Rede acolhe vítimas de violência

“É preciso ter um olhar diferenciado sobra a violência contra a mulher”

O que parece uma discussão simples entre um casal, aos olhos da maioria das pessoas, pode ser considerada uma violência doméstica. A classificação baseada na Lei Maria da Penha é clara e define como toda ação ou omissão que possa causar dor, sofrimento, ou dano a uma mulher.

“A Lei Maria da Penha traz uma classificação sobre essa violência, ela fala da violência moral que é aquela violência com palavras. É a violência que não atinge o corpo, nem o patrimônio da mulher, mas atinge a sua subjetividade. Podemos destacar, as palavras ríspidas, os xingamentos, as desqualificações, a propagação de fatos indecorosos na vizinhança”, relata a delegada coordenadora do DAGV, Daniela Ramos.

A delegada também salienta a violência psicológica como sendo uma agressão à moral da mulher. “As próprias ameaças que também são violência. Você vai ver; eu vou te bater; vou te matar; vou acabar com a sua raça. São ações que não atingem o corpo, mas atingem a subjetividade da mulher. Ainda podemos incluir a violência psicológica, que é uma violência pautada na coação, na tortura, não no físico, mas no emocional”, menciona.

Independência financeira

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), sobre a mulher no mercado de trabalho, mostra que em 2009, em média, eram 10,6 milhões de mulheres na força

“Muitas chegam de uma forma que não conseguem fazer o relato, porque estão psicologicamente abaladas”
de trabalho, sendo 9,6 milhões ocupadas. A constatação faz parte de uma triste estatística presente nas delegacias da mulher. “A gente observa que nos períodos em que as mulheres estão recebendo os seus salários os registros de violência aumentam. Cada vez mais existem lares são sustentados exclusivamente por mulheres, que recebem seus salários e dão ao seu companheiro, para que ele utilize a seu bel prazer. Elas também são vítimas de violência”, observa.

Privação do corpo

A delegada lembra que a mulher vítima de violência sexual não consegue planejar a quantidade de filhos ou até mesmo se deseja tê-los. “Muitas mulheres são privadas de todo e qualquer direito a autodeterminação diante do seu corpo. São mulheres que não podem tomar qualquer método contraceptivo, porque o marido não permite. Essas mulheres acabam não tendo controle da dimensão das suas famílias, porque elas sequer podem fazer um planejamento familiar. Então são mulheres que praticam relações sexuais não consentidas, e as fazem pelo domínio da força e da ameaça dos companheiros”, lamenta.

A importância da queixa

A delegada destaca que, ao procurar o auxílio de uma delegacia especializada, a vítima encontra um olhar diferenciado de profissionais comprometidos com a questão. “Muitas vezes a mulher procura qualquer outra instância, que não a delegacia. É importante buscar qualquer tipo de auxilio, mas penso que a Delegacia da Mulher, que existe neste País desde a década de 80, tem a credibilidade. Essa vítima precisa ter um atendimento diferenciado e a delegacia tem que estar preparada para fazer o seu papel de investigação, de coleta de provas, mas, sobretudo, de acolher essa vítima para que ela própria perceba que ela é um ser humano capaz de se autodeterminar diante das situações da sua vida”, defende.

Acolhimento à vítima

Domingo aumenta em 20% o número de casos de violência contra a mulher
Daniela Ramos ressalta que, quando a mulher chega e relata uma violência, primeiro é verificado se existe uma situação de flagrante, onde o autor pode ser preso no momento da queixa. Após esse procedimento, que inclui coleta de provas e depoimentos, é verificada a necessidade da vítima. Além do encaminhamento para um atendimento médico de urgência, o DAGV também conta com psicólogos que podem auxiliar durante o depoimento.

“Muitas vezes as mulheres chegam de uma forma que não conseguem fazer o relato, porque estão psicologicamente abaladas e não conseguem organizar as idéias. Nesse primeiro momento, além das providencias policiais, o grande diferencial do acolhimento é que pensamos como destinatário a vítima, afinal de contas, é a pessoa que teve seus direitos violados”, afirma a delegada, que frisa a importância de pensar nos filhos da vítima e em programas de geração de renda, ou mesmo na necessidade de um abrigo, caso a mulher sofra risco de morte.

“Na delegacia da mulher existe um olhar diferenciado para a violência”
Rede de atendimento

A importância da rede de assistência é ressaltada pela delegada que frisa o funcionamento dos Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e dos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), como uma ferramenta para acolher a família da mulher agredida. Ainda sobre a política de assistência, Daniela Ramos, reconhece que programas de geração de renda, ainda são uma falha no país.

“Essa é a grande dificuldade que vejo, não somente em Sergipe, mas no Brasil. Os programas de formação e de geração de renda dessas mulheres, na verdade, vejo como grande desafio, porque acho que esse ainda é o espaço da rede que precisa ser preenchido”, analisa.

De acordo com a delegada, existe uma grande parcela da população feminina que chega completamente sem instrumentos para se colocar no mercado de trabalho. “São mulheres que não tiveram uma profissão, que não têm escolaridade adequada para poder concorrer a uma vaga no mercado de trabalho. Penso que esses espaços na rede precisam ser ocupados, e como própria política de prevenção, porque não adianta só fazer Lei dura se não se trabalha na prevenção”, reconhece.

Exemplo de superação

Após 11 anos trabalhando como delegada, Daniela Ramos menciona um exemplo de mulher que conseguiu dar a volta por cima e restabelecer a auto-estima, mesmo diante de anos de agressão. A vítima citada pela delegada, não será identificada, mas após sofrer tortura e mutilação, conseguiu não somente denunciar o agressor como também ocupar um espaço no mercado de trabalho. “O companheiro levou o filho, afastou, então, toda sorte de sofrimento emocional essa moça sofreu. E essa violência aconteceu após anos de tortura, de violência sexual, de relações sexuais não consentidas, e essa mulher tinha de tudo para desistir da vida. Hoje essa moça está em vias de se formar, mesmo após essa violência, ela prestou vestibular, vai ser uma profissional no mercado de trabalho”, cita.

Na capital sergipana, o Departamento de Grupos Vulneráveis da Polícia Civil (DAGV) fica localizado na rua Itabaiana, 258, Centro. Para mais informações ou fazer denúncias, o número disponibilizado é (79) 3205-9400.

Por Kátia Susanna

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