Opções econômicas e opções sociais

Viver é fazer opções, é ter que, diariamente, fazer escolhas sobre todas as coisas. Mesmo o ato de não escolher é uma escolha, uma forma de decidir, pois a omissão ou o simples acomodamento provoca conseqüências, graves ou não. O dilema da escolha já começa no nascer da consciência quando, ainda sem engatinhar, somos forçados a fazer as mais ousadas escolhas, algumas refletindo e marcando o futuro, a exemplo de chuparmos o dedo ou uma chupeta no que se refere à formação dos dentes;  transformarmos em ficar ou namorar aquele ou aquela que será uma linda nuvem passageira, uma eterna noite de luar ou uma tempestade carregada de raios e trovões a atormentar o navegar pela vida.

 

Escolhemos os amigos, elegemos os inimigos e somos por eles escolhidos. Escolhemos até quando escutamos os falsos amigos, mesmo quando nos alertam de sua falsidades e abraços interesseiros. Enfim, estamos sempre a recitar, ainda que imperceptivelmente, o que um dia exclamou Shakespeare através do seu predileto Hamlet, com o seu famoso “ser ou não ser, eis a questão”.

 

Os religiosos chamam o processo de escolha de livre arbítrio, o poder de fazer o seu próprio caminho. Não difere deste conceito a ciência, com esclareceu Carl G. Jung, o famoso psicólogo, ao afirmar que “Livre Arbítrio é fazer bem feito o que nos somos obrigados a fazer”. No campo do fazer bem feito, Buda, por exemplo, escolheu sair da cidade encantada para encantar o mundo com a sua mensagem de paz, retidão e amor. É no budismo, mais precisamente no Padmasambhava, que encontramos esta pérola de lição: “Se queres saber sobre tua vida passada, olhe para tua vida presente; Se queres saber sobre tua vida futura, olhe pra teus atos presentes.”

 

Assim como o homem faz escolhas em sua vida individual, independentemente da motivação, não é diferente em sua vida coletiva, embora, não raro, nesta complexa área também se decida por ele. Aliás, neste campo não há espaço para vazios decisórios, pois sempre tem alguém ou um outro grupo a escolher pelo outro, por imposição, convencimento, medo, respeito ou outra forma de consolidar uma idéia.

 

Hoje a escolha da moda, especialmente no que se refere à política, é saber qual a melhor opção para o Brasil, se a “opção econômica” ou a “opção social”. Escolher a “opção econômica” é apostar na política em que se preserva a manutenção de um sistema fundado no privilégio do Capital sobre as pessoas, na sustentação de uma estrutura que conserve as forças que dominam, são destinatárias principais e traçam as diretrizes de um Estado e que tornam secundárias ou meramente complementares as medidas que ressaltar a igualdade, a liberdade e a solidariedade entre os homens. Da mesma forma, escolher a “opção social” é apostar na política que privilegie o Homem, fornecendo elementos para que se reduza a desigualdade e a injustiça, permitindo habitar um planeta saudável e acessível a todos.

 

Na História das opções, sempre prevaleceu a chamada “opção econômica”, sempre se buscou adotar uma política de preservação da estrutura econômica, fazendo-se, sempre, opções de proteção desta classe. Eram os nobres, os de sangue-azul e os vassalos os beneficiários das decisões feudais. Os fidalgos, os traficantes de escravos e os ricos comerciantes os que lucravam durante o mercantilismo. Os proprietários de terra na Independência dos EUA. Os burgueses na Revolução Francesa. Os industriais na Revolução Industrial. Os barões do café e os proprietários rurais na Velha República e assim sucessivamente.

 

É assim no mundo tido como moderno, em que todos têm que se adequar aos interesses do capital internacional, às multinacionais e aos industriais e proprietários de terra dos países tidos como do primeiro mundo. Não sem razão as palavras de ordem apontadas como moderníssimas são globalização, flexibilização de direitos, razões de mercado, riscos econômicos, privatizações, competitividade, subsídios agrícolas, moeda única, blindagem econômica, mercados comuns e outras variantes para o mesmo gênero.

 

Em assim compreendendo, é possível, de logo, concluir que existe uma espécie de “quase-incompatibilidade” entre uma opção e outra. “Quase-incompatível” porque a História tem demonstrado que as classes que controlam o Poder, umbilicalmente ligadas ao setor econômico, exigem exclusividade de ação e destinação, pouco arriscando ou avançando no que se refere à possibilidade de acedência das demais classes. É o que se poderia chamar de sobrevivência de classe, em que uma fica a adotar medidas que impeçam o fortalecimento da outra. E o pior é a as “opções sociais” somente servem de esquecidas proposta para que se conquiste o poder, que logo são substituídas pelas velhas “opções econômicas”.

 

Cezar Britto, é advogado e secretário-Geral da OAB
cezarbritto@infonet.com.br

Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais