Podem me chamar de utópico ou ingênuo, não me importa o conteúdo da acusação, mas estou convencido de que a solidariedade tem sido o grande diferencial no mundo moderno. Não é a busca pelo dinheiro ou a garantia do sucesso profissional os maiores motivadores do novo homem ou da mulher do III Milênio, embora para muitos continuem sendo a únicas razões da vida. Acredito que o trabalho solidário de milhões de cidadãos seja, efetivamente, o elemento novo nas relações sociais, fazendo com que um outro mundo se torne realmente possível.
E não é sem razão que assim penso, pois acredito que estamos começando a perceber que solidariedade é o principal alimento do cardápio social, pois somente o seu consumo poderá permitir que o mundo mate a sua crônica fome de igualdade e liberdade. Aliás, o sonhado mundo igualitário comunista falhou quando prendeu a liberdade, da mesma forma que o livre pensar estadunidense asfixia o planeta por não aceitar a igualdade entre os povos. Em ambos a solidariedade funciona apenas como figura de retórica, nunca tendo sido uma prática real nos dois pensamentos.
É realmente impressionante a quantidade de instituições e pessoas envolvidas na tarefa de construir um mundo melhor, quase sempre de forma anônima e não remunerada. Hoje a palavra responsabilidade social está sendo pronunciada como se estivesse adicionada permanentemente ao dicionário de várias empresas, assim como o voluntariado passou a ser um trabalho cada vez mais procurado. Em ambos a solidariedade funciona como elemento naturalmente prático, em nada lembrando que era pregada apenas como elemento de propaganda.
Tenho na OAB o meu primeiro grande exemplo de que a solidariedade é palavra forte no seio da advocacia. A OAB, conhecida carinhosamente como a “guardiã da sociedade”, atua através do trabalho voluntário de seus dirigentes e advogados. A OAB é respeitada na sociedade em função da compreensão solidária do advogado, que sempre se orgulhou da atividade institucional de sua entidade, hoje com atuação reconhecida expressamente na Constituição Federal.
A voluntária atuação solidária da advocacia está tão consolidada no seio da sociedade, que, para muitos, a OAB é um órgão público que remunera os seus dirigentes e que, portanto, tem a obrigação de estar presente em todos os lugares e conflitos sociais. Aliás, este erro de compreensão permite que se cometa algumas injustiças contra os voluntários advogados que integram à OAB, pois, algumas vezes, são chamados de omissos, especialmente quando não conseguem responder imediatamente às demandas sociais e corporativas. Para estes poucos críticos, não serve como defesa o fato de que os advogados voluntários também precisam trabalhar para sobreviver, não podendo, infelizmente, estar à disposição da sociedade todas as horas do dia, inclusive se antecipando aos fatos sociais.
Mais ainda assim, os solidários advogados não se cansam de superar os obstáculos tempo e as dificuldades do trabalho voluntário, tanto assim o é que a OAB não para de crescer, inclusive no campo corporativo. A OAB/SE, que no passado funcionava literalmente como repartição pública, mudou e cresceu a partir a ação solidária do grupo integrado pelo então presidente José Silvério Fontes, no movimento histórico conhecido como “Independência e a Democracia na OAB/SE”. Foi quando conquistou a sua sede própria (hoje ampliada com a junção de quatro casas), que logo se tornou conhecida como a “Casa da Cidadania Sergipana”.
Hoje, o trabalho voluntário da advocacia consolidou a estrutura física da OAB/SE, tornando-a mais visível, independente e atuante, inclusive com sede em outras cinco cidades (Estância, Lagarto, Itabaiana, Propriá e Nossa Senhora da Glória). Novos serviços foram criados, a exemplo da Escola Superior da Advocacia, das salas nos fóruns, da sede da CAASE, que passou, pela primeira vez, a fornecer serviços odontológicos, livraria, farmácia, plano de saúde e plano de aposentadoria. Inovou quando passou a se preocupar efetivamente com o jovem advogado, bem assim com o acadêmico de direito (é a única Seccional do Brasil que tem em seu regimento uma comissão composta exclusivamente por estudantes), nunca se descuidando em agir em defesa das prerrogativas do advogado.
Como se vê, a minha ingenuidade em acreditar na solidariedade não é tão utópica assim, pois eu tenho um paradigma a apontar como exemplo. Quando criticam a importância do trabalho voluntário como instrumento fundamental para que habitemos um mundo melhor, a minha resposta é sempre a mesma. Digo aos incrédulos: – Mirem-se no exemplo da OAB, aprendam com a consciência solidária da advocacia.
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(*) Cezar Brito é advogado, conselheiro Federal da OAB e presidente da Sociedade Semear.
cezarbritto@infonet.com.br