E agora José? E agora, você?

Acabo de participar V Encontro Nacional do Advogado em Início de Carreira, na cidade de São Luiz (Ma), que também teve a finalidade de lançar a Campanha Nacional de Valorização do Jovem Advogado. Além de representar a OAB, tive a incumbência de participar, como expositor, do painel “Inserção profissional e responsabilidade profissional do advogado”. Durante os debates e painéis desenvolvidos ao logo do evento várias alternativas foram expostas, experiências discutidas. Marketing, organização de escritórios, especialização, expectativas de mercados, tributação de serviços, honorários advocatícios, tendências legislativas e o direito eletrônico eram algumas das abordagens apontadas como solução para um futuro profissional vitorioso. A expansão de escritórios bases, como o de Sergipe, era uma das reivindicações mais discutidas pelos advogados presentes.

 

Não resisti, entretanto, no meu painel, de fazer uma reflexão sobre a principal preliminar para o exercício de qualquer profissão, até porque, sem ela, é impossível avançar para as demais etapas profissionais. O querer-ser é, sem medo de errar, o primeiro passo para a longa caminhada profissional. Não poderia ser diferente, pois sem querer-ser a inércia ganha por antecipação, nada sai do lugar, tudo fica como antes. Querer-ser é ato de ação, é vontade externada, é a ousadia de partir rumo ao desconhecido. Querer-ser é se preparar para enfrentar os obstáculos que certamente aparecerão durante o percurso escolhido. O querer-ser é, simplesmente, o passo mais decisivo para o ser-profissional.

 

Carlos Drummond de Andrade, com a sua mágica poesia, decifrou este momento de agonia e definição quando assim ensinou:  “E agora José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora José? E agora, Você? Você que é sem nome, que zomba dos outros, Você que faz versos, que ama, protesta? e agora José? / Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora,  José? / E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio, – e agora? / Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora? / Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse, a valsa vianense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse … Mas você não morre, você é duro José! / Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua, sem cavalo preto que fuja do galope, você marcha José! José, para onde?”

 

Querer-ser é simples, porém de difícil execução. Conquistar através do querer é certo, entretanto arriscado. Não se sabe onde, quando ou se o querer se transformará no ser.  Mas quando se conhece o querer fica mais conquistar o ser. Torna-se mais clara a reflexão sobre o trajeto percorrido, os obstáculos vencidos e a chegada pretendida. Compreende-se melhor o tempo das festas juvenis, as luzes da esperança, as noitadas inconseqüentes, as poesias, os namoros e a utopia que se fizeram bagagem. Permite-se que se aprofunde o estudo, escreva-se o discurso, não se perca a viagem e sorria o próprio riso, mesmo quando tudo parece acabar, esfriar, fugir e mofar. Aprende-se o poder da doce palavra, a cura para a febre, o saciar da fome, o abrir das portas, não morrer na maré, a gritar a coragem, tocar a música da vida e dela não fugir a galope.

 

Em resumo, o inscrito na OAB somente será advogado quando quiser ser advogado, ousando  exercer a profissão, enfrentando os obstáculos, pegando o bonde da história e não desanimando durante a caminhada. Por mais que a tecnologia, os recursos, as estruturas, os projetos e as perspectivas estejam à disposição, ainda que de forma dificultosa, não se poderá exercer qualquer atividade profissional sem superar o obstáculo inicial do querer-ser. E a largada para a vida profissional, sem qualquer dúvida, começa no mundo interior do querer, mesmo porque para se tornar um profissional ativo é preciso, antes de tudo, querer-ser este profissional projetado e acalentado no caminhar do tempo.

 

Assim é para a advocacia, é assim é para toda e qualquer profissão. Assim é em toda partida, assim é em toda caminhada, assim é em toda chegada. E para você, José ou outro nome, também é assim?

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