“Violência contra as mulheres atinge toda a sociedade”

“Homem atira na cabeça da ex-mulher”, “Alunas da PM são constrangidas por oficial”, “Mulher abandona filho fruto de um estupro”, “Namorado mata namorada e pratica suicídio em seguida”… Os exemplos de agressões contra as mulheres que chegam à imprensa são variados e chocam homens e principalmente mulheres, que se sentem vítimas indiretas dessa violência. Afinal, qualquer uma está vulnerável a sofrer esse tipo de agressão. Não existe um perfil dessa vítimas, “seria estigma traçar um perfil dessas mulheres, nós preferimos não rotulá-las”, explica Ivânia Pereira, presidente da União Brasileira das Mulheres (UBM) e Conselho Municipal dos Direitos Humanos das Mulheres. Este sábado, 25 de novembro, é lembrado como o Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres, e até a próxima sexta-feira será realizada uma extensa programação para conscientizar e mobilizar a população para que denuncie esses casos, entre outras coisas. Em entrevista ao Portal Infonet, Ivânia fala desta semana de ativismo, sobre violência contra a mulher e o que pode ser feito para combater esse fato que atinge diversas delas, independente das condições socias, econômicas e culturais.

 

 

Portal Infonet – Qual o principal objetivo dessa campanha dos 16 dias de ativismo?

 

Ivânia Pereira – Alertar a sociedade para que ela tome consciência que a violência contra a mulher é um problema social e não particular do homem e da mulher. Essa privatização do problema como sendo de marido e mulher tem contribuído para disseminar essa violência e recrudescer ainda mais os atos praticados contra ela. A partir do momento que a violência domestica sai de dentro das quatro paredes e toma uma feição social, pública, toda sociedade toma parte desse problema e começa e passa a denunciar. Os cidadãos homens e mulheres devem se sensibilizar para denunciar qualquer ato de violência isso é o mínimo de garantia dos direitos humanos das mulheres. Nós queremos com essa campanha resgatar a cidadania e os direitos humanos das mulheres através.

 

Infonet – Como é que as pessoas vão desenvolver esse sentimento de denunciar aquilo que acontece no vizinho? Como combater esse hábito de não querer se envolver na vida alheia?

 

IP – Tem um ditado popular que diz que ‘Em briga de marido e mulher não se mete a colher’. Nós até dizemos que ele é responsável pela perpetuação da violência. No ano passado a UBM lançou uma campanha com o tema ‘Em briga de Marido e Mulher Queremos Meter a Colher’ e essa campanha tem tudo para dar certo. Ninguém precisa se identificar para fazer a denúncia, basta telefonar e buscar ajuda. Com isso você está distribuindo cidadania. Porque quando uma mulher sofre violência as outras também se sentem vítimas. Os filhos dos casais que vivem em situação de violência reproduzem isso com os amigos, na escola. É uma responsabilidade de toda a comunidade combater a violência. É preciso que a sociedade tome consciência disso.

 

Infonet – Quais os tipo de agressões? E como identificar?

 

IP – A violência mais facilmente identificada e denunciada é sem dúvida a física. Mas a psicológica é geralmente decorrente da física. Porque a mulher foi agredida por alguém que ela achou que ia ser seu protetor, o seu amor, que ia ser uma pessoa que ela achou que ia partilhar a vida dela. Isso tem uma carga psicológica e emocional muito forte. Além de traumatizar e criar problemas de saúde mental profundos. As marcas da violência psicológica demoram muito a ser cicratizadas.

E ainda, além da violência física e psicológica que sofre em casa, as mulheres quando vão procurar ajuda nas órgão públicos muitas vezes perguntam, o que foi que você fez? Quem for atendida dessa forma deve procurar o conselho municipal dos direitos da mulher ou a UBM, denunciar esse fato com pelo menos uma testemunha, e nós vamos entrar com processo de danos morais. Ou a gente faz isso ou nós não vamos impor que a lei proteja a mulher enquanto cidadã.

 

 

Infonet – Antes da lei Maria da Penha o que acontecia com o agressor?

 

IP – O agressor, às vezes, era chamado a atenção, pagava uma cesta básica, prestava algum serviço público. Mas na maioria das vezes não acontecei absolutamente nada. Alguns se separavam, a maioria retornava, e aquela mulher era candidata a visitar a delegacia porque ela sofria violência e o agressor não teve o tratamento devido e certamente irá continuar reproduzindo a agressão. Isso porque as políticas públicas não foram eficazes. Eu acredito que a Lei Maria da Penha se propõe a ser essa política pública eficaz. E a mulher que se sinta agredida pela lei não ter sido aplicada ela deve procurar seus direitos através do conselho, o ministério público, ou uma organização de mulheres para fazer valer seu direito.

 

Infonet – Agressões contra mulheres nas classes mais altas não é muito divulgado. Aí a gente fica se perguntando será que só existe violência com os mais pobres.

 

IP – Geralmente porque elas têm um condição econômica melhor elas fogem, vão para outros Estados, ficam em hotel, em casas de conhecidos. Ou ainda, chegam a cometer suicido. É alto o índice de mulheres de classe média e alta que cometem suicídio e que na vida dela tinha histórico de violência doméstica. Quando a gente diz que a violência doméstica acontece entre quatro paredes é exatamente nessas classes. Porque na mulher da periferia  classe baixa a violência acontece na sala, no meio da rua, em qualquer lugar. A que acontece entre as quatro paredes é só nas mulheres da classe alta e média para se esconder para manter as aparências.

 

Infonet – Quais os resultados do trabalho que é desenvolvido pela UBM e pelo Conselho?

 

IP – O que percebemos é que o índice de mulheres que tem denunciado e buscado ajuda vem crescendo. E eu não tenho dúvidas nenhuma que isso está acontecendo pela divulgação das leis das políticas públicas que podem apoiar essas mulheres. É preciso melhorar os meios de divulgação desses mecanismos de apoio e prevenção e combate à violência doméstica com uma campanha de mídia forte para que toda mulher tome conhecimento disso. É preciso também nós dotarmos todos os municípios de Sergipe e todas as delegacias de pessoas especializadas para atender esses casos. Porque a violência não acontece só em Aracaju, ou Estância, ou Itabaiana, elas está presente em todos os municípios, todos os bairros e em todas as casas. Então, na medida em que mais pessoas entram nessa campanha ela fica mais forte e enfraquece o agressor.

 

Infonet – Como é esse trabalho?

 

IP – Às vezes as mulheres vem aqui, ou telefonam, a gente vai verificar a denúncia. As delegacias, postos de saúde, centros de referência, programas sociais, ou através de programas de rádio também entram em contato também. Nós temos uma casa abrigo para onde a gente encaminha aqueles que correm risco de vida. Essa casa é gerenciada pela UBM e lá a mulher pode ficar com todos os seus filhos menores de 17 anos, durante no máximo de três meses, até que se resolve o problema. Lá a mulher tem um acompanhamento psicológico, social, médico, participa de eventos e oficinas para refletir sobre a situação de violência. Existem também encontros com os agressores que são feitos na delegacia ou no fórum. Muitos vezes eles se arrependem, se comprometem em não agredir mais, declaram eterno amor, ela torna a acreditar. Ás vezes acontece deles superarem, mas na maioria dos casos elas retornam ao serviço pelos mesmos problemas.  A equipe da casa não pode julgar. Ela é que tem que definir o rumo dela.

 

 

Infonet – Quais as conseqüência que essas mulheres agredidas irão carregar?

 

IP – O que nós percebemos é que essas mulheres que sofrem violência se tornam vulneráveis, elas não tem domínio sobre sua sexualidade, tem um grande número de filhos. Elas não podem usar nenhum método contraceptivo, porque a relação é de domínio privado dele. Isso é tipo d e agressão á vida das mulheres, elas não são donas da sua sexualidade, elas não podem ter prazer. Eu acho que a gente superando a violência vamos ter uma vida mais prazerosa.

 

Infonet – Em pleno o séc. XXI e com todas essa campanhas contra a violência praticada contra as mulheres, ainda existem homens que quando vêm casos como o que aconteceu essa semana, em que um homem atirou na ex-mulher em público, dizem que ele estava certo?

 

IP – Com certeza. E não só homens, mulheres também. Eles perguntam: e quem sabe o que foi que ela fez? Nós percebemos que não vai ser fácil superar esse problema, porque a violência contra a mulher é secular. O julgamento também faz parte da opressão. Essa coisa de julgar as pessoas, por exemplo julgar a mulher que abandonou o bebê no mato. Você sempre julga só a mulher, prende ela, massacra na imprensa, destrói essa mulher. Mas ela fez essa criança sozinha? Onde está o homem que humilhou e obrigou aquela mulher a ficar naquela situação?  

 

* Ivânia Pereira é bancária, formada em assistência social e se dedica hoje a combater agressões às mulheres e garantir os direitos delas. Ela é presidente das duas principais organizações que visam proteger e lutar contra a opressão cometida todos os dias contra os sexo feminino, a União Brasileira das Mulheres (UBM) e Conselho Municipal dos Direitos Humanos das Mulheres.

 

Para denunciar a violência praticada contra a mulher basta ligar para:

– Conselho Municipal de Direitos Humanos das Mulheres – 3179-1355

– União Brasileira das Mulheres – 3044-0040

– Delegacia da Mulher – 3213-1239  

 

Por Carla Sousa

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