Em tempos difíceis de alto grau de conservadorismo como o que estamos atravessando, posições que vão na contramão dos direitos dos trabalhadores surgem até mesmo de entidades que têm como marca histórica o compromisso com os valores democráticos.
Entendo que esse é o caso do recente posicionamento da Seccional Sergipe da Ordem dos Advogados do Brasil, via sua Comissão de Direitos Humanos, frente à greve dos policiais civis do estado.
Vejamos. Em nota pública, a CDH da OAB/SE afirma que “o direito à reivindicação de melhores condições de trabalho e vencimentos é inegável. Contudo, percebe-se que a forma como está sendo conduzida macula direitos dos presos, seus familiares e da população em geral”.
Segundo dados do Ministério da Justiça, Sergipe possui um déficit de quase 2000 vagas no sistema carcerário, o que acaba por gerar a superlotação das unidades prisionais. Apenas o Complexo Penitenciário Dr. Manoel Carvalho Neto, em São Cristóvão, que tem capacidade para 800 vagas abriga, atualmente, mais de 2000 pessoas.
Frente a esta realidade, evidente que a OAB/SE tem o compromisso de se manifestar sobre o sistema carcerário em Sergipe e, em especial, sobre os direitos das pessoas que estão presas, que constantemente têm seus direitos básicos negados. E a OAB/SE o tem feito, por diversas vezes e maneiras. Porém, é preciso reconhecer: a nota publicada na última semana vai em outro caminho.
Não há em toda a nota pública uma linha sequer sobre a necessidade do Governo do Estado garantir os direitos dos servidores da segurança pública, mas apenas uma “profunda preocupação” (como está escrito na própria nota) com a greve. Assim, a nota da CDH, que aparenta ser uma posição preocupada exclusivamente com a situação do sistema carcerário em Sergipe, se revela, na essência, como uma tentativa de criminalização dos agentes e delegados de Polícia Civil, ao tentar responsabilizá-los pela possibilidade de agravamento dos problemas que enfrenta o sistema prisional e toda a segurança pública do estado.
Em termos comparativos, a nota da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SE se assemelha a conhecidas declarações de integrantes do Poder Executivo quando, por exemplo, negam direitos de trabalhadores da educação, e do Poder Judiciário, ao decretarem ilegalidades de greves, quando o objetivo é responsabilizar professoras e professoras pelos problemas da escola pública e tentar colocar o conjunto da população contra os profissionais do magistério.
O problema é que, neste caso, não estamos falando de gestores públicos acostumados ao autoritarismo, mas sim da Ordem dos Advogados do Brasil, entidade que, desde a sua fundação, tem participação direta e indireta em todas as conquistas trabalhistas e democráticas do país.
Com a nota pública, a CDH da OAB/SE ignora que o Governo do Estado anunciou o parcelamento do pagamento de todos os servidores públicos, incluídos aí os agentes e delegados, e que não aplica o Plano de Cargos, Carreiras e Vencimento da Polícia Civil de Sergipe, nem concede reajuste salarial de acordo com o índice inflacionário. Ou seja, a Comissão de Direitos Humanos da OAB/SE, com essa posição, “apedreja” os trabalhadores da segurança pública e “afaga” o Governo do Estado.
Frente a isso, não faz mal algum perguntar: não já basta o Governo do Estado negar sistematicamente direitos dos trabalhadores e o Poder Judiciário decretar ilegais todas as greves em Sergipe, agora a OAB/SE, via Comissão de Direitos Humanos, também direciona todo o seu respaldo social contra trabalhadores em reivindicação pelos seus direitos?