Faça por merecer

O Conselho Federal de Medicina, através da Comissão de Humanidades Médicas, da qual participo há alguns anos, dá ampla visibilidade ao seu trabalho a partir de três ações concretas bem sucedidas.  A primeira atividade vitoriosa é o Congresso de Humanidades, com sete edições, interrompido na sua versão presencial desde 2020, em razão da pandemia. Para suprir a falta a comissão criou o Webinar “Ciência e Espiritualidade”, agora na sua terceira versão, com transmissão pelo Youtube.  Finalmente, a terceira grande ação é o blog “Humanos”, presente na página do CFM na Internet, com temas palpitantes abordando as mais variadas questões no âmbito das humanidades.

Em uma época tão conturbada mundialmente pela pandemia da COVID-19 e pela guerra no Leste Europeu, com reflexos sociais e econômicos profundos, a difusão de temas e debates dessa natureza, que buscam promover um aperfeiçoamento nas relações humanas, sempre é muito bem-vinda.

O formato adotado no webinar tem chamado o interesse dos médicos de um modo geral, pelo seu adequado tempo de duração, em torno de 90 minutos, composto por uma conferência principal, seguida de debates e um espaço para simples reflexão com o “Momento da Arte”, onde são apresentados temas musicais, quando não recortes de filmes consagrados e as lições que eles nos trazem. Para exemplificar, nesse III Webinar, fará a conferência o professor Luiz Eduardo Siqueira, do Paraná, tendo como tema “Nenhum homem é uma ilha”. Como tem acontecido desde o primeiro webinar, venho sendo escalado para apresentar o Momento da Arte, o que atribuo à gentileza dos meus pares para com a Sobrames – Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – cuja regional sergipana venho conduzindo desde a sua reativação em 2014.

O tema que propus para o III Webinar traz lições profundas para todos os que se propõem a construir uma vida digna e útil para a sociedade. O cenário de fundo é a Segunda Guerra Mundial e o contexto é humano, carregado de uma simbologia ímpar. Um apelo, único e magnífico, no sentido de responsabilidade e da dignidade humana. Mostro uma das minhas cenas favoritas, contidas em O Resgate do Soldado Ryan, de Steven Spielberg, lançado em 1998.

Perto do final do filme, o soldado James Ryan está olhando para o capitão John Miller, ferido, interpretado nas telas por Tom Hanks. Deitado, gravemente ferido, naquela batalha heroica com a ponte ao fundo, ele chama o soldado Ryan, que fora resgatado pelo grupo às custas de muito sacrifício e vidas perdidas, e pelo fato dele também ter perdido todos os seus irmãos na guerra, mesmo assim se recusava a deixar o front, queria ficar com seus companheiros na campanha final e o capitão ferido, morrendo, balbucia ao seu ouvido três palavras mágicas, quase inaudíveis, “James, faça por merecer”!

A cena seguinte já acontece quarenta anos depois, com James Ryan voltando ao cemitério onde estava o túmulo do capitão, levando toda a família. Ele diz: todos os dias da minha vida lembro do que ele me disse naquele dia: “faça por merecer! E pretendi, tentei viver a minha vida do melhor modo possível, e espero que pelo menos diante dos seus olhos, tenha sido suficiente para compensar e agradecer o que vocês fizeram por mim. O sujeito educou o soldado Ryan com uma frase que o fez pensar 40 anos, por toda a vida…

Não contente com isso, chamou a mulher que nada sabia da história, e diz pra ela: diga que a minha vida presta, diga que eu tive uma vida digna, ou seja, ele precisa da validação da família, após 40 anos. E é somente depois que a mulher diz, “sim, você é um homem bom” é que ele faz a continência diante do túmulo do capitão.

Faça por merecer! Quando uma cena é utilizada de modo educacional e como instrumento de reflexão, acende-se a chama da ética nas pessoas e isso faz toda a diferença.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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