Se a pessoa disser porque ama, é porque não ama

Interessante, não é mesmo? Mas, vamos pensar um pouco. Se eu verbalizo que amo fulano por causa do seu cabelo, não é fulano que estou amando. O que na verdade interessa ao meu “amor” é apenas o cabelo de fulano.

 

Quantas declarações são equivocadamente feitas: amo o seu jeito de ser, de andar, de se comportar; amo a sua pele, seus olhos e sua boca; amo você por causa da sua calma; você não me cria problemas, por isto eu a amo tanto.

 

Pergunta-se: é somente por isto que essa pessoa a ama? Quer dizer, no momento em que sua pele perder aquele brilho da juventude, você cortar o cabelo, tiver que usar óculos de grau, ou perder a calma, acabou o amor? Sim, acabou. Acabou aquele “amor”, que não era amor verdadeiro, sabe por quê? Porque aquela pessoa não amava você, ela amava algo que existia em você: os seus cabelos, que agora estão curtos; seus olhos, que agora se encontram protegidos por um par de lentes; ou o seu bom humor que, infelizmente, por forças da natureza humana e do seu dia-a-dia, mudou. O amor que ele dedicava a você era um amor apenas romântico, do prazer, de poder usufruir e “curtir” aquela beleza, representada pelos seus atributos que agora não são mais tão aparentes.

 

Amar é uma devoção, é a disposição de atendermos às necessidades e carências, inclusive de beleza, do outro. Amar implica até mesmo em sacrifício, se necessário, em prol do bem-estar do outro. O amor é ação. Como diz James C. Hunter: “amor é o que amor faz”. O amor é muito diferente do gostar e até do prazer.

 

O problema, de considerarmos amor estas qualidades determinantes, apequena o sentido do amor verdadeiro, pois, como elas são efêmeras, mudam no espaço e no tempo, criando assim justificativas para que os relacionamentos se acabem.

 

Este é o tipo que poderíamos classificar como amor de conveniência, posto que é apenas de aparências, não são qualidades de essência. Aí, sem uma melhor análise, vamos aliando à sublime palavra “amor” coisas como: paixão, compaixão, pena, misericórdia, afeição, beleza, gosto, sexo…

 

Acreditamos que tudo isso seja de suma importância. Necessitamos deste estoque de atributos e qualidades para podermos amar, contudo, o que não podemos é esperar que isto seja eterno, como o amor. Amar é, inclusive, entender a transitoriedade de tais virtudes ou qualidades que o tempo e as condições naturais da vida fazem-nas mudar.

 

Não há nenhum mal nisso, amor comporta com facilidade todas estas qualidades, porém, nem sempre elas em separado representam o verdadeiro amor. Este não tem por assento, exclusivo, obrigatoriamente, nenhuma daquelas.

 

Embora possa haver amor salpicado de paixão, afeição, coisas boas e do bem, estes atributos isoladamente são apenas sentimentos despojados da verdadeira beleza do amor, que vai muito mais além. O amor é doação plena. E, às vezes, como já dito, sacrifício. O amor é essência.

 

Busquemos, portanto, o amor essência, o amor verdadeiro em tudo o que fazemos na vida, pois, como já é bastante conhecido, tudo o que é feito com amor sai bem feito.

Dizem que, em determinada ocasião, um general estadunidense aproximou-se de Madre Tereza de Calcutá, exatamente no momento em que ela estava cuidando do ferimento de certo leproso. O militar, naturalmente com asco daquilo que presenciava, disse:

 

“Irmã, eu não faria isso por dinheiro nenhum deste mundo”.

 

Aquela santa mulher olhou-lhe fixamente nos olhos e respondeu:

“Nem eu general, nem eu. Não faço isso por dinheiro nenhum: eu só faço isso por amor”.

 

Um amigo, todo choroso, chega para mim e diz: Pascoal, você sabe como eu amo a minha esposa, não sabe?

– Sei, respondi. Vocês formam um belo casal, têm dois filhos lindos…

– Pois é, mesmo amando-a tanto, estou me separando, pois senti que não gosto mais dela como mulher.

– Espere! Você está dizendo que a ama, porém, não gosta mais dela? Não entendi. Se você dissesse ao contrário, ou seja, que gosta muito dela, todavia, não a ama mais; embora com muitas reservas, eu faria um grande esforço para entender. Mas, o que você acaba de dizer não faz sentido. Você está querendo provar, para você mesmo, alguma coisa e pede, involuntariamente, a minha aprovação.

– Não. Não é isto. Concluí que ela não é mais a mulher dos meus sonhos.

– Romantismo, meu caro. Desculpas, meu amigo. Pretextos para justificar alguma coisa que você está planejando.

Ele dizia tudo aquilo com ar de quem queria chorar, como a dizer: eu lamento muito pelo meu casamento de 20 anos, pelos meus filhos…

Não aguentei e fui direto:

– Se eu lhe fizer uma pergunta, você jura me responder a verdade?

– Claro, direi a verdade, não tenho necessidade de mentir.

– Quem é a sua atual namorada? Perguntei de chofre.

– Namorada?

– Sim, namorada. Com quem você está namorando?

– Não! É que eu e fulana estamos nos conhecendo. Eu descobri ser ela a mulher ideal, pois é bonita, mais nova…

– Como era a sua esposa, quando você casou há 20 anos?

– Ah! Era belíssima, mas o tempo passou e…

– E você como era?

Ele não respondeu, apenas riu, mas deixou transparecer que também já tinha envelhecido e, também, perdido aquele fulgor da juventude, etc.

– Amigo, o grande problema da grande maioria é que, quando casa, busca a pessoa perfeita para toda a vida, o que é absolutamente natural. Mas não trabalham para isto. Buscam e sonham com o melhor par. Mas, pouco se preocupam com o melhor relacionamento e fazem como você está fazendo. Tenha cuidado…

Só para concluir, isto aconteceu há uns dez anos. Ele efetivamente se separou, foi viver com a outra, não deu certo, tentou voltar para a esposa, o que não foi mais possível, por motivos óbvios: ela também já estava, discretamente, com outro. O que ele, ironicamente, demorou muito a aceitar. Hoje, está sozinho: uma hoje, outra amanhã, está há anos sem encontrar alguém que verdadeira preencha as suas perspectivas, que agora reconhece somente sua ex-esposa preenchia, me confidenciou recentemente, também meio choroso, como da vez que foi dizer que ela não servia mais, não ter encontrado alguém igual a ela. Como se diz por aí, está na prateleira já há uns três anos. Confidenciou-me que está infeliz, sem saber o que fazer com toda a “liberdade” que tem e, repete sem cessar: eu ainda amo a minha ex-esposa.

É às vezes amamos e não sabemos. O amor é uma plantinha frágil que necessita de cuidados diários para não murchar e morrer.

PENSEMOS NISSO

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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