SERGIPE, O PAÍS E O FORRÓ

Viajar de carro com a família pressupõe, além do óbvio cuidado com a segurança do veículo, estar equipado com uma boa e eclética coleção de CD’s. É que nem sempre os filhos seguem o mesmo gosto musical dos pais, ainda mais numa família composta por quatro filhos, com idades e características relativamente diferentes. Não é difícil compreender, portanto, que quando viajo com minha família também viajo no mágico e vasto mundo da música, escutando todos os estilos de canção. Não foi diferente o que ocorrera na minha última viagem, em que, aproveitando um dos feriados juninos, embarquei com a minha família rumo ao interior do Estado de Sergipe. Logo que iniciamos a viagem, um dos meus filhos – não me recordo qual – reivindicou que fosse ativado o velho e disputado som, embora não tivesse solicitado um cantor ou uma música específica. Imediatamente perguntei em voz alta se alguém tinha preferência, embora soubesse que estava “cutucando o leão com a vara curta”, pois não esperaria concordância em tão diversificado público. Para minha surpresa, ou mesmo porque ainda estavam todos sonolentos pelo iniciar da viagem e do dia, somente Manuela – minha filha de dezesseis anos – externou o seu pedido. Solicitou-me que fosse colocado o novo CD do grupo sergipano Calcinha Preta, embora já velho pela quantidade de vezes com que fora escutado nas nossas viagens. Minha esposa, mais esperta do que eu na arte de evitar briga entre os filhos, não esperou segunda ordem, passando imediatamente a procurar o CD solicitado. Evidentemente não queria dar tempo para que os outros fizessem suas próprias exigências, iniciando uma disputa em que somente teriam vencidos. Enquanto buscava, encontrou um CD até então desconhecido por ela, perguntando-me quem era o cantor, bem assim o motivo daquele CD integrar a coleção do carro. Percebi que ela se referia a um CD que eu tinha acabado de ganhar de um amigo-cantor, ou melhor escrevendo, daquele que eu recebi de presente do próprio cantor. Tratava-se do CD de Rodriguinho, um conhecido forrozeiro sergipano que honra Própria com o seu nascimento. Aproveitei a sua dúvida e imediatamente coloquei o CD de Rodriguinho para tocar, mesmo porque ainda não havia sido localizado aquele solicitado por minha filha. Foi um tiro certeiro, pois imediatamente o carro foi contagiado pela boa musicalidade do cantor propriaense, com os imperdíveis “Forró com o Pé de Serra”, “Cartão Postal”, “Conhecer Aracaju”, “O Rei do Gado” e “Gigante Adormecido”, dentre outros. Para alegria de todos e especialmente minha, o CD se tornou o mais tocado da viagem, conseguindo adquirir o título de único consenso entre os meus filhos. Estava ali um forró da mesma boa cepa de Clemilda, Sergival. Josa, Waltinho, Amorosa, Rogério, Sena, Erivaldo de Carira, Zé Rosendo e Marluci, Zé Américo, Jailson, Edgar, Virgínia Fontes e tantos outros sergipanos “porretas”. É este time, junto com a turma que se dedica ao moderno forró eletrônico, quem tem feito Sergipe ser conhecido como o verdadeiro “País do Forró”. Um país, é bom que se diga, com fantásticas cidades exportadoras de folia, animação e forró de primeira grandeza, a exemplo de Itaporanga, Rosário do Catete, Capela, Areia Branca e Socorro. E não se pode negar que o “País do Forró”, com a sua bela capital Aracaju, este ano esbanjou animação e organização, desde a gratificante surpresa que foi a Vila Chapéu de Couro, passando pelo cada vez mais contagiante Forró Caju. Se for verdade o que dizem, sendo Deus brasileiro e São João sergipano, com certeza a música tocada no céu não deve ser diferente daquela que tem tocado no Forró Caju. “Nosso País” é realmente especial, pois tem musicalidade impar, organização exemplar, cantores de primeira e várias cidades especialistas em animação. Mas neste mês de junho o “País do Forró” poderia ter algo mais diferenciado, poderia, por exemplo, agasalhar e pagar o salário-mínimo proposto pela oposição no Congresso Nacional do “País dos Demais Ritmos”. É que nada impede que o “Governante do País do Forró” decrete, em pleno festejos juninos, que em Sergipe o salário-mínimo é de R$ 275,00, mesmo porque a decisão federal não obriga o governo estadual. Garanto que se assim fizer, e torço para que o faça, o forró tocará mais justo, coerente e animado em todos os cantos e recantos do “País do Forró”, para alegria de São Pedro, que poderá também exigir o nosso cobiçado título de cidadania. * Cezar Britto é advogado, conselheiro Federal da OAB e presidente da Sociedade Semear. cezarbritto@infonet.com.br

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