Amiloidose: generalidades e curiosidades

“Quando vocês discutirem, não deixem que seus corações se afastem, não digam palavras que os distanciem mais, pois chegará um dia em que a distância será tanta que não mais encontrarão o caminho de volta”  ( Mahatma Gandhi ).

amiloidose compreende um grupo heterogêneo de doenças que possuem em comum o depósito extracelular de uma substância proteica dita amiloide, observamos de que todas as formas de amiloide apresentam a presença de birrefringência verde que torna-se peculiar à microscopia após a coloração pelo vermelho-Congo, e essa observação no material de biópsia continua sendo o padrão-ouro para se estabelecer o diagnóstico de amiloidose.

As doenças por amiloide são classificadas de acordo com a composição bioquímica das proteínas precursoras séricas que formam as fibrilas de amiloide e depósitos, no entanto apesar destes avanços, sua história natural é ainda pouco conhecida e o seu diagnóstico, na maioria das vezes, realizado tardiamente, quando a doença já se encontra num estágio mais avançado.

As doenças amiloides são classificadas de acordo com o padrão e a extensão do depósito, podendo serem divididas em adquiridas ou hereditárias, ou ainda em sistêmicas ou localizadas de acordo com a extensão do depósito.

As formas mais frequentes de amiloidose são as adquiridas, onde encontramos as formas AL (imunoglobulinas de cadeia leve ou primária), as AA (reativa ou secundária) e as A-beta-2M (beta-2-microglobulina ou associada à diálise). A amiloidose do tipo AL é rara, com incidência estimada de 4,5 por 100.000 indivíduos, já o tipo secundário (tipo AA) está principalmente associada a infecções e inflamações crônicas, correspondendo a 8 a 18% dos casos da doença; convém frisar de que algumas patologias clinicas como tuberculose e hanseníase podem ter uma incidência superior a 50%.

Felizmente as formas hereditárias são mais raras e variam de acordo com a região geográfica, acometendo 1 em 100.000 indivíduos. Geralmente, o modo de transmissão é autossômico dominante, com a exceção da febre familiar do Mediterrâneo, que apresenta o padrão autossômico recessivo.

Quadro Clinico:

As apresentações clínicas variam de acordo com os tipos de fibrilas amiloides presentes.

A amiloidose primária sistêmica (tipo AL) é uma discrasia de célula plasmática com envolvimento multissistêmico, progressão rápida e sobrevida curta;Nesse caso as fibrilas de amiloide são compostas de cadeia leve monoclonal, sendo a uqe é mais encontrada é a lambda, numa proporção de 2:1 em relação à kappa,frequentemente ocorrem em pacientes com mais de 40 anos de idade, é mais frequente em homens (65%) e os sintomas e sinais são frequentemente inespecíficos, tais como fraqueza, fadiga e perda de peso.

As principais repercussões clínicas e que geralmente chamam a atenção para diagnóstico, podem atingir os rins, pulmões e coração e são infelizmente só são descobertos tardiamente, por isso apresentam têm uma evolução mais grave. Observa-se de que essa gravidade está em geral relacionada ao aumento dos órgãos, secundários ao depósito de amiloide. Nos rins, a proteinúria ( perda de proteína pela urina ), por vezes nefrótica, é encontrada em 1/3 dos pacientes e frequentemente pode levar à insuficiência renal. Em aproximadamente 1/4 dos casos identifica-se insuficiência cardíaca congestiva, miocardiopatia restritiva, baixa voltagem ao eletrocardiograma e hipersensibilidade digitálica, responsáveis por 50% dos óbitos nesta forma de amiloidose. O depósito pulmonar ocorre em aproximadamente 90% dos casos e determina quadro de dispneia ( falta de ar ) progressiva. O comprometimento do fígado normalmente não leva à perda de sua função, apesar de ocasionar aumento de seu tamanho. Alterações gastrintestinais como má absorção, diarreia e obstrução também podem ser encontradas.

Um sinal fácil de observação e que apresenta um importante valor da péssima evolução da doença é a presença de macroglossia ( aumento do tamanho da língua ), observada em até 20% dos casos, e também frente a sangramentos decorrentes da presença de uma deficiência do fator Convém salientar de que o acometimento cutâneo caracterizado por púrpura, pápulas ou tumores pode ser encontrado em mais de 40% dos casos, além disso podemos encontrar 10 a 15% dos pacientes apresentando neuropatia periférica e hipotensão ortostática.

Os achados reumatológicos mais significantes são o aparecimento de síndrome do túnel do carpo ( lesão neuropática no punho ), observado em mais de 20% dos casos, e o sinal de “ shoulder pad “, que corresponde ao depósito de amiloide nos ombros, graças a Deus a artropatia ocorre em menos de 5% dos casos predominando sempre nas grandes articulações.

O diagnóstico se faz com a presença de um dos sintomas descritos, associado à proteína monoclonal sérica ou urinária ,além disso a presença de proteína monoclonal no soro ou urina é observada em 90% dos casos.

A amiloidose associada ao mieloma múltiplo (tipo AL) também apresenta fibrilas compostas de cadeia leve monoclonal, assim como a amiloidose primária. Porém, nesta forma, existe um predomínio da cadeia leve kappa em relação à cadeia lambda, numa relação de 2:1, além do que observamos de que a presença de lesões osteolíticas encontradas no mieloma são de grande auxílio no seu diferencial, visto que as manifestações clínicas são semelhantes àquelas encontradas na forma primária.

A amiloidose secundária ou reativa ou adquirida (tipo AA) é uma complicação pouco comum de estados inflamatórios crônicos, infecções e, de forma mais rara, a determinados tipos de neoplasias. A forma que é reativa a processos inflamatórios crônicos tem sido relacionada principalmente às doenças reumatológicas, particularmente a artrite reumatoide (do adulto e juvenil), espondilite anquilosante, síndrome de Reiter e artrite psoriática;curiosamente é observado de que apesar disso,trata-se de uma patologia clínica muito rara nas doenças do tecido conjuntivo, principalmente no lúpus eritematoso sistêmico, no entanto na doença de Chron ( doença disabsorvita intestinal ) a doença pode ocorrer em até 8% dos pacientes contrastando de forma bastante significativa com raridade de seu aparecimento na retocolite ulcerativa….

A suspeita de amiloidose nestas patologias fundamenta-se basicamente na presença de proteinúria, má absorção intestinal ou envolvimento gastrintestinal como náusea, diarreia e aumento do figado e/ou do baço. O depósito amiloide é o da proteína AA que é distinto das cadeias leves de imunoglobulinas, e os pacientes raramente têm acometimento cardíaco e de nervo periférico,convém referir de que o aumento da língua  ( macroglossia )não é uma característica da amiloidose AA; Importante informar de que o tratamento desta forma secundária de amiloidose consiste no controle do processo inflamatório da doença de base, levando a estabilização ou resolução parcial do depósito amiloide.

A amiloidose heredofamiliar é identificada pelas várias regiões onde cada família e tipos de depósito amiloide foram descritos e estão associados a quadros clínicos bastante distintos, ou seja a forma de transmissão geralmente é do tipo autossômico dominante, com a exceção da febre familiar do Mediterrâneo, que é autossômica recessiva,que tem como características surtos recorrentes de febre, serosites ( inflamação da serosa que cobre alguns órgãos, principalmente peritônio e pleura que recobrem os pulmões ) e artrite, que se inicia na infância/adolescência, principalmente àqueles que são de origem mediterrânea. O depósito amiloide é do tipo AA, semelhante ao das formas reativas, e envolve fígado, baço, suprarrenal e principalmente rins, onde a proteinúria é inicialmente observada e, após 2 a 15 anos, evolui invariavelmente para síndrome nefrótica e insuficiência renal, levando à necessidade de tratamento por diálise peritoneal ou hemodiálise.

Outras variantes do aparecimento de Amiloidose

A amiloidose local pode estar presente em qualquer órgão, por vezes assemelhando-se a tumores, principalmente em pulmão, pele, laringe, olhos e vesícula.

A amiloidose associada à hemodiálise crônica é um grande desafio no tratamento da insuficiência renal crônica, pois, nesta forma, existe o depósito de fibrilas constituídas por microglobulina intacta que normalmente não consegue ser removida durante a diálise, geralmente ocorre em mais de 50% dos renais crônicos após 5 anos do início desse procedimento. Caracteriza-se principalmente pela presença de  poliartrite tipo reumatoide com formação de pannus, tenossinovite, síndrome do túnel do carpo e aparecimento de grandes cistos e erosões ósseas, eventualmente levando a fraturas patológicas. Até o momento, o transplante renal é o único tratamento efetivo desta condição, pois leva à rápida normalização dos níveis séricos de beta-2-microglobulina e resolução dos sintomas.

A amiloidose cerebral está estreitamente relacionada à doença de Alzheimer, síndrome de Down e amiloidose hereditária com hemorragia cerebral (holandesa), que compartilham o depósito da proteína amiloide beta (A-beta), devemos sempre frisar de que o cérebro e os vasos sanguíneos cerebrais são raramente afetados nas amiloidoses sistêmicas, porém são importantes sítios de depósito local nestas formas.

A amiloidose endócrina ocorre em glândulas secretoras de hormônios polipeptídicos, bem como em tumores secretores hormonais,por exemplo no caso do diabetes mellitus não insulino-dependente ( tipo 2 ), o depósito de proteína amiloide do tipo AIAPP (polipeptídio amiloide das ilhotas de Langerhans) pode ser encontrado em até 95% dos pacientes com esta doença.

Repercussões reumáticas da Amiloidose

A substância amiloide é depositada na articulação, na membrana e no líquido sinovial, porém convém frisar de que artropatia amiloide é encontrada principalmente na amiloidose secundária ao mieloma múltiplo, mas também na forma primária, na febre familiar do Mediterrâneo e na forma associada à diálise.

A artrite amiloide geralmente mimetiza aquela encontrada na artrite reumatoide, com quadro simétrico, de pequenas articulações, associado a rigidez matinal e fadiga,sendo que as articulações preferencialmente comprometidas são ombros, punhos, joelhos e dedos; elas se apresentam edemaciadas e firmes, mas sem rubor e dor importante, portanto é nesses casos que um importante espessamento sinovial deve ser considerado como indicativo de amiloidose.

A artropatia amiloide pode manifestar-se como síndrome do tunel do carpo devido à infiltração de punhos, principalmente em indivíduos com mais de 50 anos de idade. Na amiloidose primária, a síndrome do túnel do carpo pode ser encontrada em até 20% dos casos e pode ser decisiva para o seu diagnóstico, mas infelizmente ela é muito mais comum na amiloidose secundária à hemodiálise crônica, onde a compressão do nervo mediano ocorre em mais de 70% dos pacientes; Convém frisar de que outra articulação que merece bastante destaque é o ombro, ou seja o aparecimento de “ shoulder pad “ que ocorre principalmente na amiloidose primária em decorrência da intensa infiltração amiloide em ombros, por isso torna-se em importante sinal sugestivo do diagnóstico dessa patologia .

DIAGNÓSTICO

Na maioria das vezes, a suspeita clínica é secundária ao depósito amiloide nos órgãos afetados, portanto, a investigação deve ser dirigida a área comprometida.

Infelizmente as alterações nos exames de sangue e urina são, por vezes, inespecíficos, como um aumento de velocidade de hemossedimentação (VHS) e da PCR:No entanto se observamos a presença de proteinúria e hipergamaglobulinemia, elas  podem levantar a suspeita do diagnóstico de amiloidose AL, principalmente quando associadas a neuropatia periférica ou insuficiência cardíaca congestiva. Nas formas de amiloidose primária sistêmica e naquela associada ao mieloma múltiplo, a identificação de uma cadeia leve monoclonal pode auxiliar na suspeita diagnóstica, embora possa ainda ser negativa em 15 a 20% dos casos.

No entanto a imunoeletroforese revela a presença de cadeia leve monoclonal, frequentemente lambda, na amiloidose primária sistêmica (tipo AL) ou da cadeia leve kappa na amiloidose secundária ao mieloma múltiplo.

O diagnóstico de amiloidose baseia-se na demonstração histológica do depósito tecidual de amiloide por meio de coloração específica,felizmente a confirmação histológica do amiloide é classicamente demonstrada pela coloração com vermelho-Congo, que, sob microscopia polarizada, apresenta uma birrefringência verde;porém devemos observar de que  nem sempre as fibrilas amiloides são identificadas à microscopia eletrônica e, na verdade, seu achado isolado também não permite a confirmação diagnóstica.

A biópsia deve ser preferencialmente realizada no órgão suspeito de infiltração amiloide, considerando-se que existe o risco de complicações relacionadas a sangramento, convém referir de que a biópsia de reto ou de gordura subcutânea são as menos invasivas, com positividade de mais de 90% tanto nas formas primárias quanto secundárias.Devemos também referir de que existem outros sítios passíveis de biópsias que são a gengiva e a medula óssea, que possuem sensibilidades de 80% e 50%, respectivamente. O uso de anticorpos dirigidos contra as proteínas fibrilares amiloides, por imunofluorescência e por imunoperoxidase, pode facilitar a sua identificação,mas infelizmente a positividade à imuno-histoquímica do amiloide não constitui método isolado de diagnóstico, havendo também a necessidade da confirmação pela coloração com vermelho-Congo.

Radiologicamente, a osteopenia generalizada é observada em até 80% dos casos, mesmo na ausência de lesões líticas. O fator reumatoide habitualmente é negativo, sendo de auxílio na sua diferenciação,já a análise do líquido sinovial revela um líquido não inflamatório com predomínio de células mononucleares e presença de depósitos amiloides no vilo sinovial à coloração do vermelho-Congo.

TRATAMENTO

Os princípios da terapêutica da amiloidose baseiam-se na redução da formação do amiloide e, ao mesmo tempo, dissolução dos depósitos existentes ,ou seja destruição dos amiloides presentes e prevenção do seu crescimento.

A redução do precursor amiloide consiste na diminuição da síntese hepática das proteínas de fase aguda, ou seja tem se observado de que a utilização de drogas citotóxicas na artrite reumatoide juvenil e do adulto reduziu a incidência de amiloidose e melhorou o prognóstico dessas doenças.

O clássico uso da colchicina no tratamento da febre familiar do Mediterrâneo, além de prevenir ataques febris, também se mostrou comprovadamente efetivo na redução do depósito amiloide, preservando função renal e aumentando a sobrevida ao longo do tempo,além disso ela parece exercer efeitos adicionais na amiloidose AL, principalmente quando associada a melfalam e prednisolona ( corticóide ). A realização de plasmaférese e o transplante hepático também parecem ser efetivos como redutores da amiloidose familiar por TTR, assim como o transplante renal para a amiloidose causada pela beta-2-microglobulina (A-beta-2M).

Medidas de suporte são particularmente importantes no seguimento destes pacientes, por retardar a piora da insuficiência de um determinado órgão, por exemplo, o controle rigoroso dos níveis pressóricos na amiloidose renal. O transplante hepático, renal e cardíaco pode ser necessário em casos extremos, sobretudo na amiloidose do tipo AA, convém salientar que a utilização de determinadas drogas, como digital e bloqueadores de cálcio, deve ser cuidadosa nos casos com envolvimento cardíaco, pois podem agravar a função miocárdica.

Até o momento, a história natural da amiloidose sistêmica apresenta prognóstico e desfecho ruins, principalmente devido ao início tardio do tratamento, pelo diagnóstico tardiamente feito, por isso é que o reconhecimento precoce dessa doença, prevenindo o depósito de amiloide nos órgãos, é um dos fatores mais importantes para sua boa evolução.

Uma Boa Semana, com muita Paz Saúde e Harmonia Familiar…

Namastê!!!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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