O vôo

Era uma vez uma mocinha bonita, tão branquinha, trabalhava na portaria de um jornal diário, ali ela recebia anúncios de balcão, eventualmente vendia quem procurava pela edição, telefonava, esses serviços. E atendia tão bem , que todos gostavam dela. Nesse ponto da conversa do senhor , o amigo interrompeu-o: mas você vai fazer um conto (ficção) com essa história ou contar uma história de verdade?Pode ficar piegas. O senhor disse: é uma história de vida sim, mas de literatura também. Dane-se para a pieguice! E prosseguiu:

A mocinha era encantada pela redação e fez amizade com quem organizava a coluna social e passou a colaborar  e a se interessar. O diretor disse-lhe: você tem jeito e     colaborava com notas para a coluna social porque ela gostava de ler sobre festas, personalidades, acontecimentos, etc. E um dia em que o cronista  social saiu do jornal, o diretor disse-lhe: faça a coluna! Seu coração pulou, acelerado. Mas ela não era jornalista e foi quando um dirigente sindical, argumentando que não existia ainda turma formada por nenhum curso local, podia lhe fornecer um registro de provisionada, legalizando a sua situação. Tudo porque já se falava  fulana está escrevendo coluna social, uma moça que trabalha na portaria, vejam só! E quando souberam que o sindicalista lhe fornecera um registro, garantindo-o: assine a coluna! as conversas e protestos aumentaram. Que moça ousada! Que sindicalista irresponsável!

Mas a mocinha nem ligou. Deixou a portaria, se dedicou a escrever uma coluna do jornal e brilhou em pouco tempo e outros colegas o apoiaram. Vieram outros jornais.

Tudo ia bem, ela estava deslumbrada, a sociedade o acolhera, o tempo passa, quando em uma festa de fim de ano, lhe convidaram para um pequeno vôo em um monomotor. Subir e descer, rápido. Ela foi. O pequeno aparelho subiu e em certo ponto, desceu direto, caindo no chão, matando os dois, o piloto e a mocinha, que então já era uma mulher. Mas conservava seu rosto branquinho de menina. Ao redigir a notícia, o amigo citou Drummond: ascendo verticalmente e me transformo em notícia! (Menina, seu espaço social era para você voar, mas não em um aviãozinho! E porque em tudo Drummond e Pessoa sempre têm uma frase para definir um drama?). 

 

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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