“Aqui nesta barraca ninguém tem prejuízo, porque ler não é prejuízo. Ler é cultura”. É assim que João Firmino Cabral chama as pessoas para conhecerem o que há de melhor em literatura de cordel. E quem por ali chega, encontra um vendedor diferente. Ele recita versos e conta histórias, com a sabedoria de um ancião e a alegria de uma criança. Além de fazer da venda dos “folhetos de feira” o seu meio de vida, há 46 anos ele faz do cordel a sua arte. Bastante premiado no país, o cordelista já recebeu prêmios inclusive das mãos do ilustre pernambucano Ariano Suassuna. Para o cordel de João Firmino não há fronteiras. Suas obras podem ser encontradas fora do país, circulando inclusive no meio acadêmico. A Universidade de Nova Lisboa, em Portugal, e a Biblioteca Universitária de Versailles, na França, exibem obras desse cordelista itabaianense tido como um dos melhores do Brasil em seu estilo literário. Sem nunca ter freqüentado uma escola, ele começou a fazer cordel aos 17 anos de idade, espelhando-se em Manoel D´Almeida Filho, seu grande mestre. Em 1957, na cidade de Alagoinhas, João Firmino lançou seu primeiro trabalho. Um folheto com oito páginas, intitulado As bravuras de Miguel, o valente sem igual. “Este meu livro foi cheio de falhas, assim como todo primeiro trabalho”, afirma ele. Seu mestre, Manoel D´Almeida, gostou muito da obra, apesar de apontar-lhe alguns defeitos, inclusive de métrica. Mesmo assim, o cordelista não desanimou e continuou a escrever. A última carta do padre Cícero Romão, seu segundo trabalho, tornou-se um grande sucesso por suas várias edições. A este livro, seu mestre deu nota dez, e afirmou que João seria seu sucessor. “Nunca pensei em ser sucessor de alguém. Cada um tem seu jeito, seu trabalho”, declara ele. O autor se queixa da falta de interesse pela literatura, em especial pela literatura de cordel. E culpa os meios de comunicação por isso. “Hoje o cordel não tem mais a afluência que já teve em sua época áurea. O povo tinha muito desejo de ler o livro. O livro era a diversão, a novela da época. Mas antes não existia a TV, e mesmo o rádio ainda tinha pouca expressão”, contesta João Firmino. Para ele, até mesmo os estudantes lêem forçosamente. Se lerem, não o fazem porque gostam, e sim em troca de algum benefício concedido pelo professor. “Hoje ninguém tem tempo para ler. A TV toma o tempo das pessoas”, diz ele. Casado há 37 anos com dona Carmelita Cabral, ele tem sete filhos e cinco netos que, apesar de gostarem muito de ler, não quiseram seguir os passos do pai. “Não basta querer ser cordelista. Esse dom não se compra, se recebe de Deus”, explica João. Referência para os que passam pelo Mercado Albano Franco, seu João Firmino ocupa hoje um espaço cedido pela Funcaju juntamente com a Emsurb. Sua banca faz sucesso com os turistas, que param para comprar e acabam desfrutando da sabedoria do maior cordelista do Estado. Apesar de amar sua terra, João afirma que o valor atribuído ao cordel, em Sergipe, é muito menor que o merecido. “Hoje quem mantêm minha banca são os turistas, não são os sergipanos”, declara. João Firmino afirma que só quem tem conhecimento sabe dar valor ao cordel. Hoje ele serve de modelo para muitos cordelistas sergipanos, a exemplo de Zé Antônio e Gilmar Santana, que na revisão poética de suas obras, sempre recorre ao mestre. Indagado sobre sua relevância no Estado, ele demonstra uma humildade sem igual. “Não sou maior nem melhor do que ninguém. Sou apenas aquilo que Deus quis que eu fosse”, afirma. Ele orienta os mais jovens quanto a essa humildade que, segundo ele, deve ser sempre conservada. Sobre isso, ele gosta de lembrar um versinho que, quando criança, ouvia de sua avó. “Quem aos altos quer subir e as nuvens quer pegar, as estrelas vão sorrir da queda que vai levar”. Foi a humildade e a sabedoria que fizeram de João Firmino um dos cordelistas mais respeitados do Brasil. Aos 63 anos, ele permanece de segunda a sábado, das 08h30 às 16h30 em sua banca. Lá ele vende o que há de melhor em literatura de cordel, expondo sua obra e conservando uma parcela valiosa da nossa cultura. Com 50 trabalhos publicados, o cordelista, que vê no cordel a razão de sua vida, é um nome a ser imortalizado na história sergipana. por Najara Lima
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