Quais os direitos do candidato aprovado em concurso?

Quais os direitos do candidato aprovado em concurso público? É possível a realização de concurso público apenas para cadastro reserva? A Administração Pública está obrigada a convocar o candidato aprovado em concurso? A Administração Pública pode contratar temporariamente quando já existem candidatos aprovados em concurso público?

Essas e outras perguntas constituem dúvidas frequentes daqueles que se submetem a um concurso público, seja porque tais questionamentos são cobrados em provas de concursos, seja porque alguma situação concreta já pode ter acontecido com algum leitor concurseiro.

Na coluna de hoje, abordaremos, de forma sistematizada, os aspectos mais importantes de todas essas indagações, à luz do entendimento atualizado da jurisprudência (decisões reiteradas de um determinado Tribunal), a fim de auxiliar no estudo e, de certa forma, oferecer informações para a segurança das pessoas que se submetem a concursos públicos.

O instituto do concurso público, como forma de seleção utilizada pela Administração Pública para a ocupação de cargos ou empregos públicos, tem previsão no art. 37, inc. II, da Constituição Federal, que possui a seguinte redação: “a investidura em cargo ou emprego público depende da aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo público de provimento em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.

Da leitura do dispositivo constitucional acima transcrito, verifica-se que o provimento de alguns cargos públicos, especialmente os cargos públicos de provimento efetivo (e alguns cargos públicos de provimento vitalício) se dá por meio de concurso público, ressalvando-se, como se verifica no texto constitucional, os cargos públicos de provimento em comissão, previstos no art. 37, inc. V, da Constituição Federal, para o exercício de atribuições de direção, chefia e assessoramento, cuja investidura é de livre nomeação, obedecidos, de qualquer forma, os requisitos previstos em lei.

Não obstante a disciplina necessária e o desgaste daqueles que se submetem a uma rotina de estudos para encarar uma maratona de provas, muitas vezes com a redução do convívio familiar e social, a aprovação não enseja um DIREITO SUBJETIVO do candidato considerado apto no concurso público. Quer dizer: mesmo que o candidato seja aprovado no concurso público, a Administração Pública não está obrigada a nomeá-lo e empossá-lo. Possui, portanto, em sentido contrário, MERA EXPECTATIVA DE DIREITO. Cabe, aqui, um esclarecimento: muitas pessoas pensam, de forma equivocada, que um candidato aprovado em concurso público é, necessariamente, aquele classificado dentro do número de vagas previstas no edital. Ao contrário, candidato aprovado em concurso público é aquele que atingiu os requisitos mínimos previstos no edital.

Um exemplo ajuda a esclarecer o que foi dito até o momento. Imaginemos que o Concurso Público X seja destinado ao provimento de 10 vagas em determinado órgão público federal. O edital, no entanto, estabelece que será considerado aprovado no concurso o candidato que atingir uma pontuação mínima geral de 70 pontos, sendo que não pode obter pontuação inferior a 05 em cada uma dos grupos de disciplinas objeto do conteúdo programático.  O candidato que atingir esses limites mínimos será considerado aprovado no concurso, embora possa não estar dentro do número de vagas. É possível, por exemplo, que sejam aprovados 100 candidatos, sendo que apenas os 10 primeiros (já que são, apenas, 10 vagas) serão considerados aprovados dentro do número de vagas.

Esse esclarecimento é muito importante, por duas razões: 1) a situação pode definir se o candidato tem mera expectativa de direito ou direito subjetivo à nomeação e posse no cargo público, como veremos a seguir; 2) muitos concursos públicos consideram como título a aprovação prévia em concursos públicos. Por isso, mesmo que a sua colocação seja, digamos, um pouco distante, fundamental que você tire uma fotocópia autenticada do Diário Oficial (ou instrumento equivalente), que divulgou o resultado final do concurso público.

Voltemos. Como regra, portanto, o candidato aprovado em concurso público tem mera expectativa de direito à nomeação e posse e não direito subjetivo, o que quer dizer que a Administração Pública não está obrigada a convocá-lo para fazer parte dos seus quadros funcionais.

Mas há uma esperança no fim do túnel… Eu disse COMO REGRA! Significa dizer que, em algumas hipóteses, a Administração Pública está obrigada a nomear, empossar e dar exercício ao candidato aprovado em um concurso público. Nessas circunstâncias, o candidato não tem apenas mera expectativa de direito, mas, ao contrário, DIREITO SUBJETIVO, de modo que a Administração Pública pode ser compelida a proceder à nomeação e posse do candidato aprovado, desde que verificadas as situações em tela. As situações são as seguintes:

Situação 01 – Aprovação dentro do número de vagas:

Se o candidato for aprovado em concurso público dentro do número de vagas previsto no edital, não há faculdade para a Administração Pública proceder ou não à nomeação e posse, a partir de critérios de conveniência e oportunidade, como acontecia há algum tempo atrás.

Hoje, tanto o Superior Tribunal de Justiça (AgRg 57493), como o Supremo Tribunal Federal (RE 598.099), entendem que a nomeação do concursando aprovado dentro do quantitativo de vagas previsto no edital constitui um dever do poder público, somente podendo escolher o momento no qual o ato de provimento originário (nomeação) será realizado, tendo em vista o prazo de validade do concurso público.

O prazo de validade de um concurso público está previsto no edital regulador do concurso e deve obedecer o limite temporal previsto no art. 37, inc. III, da Constituição Federal: “o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período”. Dentro do prazo de validade, a Administração estará obrigada a nomear o candidato que se encontra nessa situação.

De acordo com o STF, no julgado acima referido, “esse entendimento, na medida em que atesta a existência de um direito subjetivo à nomeação, reconhece e preserva da melhor forma a força normativa do princípio do concurso público, que vincula diretamente a Administração. É preciso reconhecer que a efetividade da exigência constitucional do concurso público, como uma incomensurável conquista da cidadania no Brasil (…)”.

Nesse caso, deve o candidato se resguardar, ajuizando, se for o caso, o mandado de segurança para fazer valer o seu direito, pois, como pode ser provado de plano, por meio de documentação inequívoca, consubstancia-se em direito líquido e certo, passível de ser tutelado por esse remédio constitucional.

Vale ressaltar que, mesmo diante da aprovação dentro do número de vagas, situações excepcionalíssimas, a exemplo de uma calamidade pública na entidade federativa responsável pelo concurso, podem afastar a obrigatoriedade de a Administração proceder à nomeação do referido candidato. Para tanto, o ato deve ser motivado pelo administrador público, com a exposição das circunstâncias de fato e de direito que constituem fundamento para a prática do ato (que devem corresponder à realidade fática), sendo necessária a conjugação dos seguintes fatores: superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade.

Situação 02 – Desobediência da ordem classificatória:

Mesmo que seja realizado um concurso público apenas para cadastro de reserva, sem previsão, portanto, de quantitativo de vagas no edital, o candidato que, inicialmente, tinha mera expectativa de direito à nomeação e à posse, passa a ter direito subjetivo quando a Administração desobedece a ordem classificatória do concurso público, de acordo com a pontuação obtida por cada candidato.

Citemos um exemplo: no Concurso Público W, apenas para cadastro de reserva (sem, portanto, um quantitativo de vagas previsto no edital), Agamenon é o primeiro colocado, Asclepíades é o segundo colocado e Esculápio é o terceiro colocado. Os três possuem, inicialmente, mera expectativa de direito à nomeação, posse e exercício já que, como dito, não há vagas previstas no edital que pudesse ensejar o enquadramento na Situação 01. Imaginemos, no entanto, que, no momento de proceder à nomeação, a Administração Pública, ao invés de nomear Agamenon, nomeia Asclepíades, que, por coincidência do destino, é filho do prefeito do Município no qual o concurso é realizado (coincidência?). Neste caso, o ato administrativo de posse de Asclepíades é inválido, pois não possui uma compatibilidade com a ordem jurídica, devendo ser, obrigatoriamente anulado. Surge para Agamenon direito subjetivo à nomeação, posse e exercício, impondo-se que a Administração Pública pratique os atos de provimento e investidura.

Não obstante a conclusão lógica, a Súmula nº 15 do STF reforça a conclusão, com o seguintes teor: “dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito a nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação.”

Ora, nada mais coerente do que esse entendimento sumulado da Suprema Corte. Mesmo nas hipóteses que, inicialmente, haveria mera expectativa de direito do concursando, seja porque o concurso público foi realizado para cadastro de reserva (sem previsão de vagas), seja porque o candidato foi classificado fora do número de vagas previsto no edital, tal situação será convertida em direito subjetivo se o candidato foi preterido no momento da nomeação.

Tal conclusão parece óbvia, mas, infelizmente, ainda muito comum, principalmente em pequenos Municípios, em que se esquece uma das pedras de toque do Direito Administrativo, qual seja, a indisponibilidade do interesse público pelo administrador público e, consequentemente, todos os demais princípios que lhe são correlatos, tais como legalidade, moralidade, impessoalidade, dentre outros.

Situação 03 – Contratação temporária para o exercício das mesmas atribuições para as quais há candidato aprovado em concurso público:

A contratação temporária tem fundamento no art. 37, inc. IX, da Constituição Federal, nos seguintes termos: “a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.” Percebe-se que tal medida é excepcional e deve ser devidamente fundamentada, de modo que, em hipótese alguma pode constituir substitutivo de concurso público em condições normais de temperatura e pressão… Por isso mesmo que a contratação é por tempo determinado, atrelada a uma situação fática específica e excepcional.

Ora, se a Administração Pública, mesmo com candidatos aprovados em concurso para o provimento de um determinado cargo efetivo para o desenvolvimento de uma atividade de natureza permanente, contrata temporariamente para realizar as mesmas atividades, é porque demonstra a necessidade no desenvolvimento das atribuições inerentes ao cargo público. Deve ser priorizado o candidato aprovado em concurso.

Vale ressaltar, no entanto, que o direito subjetivo só surge para os candidatos que correspondem ao número de contratos temporariamente sem fundamento constitucional. Exemplo: no Concurso Público Z, para cadastro de reserva destinado ao provimento do cargo de digitador, 100 candidatos foram aprovados. Diante da inexistência de vagas previstas no edital, todos os aprovados, como já sabemos, possuem, inicialmente, mera expectativa de direito à nomeação e posse. Ocorre que, durante o prazo de validade a Administração Pública, diante da necessidade de prestação do serviço, contrata, temporariamente, 20 digitadores. Conclusão: os vinte primeiros colocados no concurso público passam a ter direito subjetivo à nomeação e posse.

O mesmo raciocínio deve ser estendido para os outros vínculos precários com a Administração Pública (que não uma contratação temporária) e que também exercem atribuições próprias de cargos públicos de provimento efetivo, com candidatos já aprovados para o desenvolvimento dessas atividades.

Inúmeras decisões dos Tribunais Superiores chegam à mesma conclusão. A título ilustrativo, colaciona-se recente decisão do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema:

“ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. ABERTURA DE NOVO CONCURSO PARA CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME.
1. Trata-se, na origem, de mandado de segurança impetrado com o objetivo de obter nomeação e posse em razão de aprovação em concurso público fora do número de vagas previsto no edital.
2. Esta Corte vem entendendo que a mera expectativa se convola em direito líquido e certo a partir do momento em que, dentro do prazo de validade do concurso, há contratação de pessoal, de forma precária, para o preenchimento de vagas existentes, em flagrante preterição àqueles que, aprovados em certame ainda válido, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou função. Precedentes.
3. Em suas razões, o recorrente aponta que foi aprovado em 3º lugar para o cargo de Professor – Ensino Fundamental Regular – Educação Física – Município de Barra da Corda⁄MA (fls. 53), cujo edital nº 01⁄2009 previa uma vaga (fls. 38), ou seja, fora do número de vagas; no entanto, foi aberto novo certame para contratação temporária de Professores para atuarem no ensino fundamental regular e no ensino médio regular, no ano letivo de 2010 (Edital nº 003⁄2009 – SEDUC), sendo disponibilizadas 5 vagas para o cargo ora pleiteado (fls. 66). Nesse sentido, alega seu direito à nomeação.
4. Se, durante o prazo de validade do concurso público, são abertas novas vagas, preenchidas por contratação temporária, é obrigatória a nomeação dos candidatos aprovados.
5. Recurso ordinário em mandado de segurança provido. (RMS 36.553⁄MA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 02⁄08⁄2012, DJe 09⁄08⁄2012.”

Na coluna da próxima semana apresentaremos outras duas situações muito interessantes (e recentes!) no âmbito do Poder Judiciário que representam uma evolução da jurisprudência no que tange à proteção dos direitos dos candidatos aprovados em concursos públicos: desistência de candidatos convocados e criação de novas vagas dentro do prazo de validade do concurso público.

Além disso, outras questões muito recorrentes: é possível a realização de concurso público dentro do prazo de validade do concurso público anterior? Qual o momento correto para a apresentação dos títulos, com a demonstração de que os requisitos necessários para a ocupação do cargo estão preenchidos? É possível o pedido de final de fila?

Dicas e Notícias da Semana:

  • Nova data para o concurso da Polícia Civil do Estado da Bahia. Diante da republicação do edital, houve a abertura de prazo para novas inscrições: 20/03 a 31/03/2013. Nova data para a realização das provas: 28/04/2013. ATENÇÃO: essa é a data prevista para a prova da 1ª Fase da OAB.
  • O TRE/SE já instituiu comissão para a elaboração do edital para o seu concurso público. A previsão é que o edital seja publicado nos próximos meses.
  • O concurso do INSS já foi autorizado. De acordo com o Ministério do Planejamento, a previsão é que o edital seja publicado até o dia 1º de agosto de 2013. Serão oferecidas 500 vagas para o cargo de Analista (nível superior).
  • Outro edital que será publicado em breve é o do concurso de Auditor Fiscal do Trabalho. Foram autorizadas 100 vagas. Previsão de publicação até 13 de agosto de 2013 (até seis meses após a públicação da portaria do Ministério do Planejamento, que ocorreu em 13 de fevereiro de 2013). O ideal é iniciar a preparação para esse concurso público o quanto antes, pois, tendo em vista o edital anterior, o conteúdo programático é extenso.

*Tiago Bockie é Procurador do Estado, Professor de Direito Administrativo, Mestre em Direito Público pela UFBA e Coordenador da Área Jurídica e de Concursos da CICLO – Renovando Conhecimento.

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