O futebol não cabe num sutiã

Quem quiser conhecer a realidade da imprensa brasileira basta voltar os olhos para a programação do jornalismo esportivo. Superficialidade, negação da diversidade, preconceito e ausência de questionamento são algumas características da imprensa esportiva que são, em verdade, marcas da grande mídia nacional.

Não pretendo aqui me alongar sobre esses aspectos, mas falar apenas sobre os dois últimos (preconceito e ausência de questionamento), que se manifestaram no conjunto da imprensa tupiniquim no último domingo, a partir de um episódio natural que aconteceu na partida entre Cruzeiro e Bahia pelo Campeonato Brasileiro de futebol.

Ao comemorar o segundo gol do seu time, uma torcedora do Bahia vibrou batendo no peito, levantando a camisa e beijando o escudo do seu clube. Sim, algo natural. Algo que todo torcedor faz, ainda mais quando o gol é na casa do adversário, aos 45 do segundo tempo, garante a vitória contra o já campeão brasileiro e livra o seu time da possibilidade de um rebaixamento para a segunda divisão do futebol nacional. Algo que jogadores (mesmo que não tenham nenhum sentimento pelo time) também fazem. O “problema” para a imprensa esportiva foi, que durante a comemoração, o sutiã da torcedora apareceu.

Pronto. Bastou um sutiã branco aparecer para que a imprensa esportiva demonstrasse todo o seu machismo em rede nacional. Nos mais diversos programas de esporte das diferentes emissoras de televisão, nas capas dos cadernos esportivos dos jornais de Salvador e em sites de futebol na internet, um simples sutiã branco ofuscou o nada simples triunfo do Bahia sobre o Cruzeiro em pleno Mineirão, com mais de 60 mil pessoas. Não fosse o espetáculo criado pela imprensa, o sutiã passaria despercebido. Eu, por exemplo, assiti ao jogo pela televisão e, no momento da comemoração da torcedora, os meus olhos não estavam mais na TV. Eu, por também ser torcedor, já estava vibrando pela casa.

Mas, infelizmente, nada diferente da imprensa brasileira em geral. Assim como nas propagandas e programas de auditório a mulher é reduzida a bundas e seios, a adolescente Isabella Costa deixou de ser torcedora do Bahia e deixou de ser mulher. Ela se tornou apenas o seu sutiã. E pelo seu sutiã, logo começaram inúmeros adjetivos à torcedora. Alguns já até tentam transformá-la em símbolo sexual (sic). Apenas por um sutiã.

Além da clara violação da mulher como um ser de direitos, essa postura da imprensa nega a própria essência do futebol. Digo isso porque bater no peito, levantar a camisa e beijar o escudo do seu time é algo que se faz nas peladas e babas de várzea e de asfalto de Norte a Sul do país, imagine num estádio de futebol. Na verdade, isso é pouco. Torcedor tira a camisa, abraça a primeira pessoa que estiver do seu lado, beija, faz festa. Sim, porque por mais que o tentem mercantilizar (e, infelizmente, estão conseguindo), futebol é alegria, é festa, é também sofrimento, já que é puro sentimento. E nem alegria, nem festa, nem sofrimento, nem sentimento cabem num sutiã. Nem cabem na machista imprensa esportiva brasileira.

p.s.: Isabella concluiu há pouco o Ensino Médio e pretende cursar a faculdade de Jornalismo. Espero que ela resista e negue esse tipo vergonhoso de jornalismo.

p.s. 2: Como torcedor do Bahia, senti vergonha também do zagueiro Demerson (irmão da torcedora) que afirmou: “Se os torcedores esgotarem os ingressos para a partida contra o Fluminense, eu vou levar a Isabella para assistir ao jogo. Ela se tornou a musa do Bahia, todo mundo vai gostar”.

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TEXTO 2 – Um abraço, Déda.

Abaixo uma pequena homenagem a Marcelo Déda Chagas. O texto que segue foi publicado originalmente pelo titular deste blog em um rede social na internet na última segunda-feira (2), após a notícia de falecimento de uma das principais lideranças políticas que Sergipe já conheceu.

"Déda, não tive a oportunidade de te conhecer pessoalmente. O mais próximo (fisicamente) que estive de você foi em 15 de julho de 2011, durante a posse dos Secretário de Direitos Humanos e Cidadania, do Diretor da SEGRASE e do Presidente da Fundação Aperipê. Naquele mesmo dia, Déda, até escrevi um artigo criticando a sua visão sobre a comunicação pública. Mas enfim, essa não é a questão do momento. Por agora, quero dizer que você fazia parte da lista daquelas pessoas que pensamos “rapaz, eu queria sentar um dia com 'fulano', ficar de bobeira, tomar uma cerveja e ouvir suas histórias”.

Tenho apenas pouco mais de três anos vivendo em Sergipe, Déda. E a minha vontade de conhecê-lo nasceu e sempre foi alimentada pelo povo do estado que você tão bem governou. Nas longas conversas com taxistas, nos papos rápidos com cobradores e passageiros de ônibus, em mesas de bar com amigos e colegas e em rodas de conversa, os inúmeros adjetivos que lhe credenciavam só faziam aumentar a minha vontade de conhecê-lo pessoalmente. Quem sabe, como jornalista, entrevistá-lo e entender um pouco mais sobre a vida política do melhor governador da história de Sergipe. Não sou eu quem digo isso, mas o próprio povo sergipano, beneficiário das políticas públicas por você implementadas. Quem ousa afirmar o contrário, nega a história, desconhece a realidade.

Depois de você, dizem os/as sergipanos/as, Sergipe só permanece pequeno em extensão territorial. Esses mesmos sergipanos/as, Déda, estavam desejosos de – no próximo ano – elegê-lo para uma vaga no Senado Federal. Eu também. Sem dúvidas, seria o meu primeiro voto em você. Não iria apenas votar, iria fazer campanha, carregar bandeira, entregar panfleto, pedir voto.

Mais recentemente, o conheci mais de perto, porém ainda não fisicamente. Há pouco mais de um ano que milito no mesmo partido que você ajudou a fundar, companheiro Déda. E nas eleições internas do nosso partido esse ano, todos fizeram questão de ressaltar o seu legado para a política, para o PT e para Sergipe. Em todos os debates do PED, quando falavam da sua dedicação e fidelidade ao PT e a Sergipe, os meus ouvidos (e de toda a militância jovem do partido) se abriam mais para, a cada momento, conhecer um pouco mais do homem que moveu milhares de sergipanos/as, de todas as partes do estado, numa corrente de oração. Até mesmo os/as que não acreditam em qualquer oração, pediram por sua saúde e por sua vida, Déda. Líder, ético, honesto, extrema capacidade de escuta, de síntese e formulação foram apenas algumas das suas características ressaltadas durante o processo eleitoral do PT Sergipe. Sobre a sua oratória, nem precisa, né? Até mesmo a Presidenta Dilma falou que Sergipe tinha o maior orador do país.

Companheiro Déda, um dia a gente se bate por aí. Não sei onde nem quando, mas ainda vamos bater um longo papo. Você escolhe o assunto da conversa. Pode ser o PT, pode ser Sergipe, podem ser suas histórias. Fique tranquilo, escutarei com a mesma atenção, admiração e prazer. Um abraço".

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