Andrey Augusto Ribeiro dos Santos
Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada (PPGHC/UFRJ)
Bolsista CAPES
Integrante do Grupo de Pesquisa sobre Política Internacional (GPPI/UFRJ) e do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS)
“O 11 de setembro israelense”. Assim vêm sendo apontados os ataques executados no último fim de semana pelo grupo palestino Hamas contra o território de Israel. Na manhã do dia 07 de outubro, milhares de foguetes foram lançados contra o território israelita, enquanto vários combatentes invadiram o país por terra e ar, matando e sequestrando várias pessoas. A retaliação das forças israelenses veio logo em seguida, com o saldo, até o momento, de 2200 mortos, somando as perdas nos dois lados.
Esse episódio chama atenção pela proporção e pelos danos causados, considerando a superioridade militar de Israel, o que vem despertando questionamentos em relação a responsabilidade de agências de defesa e inteligência, que haveriam falhado em prever o ocorrido. O atual atrito se soma a uma extensa lista que apenas aumentou ao longo de 70 anos de hostilidades entre palestinos e israelenses, o que faz do conflito um destaque recorrente na mídia, com diversas narrativas sendo difundidas sobre ele. Mas, como teve início a questão entre esses dois povos?
Apesar dos discursos religiosos que passaram a rondar as discussões, o problema nesse caso é essencialmente territorial. A região em disputa hoje esteve, desde o século XVI até a 1° Guerra Mundial, sob o domínio do Império Otomano, passando para mãos britânicas após o fim do conflito e a desagregação e divisão das posses otomanas entre os vencedores.
Naquele período, ganhava força o Sionismo, movimento nascido da onda nacionalista do fim do séc. XIX e que defendia que os judeus deveriam ter seu lar na sua terra prometida, localizada na Palestina. Com isso, teve início uma grande migração judaica para a região, o que acabou gerando resistência por parte da população já residente no território, formada principalmente por árabes e muçulmanos, que também passou a se organizar sob uma bandeira nacionalista que rechaçava ingleses e judeus.
No decorrer da 1° Guerra Mundial, os britânicos fizeram diversas promessas a sionistas e árabes referentes à partilha do território, buscando seu apoio. No entanto, não conseguiram cumprir a maioria dessas promessas, o que acabou aumentando as tensões entre os dois grupos nacionalistas. Assim, os ingleses não conseguiram lidar com a pressão e o desgaste causado pelas hostilidades na região, entregando a questão para a Organização das Nações Unidas (ONU), já em 1947.
Nesse período, o pleito sionista ganhou força graças aos horrores empreendidos pelos nazistas na Europa durante a Segunda Guerra Mundial, tornando desconfortável para quaisquer atores questionar as reivindicações judias. A ONU apresentou então um projeto de partilha da região em dois estados, um palestino e outro judeu, deixando Jerusalém sob controle internacional. A proposta foi aceita pelos sionistas, porém, rejeitada pelos árabes, que apontaram desproporcionalidade na divisão territorial, considerando o tamanho das duas populações na Palestina e de recursos como terras aráveis e água.
Apesar da negativa árabe, a proposta foi aprovada na Assembleia da ONU e o Estado de Israel foi fundado no ano seguinte, em 1948. Países árabes vizinhos – Egito, Síria, Jordânia e Iraque – não aceitaram o ocorrido, o que gerou diversos conflitos nos quais Israel se sobressaiu, com destaque para a 1° Guerra Árabe-Israelense (1948), a Guerra dos 6 Dias (1967) e a Guerra do Yom-Kippur (1973). Como resultados desses confrontos, tivemos a expansão do território israelense, que cresceu cerca de 50% e inviabilizou a criação de um estado árabe na região, e a expulsão ou fuga, até hoje sem direito a retorno, de milhares de palestinos.
Desde então, os dois povos passaram por vários momentos de trégua e intensificação de hostilidades, que acabaram dando origem a novos atores políticos na região, como o próprio Hamas, surgido após a 1° Intifada, uma revolta espontânea dos palestinos contra a ocupação israelense ocorrida em 1987. Com o passar dos anos, cresceram as críticas à maneira como os israelenses conduzem a situação, sendo acusados principalmente de uso de violência desproporcional e instalação de um regime segregacionista contra as populações árabes sob o seu domínio. Em sua defesa, Israel alega estar defendendo sua população e combatendo o terrorismo.
Hoje ainda defende-se que a melhor proposta para a resolução da questão entre israelenses e palestinos é a solução de dois Estados; no entanto, o aprofundamento das hostilidades e ressentimentos e os pontos de conflito aparentemente inconciliáveis entre os dois grupos, como questões relacionadas a fronteiras, ao controle de Jerusalém, a assentamentos israelenses estabelecidos em territórios ocupados, dentre outras, inviabilizam tal desfecho. Com isto, o aumento de tensões ocasionado por um governo israelense ligado à extrema-direita, somado ao recrudescimento das ações do Hamas, dificultam o vislumbre de uma solução pacífica para este quadro num futuro próximo.