Regime Diferenciado de Contratações

Sobre o Regime Diferenciado de Contratações, ainda em discussão no Congresso Nacional, concedi entrevista ao jornalista Cristian Goes, que publicou a matéria no Jornal do Dia da data de 16/07/2011, cujo teor transcrevo abaixo
(http://www.jornaldodiase.com.br/viz_conteudo_geral.asp?codigo=16720119455186486):

Pergunta – O que consiste, em resumo, no Regime Diferenciado de Contratação (RDC) que vai ser empregado nas obras da Copa do Mundo de 2014?

Resposta – Consiste num conjunto de normas jurídicas específicas sobre contratações públicas, aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização dos Jogos Olímpicos e Parolímpicos de 2016, da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo de 2014, com o suposto objetivo de ampliar a eficiência nas contratações públicas, assegurar tratamento igualitário entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública.

Pergunta – Qual sua avaliação sobre ela? A não divulgação de valores nesse processo não fere a Constituição Federal no quesito da publicidade?

Resposta – O Regime Diferenciado de Contratações é uma excrescência jurídica, desde a sua origem. Tomando carona em medida provisória que tratava de assuntos diversos (organização e estrutura da Presidência da República, Ministérios e Secretarias vinculadas diretamente à Presidência), o Congresso Nacional aprovou projeto de conversão, inserindo esse regime especial de contratações públicas, aplicável apenas aos grandes eventos desportivos internacionais que o Brasil vai sediar em 2013, 2014 e 2016. Trata-se de um regramento jurídico de exceção, flagrantemente inconstitucional, que afasta boa parte das exigências constitucionais e legais para licitações e contratações públicas e abre margem para o aporte de recursos públicos de monta para financiamento de eventos privados, sem os mecanismos de controle presentes na Lei n° 8.666/93 (cuja aplicação é expressamente afastada) e que se aplicam às licitações públicas em geral.

Pergunta – Se o RDC é para impedir a formação de cartel, protegendo o erário público, como alega o Governo, porque esse regime não se torna regra na legislação?

Resposta – A divulgação dos valores que o Governo pretende pagar apenas após a fase de habilitação dos licitantes não assegura que empresas não façam precombinação de preço, porque essa precombinação pode ser feita mesmo sem o prévio conhecimento dos valores que o Governo estimava pagar. Ou seja: a suposta intenção de impedir a formação de cartel não será alcançada com o RDC. Daí porque o RDC é inócuo para esse fim, mas a sua aprovação transmite uma mensagem negativa para a população em torno dos rigores da Lei 8.666/93 e abre ensejo para, no futuro, alterações legislativas com vistas à flexibilização das regras de transparência dos processos licitatórios.

Pergunta – A implantação do RDC é uma prova que a Lei das Licitações (8.666) está ultrapassada ou o RDC não altera em nada a atual legislação de compras pelo poder público?

Resposta – A Lei 8.666/93 não está ultrapassada, até porque vem sendo constantemente atualizada ao longo do tempo. Claro, há necessidade de constantes aperfeiçoamentos, tendo em vista o evoluir da sociedade, das tecnologias e ainda a meta permanente de evitar as fraudes que são praticadas ao erário por meio de brechas nela encontradas, mas aperfeiçoar a lei 8.666/93 não significa romper com ela. Ultrapassada, porém, deveria estar a falta de planejamento administrativo, que faz com que compras governamentais de rotina não sejam efetuadas a tempo, o que gera a crítica, quando da necessidade imediata da compra, de que a lei burocratiza e emperra o procedimento, atrasando a prestação do serviço. Ultrapassada deveria estar também a prática reiterada de diversos agentes públicos de ignorar solenemente as normas legais, confiando na eventual inefetividade dos mecanismos de controle externo da Administração Pública e na eventual letargia do controle social. Finalmente, o RDC somente se aplicará aos eventos esportivos mencionados, não alterando, por si só, a atual legislação de compras pelo poder público.

Pergunta – O RDC pode ser uma brecha legal para ser mais a frente aplicado por governos estaduais e ou municipais em grandes obras ou contratações?

Resposta – Juridicamente, não, porque a previsão do projeto é que o RDC será aplicado exclusivamente aos eventos que já mencionei; politicamente, porém, abre ensejo para que estados e municípios reivindiquem mudanças na legislação para aproximação da lei de licitações ao modelo do RDC.”.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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