canções “A Anti-Musa”, “Para Quem Me Quer Assim”, “Anjo” e “Qualquer Coisa em Você Mulher”. A cantora Mariana Aydar é a convidada especial em “De Adão pra Eva”. Já o CD 2 (superior ao outro) recebeu o nome de “Saiba Ficar Quieto” e alcança grandes momentos com “Manda Chamar”, “Caia na Risada”, “Para Fazer Sucesso” e “Dia Tão Cinzento”. As participações especiais ficam por conta de Nina Becker (em “Astronauta” e no medley que une os ótimos frevos “O Que Todo Mundo Quer” e “Ninguém Liga”), Andréia Dias (na releitura de “Uva de Caminhão”, de Assis Valente), Lulina (em “Se Eu For”) e Anya (em “Ela Me Quer Bem”). Talento, ousadia e coragem em doses certas… Vale conhecer!

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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