O DIA DA SERGIPANIDADE

O 24 de outubro, Dia de Sergipe, caiu em desgraça. A desculpa seria o grande número de feriados durante o ano, mas o certo é que Sergipe passou a ser celebrado pelo 8 de julho (de 1820), data da Carta Régia que emancipou, politicamente, o território sergipano, desanexando-o do da Bahia, do qual se manteve parte, desde a descoberta do rio São Francisco, em 4 de outubro de 1501, por Américo Vespúcio, criando condições da divisão do Brasil em Capitanias Hereditárias que consolidou o domínio.

 

Durante mais de um século e meio o povo sergipano comemorou o dia 24 de outubro, como sua data maior, expressão cívica da sua luta, símbolo da própria sergipanidade. O 8 de julho tinha ficado como página virada da história, por conta de não ter gerado os efeitos devidos. O gesto emancipador de D. João VI foi desobedecido pelas autoridades da Bahia e de Portugal, então muito unidas.

 

O 8 de julho, então, não consolidou a emancipação, mas, ao contrário, provocou uma reação, que só foi superada no contexto do processo de Independência do Brasil, de 1822. O primeiro governador, depois da Carta Régia – Carlos César Burlamaqui -, nomeado em 25 de julho de 1820 para substituir Luiz Antonio da Fonseca Machado, tomou posse em 20 de fevereiro de 1821, governando menos de um mês.

 

Burlamaqui estava no Piauí, onde morava com a mulher Mariana Henriqueta Burlamaqui e com os filhos, quando recebeu a notícia da nomeação para governar Sergipe. Saiu de Oeiras em fins de 1820, com dois filhos, e chega em 3 de janeiro de 1821 na Bahia, de onde saiu, em 5 de fevereiro, depois de receber as orientações de estilo. Levou 14 dias para chegar em Sergipe e no dia 20 assume o Governo, de onde é apeado no dia 18 de março. No seu lugar, no dia 21 de março de 1821, é revestido da autoridade de governador o brigadeiro Pedro Vieira de Melo, fiel a Bahia.

 

Várias pessoas, sozinhas ou compondo Juntas, governaram Sergipe. Em outubro de 1821 foi instalada uma Câmara e esta, em março de 1822 elegeu uma Junta, composta por José Mateus da Graça Leite Sampaio, como presidente, Guilherme José Nabuco de Araújo, Comandante das Armas, padre Serafim Alves da Rocha, secretário, Sargento Mor Dionízio Rodrigues Dantas, Domingos Dias Coelho e Melo e padre José Francisco de Menezes Sobral, membros.

 

Em 14 de novembro de 1822 o General em Chefe do Exército pacificador Nacional e Imperial Pedro Labatut nomeou José Eloy Pessoa da Silva, militar e bacharel formado em Matemática e em Filosofia, para governar Sergipe. Toma posse em 25 de novembro, aclama o Imperador em 1º de dezembro. Uma Carta Imperial, de 5 de dezembro de 1822, elevou Sergipe a categoria de Província de 2ª classe, “completamente independente da Bahia, conforme o Decreto de 8 de julho de 1820” e determinou a criação de um Conselho de cinco membros.

 

No ano de 1823, depois de ato de força do governador militar José de Barros Pimentel a Junta reassume, em 3 de março, como Governo Provisório. Uma Carta, datada de 8 de abril, elevou à categoria de cidade a vila de São Cristovão, capital da Província de Sergipe. Finalmente é nomeado, em 23 de novembro de 1823, Manoel Fernandes da Silveira, que toma posse como presidente do Conselho em 5 de março de 1824. A Constituição do Império, consolida e é com o brigadeiro Manoel Fernandes da Silveira que Sergipe se torna, efetivamente, emancipado.

Foram quase quatro anos de um enfrentamento entre os partidários da desanexação e os que defendiam a manutenção da situação velha, que subordinava Sergipe aos controles da Bahia, além de dotar o território sergipano das responsabilidades pela produção de carne de gado e de açúcar de cana, para atender ao abastecimento da Bahia e de Pernambuco que produziam para exportação. Entre os sergipanos que pelo norte e oeste pastoreavam o rebanho de gado, e no centro mantinham engenhos de fazer açúcar o ânimo era dos melhores.

 

Com a emancipação as vilas cresceram, surgiram as cidades e rapidamente o progresso deu a Sergipe uma nova condição. O dia 24 de outubro passava, por volta de 1836, a ser a data maior da afirmação da liberdade dos sergipanos. O poeta Manoel Joaquim de Oliveira Campos fez os versos do Hino Sergipano, inicialmente publicados no jornal O Noticiador Sergipense, mais tarde musicados pelo frei José de Santa Cecília, para ser o primeiro dos símbolos de Sergipe, uma manifestação festiva, de júbilo pela conquista.

 

O 24 de outubro entrou, definitivamente, para a história de Sergipe como o coroamento de um processo e como uma data simbólica, que segundo Cândido Mendes, no Atlas do Brasil, de 1860, representava a divisão territorial do Brasil, quando Sergipe passa a aparecer como Província. Os jornais mais antigos registraram que o 24 de outubro foi o dia em que a notícia da completa emancipação chegou a São Cristovão, levada pelo senhor do engenho Itaperoá. Não há, assim, como justificar a data, mas sim que ela é a mais viva manifestação do patriotismo sergipano, o ponto final de uma campanha, que ainda não foi devidamente estudada.

 

Durante o Império o 24 de outubro passou a ser, também, celebrado pelo povo com seus grupos folclóricos, como atestam os registros dos jornais. Na República, o 24 de outubro passou a ser a data da posse dos novos governantes, associando o dia com os mandatos, como se os políticos tivessem compromissos com os ideais libertários que a emancipação enseja. A retirada da data, embora vede aos estudantes o contato cívico, não diminui a grande importância e nem a carga emotiva que marcam o 24 de outubro.

 

Dia de Sergipe ou Dia da Sergipanidade, o 24 de outubro tem a cara, o sentimento, a coragem dos sergipanos, na afirmação dos seus interesses e projetos. Todas as vezes que for preciso recorrer à história, para construir o futuro de liberdade, prosperidade, e paz, o 24 de outubro estará inabalado em sua importância, como uma referência que pertence a todos os sergipanos, de todos os tempos.

 

Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”. Contatos, dúvidas ou sugestões de temas: institutotobiasbarreto@infonet.com.br.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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