João Muniz Barreto /100 Anos

As sociedades, com suas exigências, tem dado preferência a exaltar e a louvar os letrados, os ricos, os saudáveis, os bonitos, em oposição vantajosa aos iletrados, aos pobres, aos doentes ou deficientes, aos feios, num verdadeiro catálogo de hegemonias, dominantes, a desfilar como um controle rígido que glorifica uns e deixa ao largo todos os demais, reconhecidos nos pequenos círculos, ou apenas na família. No entanto, são muitos os exemplos de gente simples, trabalhadora, anônima, que superando as limitações constroem patrimônios, materiais e imateriais, a partir da força intuitiva que os anima.

Em Sergipe são notórios os casos de Oviêdo Teixeira, dos Irmãos Paes Mendonça Euclides, Mamede e Pedro, de Gentil e de Noel Barbosa, de Sabino Ribeiro, e de muitos outros vencedores na vida econômica do Estado, como personagens que ganharam o porte incontestável dos vitoriosos, enchendo de orgulho os seus, os próximos e as gerações que os substituíram. Pessoas simples, sem escolaridade, agindo a partir de experiência própria, um certo sentido prático a guiar as suas conquistas, em vários campos, fora do sucesso econômico e da construção da riqueza.

João Muniz Barreto é um desses exemplos. Nascido no povoado Volta, no município de Nossa Senhora das Dores, em 10 de maio de 1907, completaria hoje 100 anos. Filho de Manoel Silvino Barreto, da família Muniz Barreto – Estácio, Egas, e outros proprietários rurais e de Flora Amélia Barreto, da família do coronal da Guarda Nacional Jorge Palantem de Santana –, ficou órfão aos 15 anos. A morte do seu pai, assassinado na zona canavieira da Cotinguiba, onde com seus carros de bois transportava cana de açúcar para as usinas, fez dispersar a família e atribuiu responsabilidades aos sobreviventes, que saíram de Nossa Senhora das Dores, abandonaram a pequena propriedade, e buscaram a sobrevivência na zona sul do Estado: Boquim, Riachão do Dantas e Itaporanga. A parentada espalhou-se e fincou raízes em vários municípios: Mário Barreto e seu irmão Joãozinho, em Riachão, Glorinha, Nair, casadas, Áurea, solteira, fixaram morada em Boquim, os irmãos Jason e Chico Barreto ficaram em Itaporanga. José Muniz Barreto foi para Capela, onde casou-se, João Muniz Barreto viveu muitos anos entre Boquim, Riachão, Lagarto, casando-se, aos 30 anos, naquela cidade, com Josefa Alves Barreto, da família dos Vieira do Nascimento.

João Muniz Barreto foi soldado de Polícia, mata –mosquito, contratado para combater a febre amarela, biscateiro, feirante, ambulante, comerciante, até ingressar no serviço público estadual, como Guarda, diarista, em Tobias Barreto, onde fixara residência, de 1953 a 1956, depois de um exílio político em Olindina, no Estado da Bahia. Udenista e leandrista, João Barreto foi preso e mandado embora de Lagarto, na campanha eleitoral de 1946/47, quando José Rollemberg Leite, da coligação PSD/PR, derrotou a Luiz Garcia. Nomeado por Leandro Maciel, de Tobias Barreto foi transferido para Pedrinhas, depois para o Posto Fiscal Osvaldo Nabuco, nas proximidades de Aracaju e de Nossa Senhora do Socorro, depois para Maroim, Santo Amaro das Brotas, Siriri, Riachuelo, Malhador, até que, no Governo Celso de Carvalho voltou para Aracaju, aposentando-se como Chefe da Fiscalização dos Mercados Antonio Franco e Thales Ferraz. João Muniz Barreto morreu, aos 76 anos, em 10 de novembro de 1983, deixando viúva e três filhos: José Artemio Barreto, magistrado, Presidente, atual, do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, Luiz Antonio Barreto, jornalista e escritor, e Luiz Augusto Barreto, advogado do Setor Jurídico da PETROBRÁS, nascido em Olindina (BA) em 19 de outubro de 1947 e falecido em 23 de agosto de 1999.

Homem simples, de muitos amigos e de trânsito livre entre as pessoas do povo, João Muniz Barreto guardava na memória textos inteiros de folhetos de cordel, cantigas, estórias, anedotas, como um portador privilegiado da cultura popular, guardando, também, alguns livros importantes que circularam em Sergipe, como O Corão, o Manual de Chernoviz, dentre outros. Religioso ao seu modo, portava um Bentinho, orações, como faziam a população subalterna, crédula, devota.

Excelente conversador, tinha uma boa letra, apesar do pouco estudo, guardou álbuns de poemas e pensamentos, organizados com jovens moças de Boquim, na década de 1930. Seus esforços, no sentido de encaminhar seus filhos para os estudos, mesmo quando as condições eram adversas, também destacam sua personalidade. Seu exemplo, enfim, dará ensejo a que no correr deste ano do seu centenário de nascimento, seu nome seja posto no pórtico de um Centro de Cultura, a ser instalado na Av. Ivo do Prado, 160, que ponha Sergipe em evidência, e que possa servir aos jovens sergipanos, estudantes e aos pesquisadores, na acumulação do conhecimento.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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