O voto

Todo mundo lhe engana dizendo que você vai exercer sua cidadania votando, mentira. O editorial do jornal diz que o seu voto pode mudar o mundo e o país. Mentira. Diz os órgãos oficiais, que gastam milhões nas eleições, para legitimar nosso fracasso como seres humanos, que o seu voto não pode ser vendido, que você é um ser com muitos valores e que precisa ajudar a mudar a consciência dos eleitores com o seu voto. Mentira. Todos dizem que o deficiente, o idoso, o especial vai poder exercer a sua cidadania votando. Mentira. Que para a democracia a eleição é a maior festa que pode existir numa nação e que por ela nos tornamos livres e independentes. Mentira. Todos dizem que os candidatos são o reflexo do que é o povo brasileiro. Mentira. Dizem  ainda que o seu voto é mais importante que apertar o botão zerando tudo. Mentira. No fundo, o que se estabeleceu é que a própria ética ficou cínica, e se ficou cínica não é ética dizem os sociólogos. Mentira. A ética é feita de consciências compradas. País de miseráveis segurando bandeira por vinte e cinco reais. País de crianças entregando panfletos, se mutilando por um cachorro quente com schin porque o pai vai ter um cargo em comissão prometido pelo candidato que nunca vai dar. Os gabinetes, depois das eleições, estarão abarrotados de parentes, como inventaram que isso é nepotismo,vão  fazer o nepotismo cruzado  com os sogros, irmãos e tias, e noras e genros. Vão colocar aquela moça bonitinha na recepção estilo Sheila Perez ou o rapaz galã como motorista e motoboy, – tudo pago por você, que votou legitimando a farsa. Durante quatro anos, os políticos eleitos terão direitos a amantes fiéis em troca de um contra-cheque, poderão almoçar no gabinete, na Assembléia, na Câmara ou no senado e  a quentinha será paga pela verba extra. Os mais afortunados terão direito também a uso de celular, carro particular e podem vez por outra viajar de avião para encontrar o chefe num bistrô de Copacabana. A grande festa do dia 03 de outubro incorpora o grande circo, a epopéia dos direitos humanos, corroídos por um sistema farsante que vai desde compra de votos, a saques extraordinários em banco, a compensações de empreiteiras que financiam e doam(?) boazinhas que elas são. Quando acabar as eleições, Deus será chamado para a missa da posse, e sob a sua bênção todos os cargos serão publicados no Diário Oficial, secretários convidados para as pastas, não haverá choro nem ranger de dentes, todos tomarão prosecco e moet chandon, – muitos vão rir, outros vão chorar, o TRE divulgará notas que foi a eleição mais perfeita do planeta, que tudo correu as mil maravilhas, que muitos foram presos e depois liberados, que nada foi provado,que o povo foi às ruas, demonstrou sua força e fome de liberdade e democracia. Haverão fogos no céu, carros em buzinaço pelas avenidas e o povo estrangulado e sórdido também, esperará pelo seu carro consorciado, seu cartão vencido, sua casa financiada, seu plano de saúde sem médicos, seu filho sem colégio, sua vida sem segurança. Assim, romperemos outras eleições daqui a pouco para vereador e prefeito, ouviremos as mesmas ladainhas nos horários gratuitos do TRE, riremos dos candidatos folclóricos, veremos pastores na TV dizendo que Jesus venceu o mundo, e ele vencerá também, acreditaremos nos que usam terno, que eles trouxeram muito dinheiro para a cidade, e, por fim, compraremos camisa com a cor do partido de preferência, e como numa partida de baisebol nos transformaremos em skinheads de nós mesmos. Prontos para a próxima contagem de votos. Para ver quem foi mais cretino, cruel e sórdido. Quem conseguiu vencer a inocência de milhões de brasileiros. Com o taco de baisebol, sempre apontado para nossas próprias cabeças.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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