João e o transporte público de Aracaju

O prefeito João Alves Filho derruba qualquer tese que afirma ser precipitado analisar uma gestão pública com apenas pouco mais de três meses de iniciada. Com João, já é possível, sim, avaliar. Em apenas 100 dias, o prefeito de Aracaju já deu demonstrações claras de como será todo o seu mandato: ataques aos direitos dos trabalhadores e ao conjunto da população, ainda que desrespeite a legislação, ao mesmo tempo em que mantém uma imagem de prefeito preocupado com o povo. Para isso, João tem em suas mãos uma arma bastante poderosa: uma bancada de vereadores fiéis, que não diverge em nada de suas posições e que compra qualquer desgaste político para que o prefeito seja preservado.

Foi assim no início de fevereiro, quando os vereadores aprovaram o Projeto de Lei Complementar 04/2013, que pôs fim à gestão democrática na educação municipal. Nas sessões em que o tema esteve na pauta, percebia-se que a bancada da situação rejeitava qualquer debate mais aprofundado ou qualquer proposta originária da oposição. A ordem era passar por cima e aprovar a qualquer custo, já que o líder do Executivo mandou.

Foi assim com o aumento da tarifa de ônibus em Aracaju para R$ 2,45,  votado ontem (10) pelos vereadores da capital. Bastante coesa e disposta a efetivar o aumento da tarifa, a bancada da situação não deu a mínima para as considerações dos demais vereadores nem para as contribuições e opiniões da população, muito bem representadas nas análises feitas pelo Movimento Não Pago.

Novamente, a ordem era aprovar o aumento e preservar o prefeito João Alves Filho.

Na sessão de ontem, os membros da bancada do “sim, senhor” afirmavam a todo momento  que, pela primeira vez, um prefeito respeitava a Lei Orgânica municipal e submetia a discussão sobre o aumento da tarifa de ônibus à Câmara de Vereadores. Nada além de tentar enganar a população, já que o que aconteceu não foi o cumprimento da Lei Orgânica, mas um desrespeito à legislação maior de Aracaju.

Em seu artigo 238, a Lei Orgânica do Município de Aracaju estabelece que “as tarifas de serviços de transporte coletivo, de táxi e de estacionamento público no âmbito municipal devem ser fixadas pelo Poder Executivo”. E o artigo 239, §3º, diz que “a majoração do preço da passagem do ônibus urbano será submetida à Câmara de Vereadores, sendo que esta, no prazo de vinte e quatro horas, apreciará os valores expressos nas planilhas de custos, acatando o valor sugerido, ou mesmo, após fundamentação, fixando o novo índice de aumento”.

A legislação é clara: é prerrogativa do Executivo propor um valor de reajuste da tarifa e ao legislativo cabe o papel de aprovar, rejeitar ou, ainda, apresentar outro valor.

Portanto, o que aconteceu ontem foi uma verdadeira manobra e desrespeito à Lei Orgânica, já que o prefeito João Alves Filho não enviou nenhum projeto de aumento da tarifa, mas apenas submeteu as planilhas de custos do Setransp e da SMTT. O que tramitou ontem e foi aprovado pelos vereadores foi um Projeto de Lei da Mesa Diretora da Câmara, apresentado por dois fiéis seguidores de João: Vinícius Porto (DEM) e Daniela Fortes (PR). Afinal, o homem que seria "a solução" (como dizia seu slogan de campanha) não pode “se queimar” com a população, que é contrária ao aumento.

Por mais de uma vez, vereadores da oposição tentaram alertar os colegas parlamentares sobre o risco de estarem votando algo que desrespeita a Lei Orgânica municipal, mas a bancada da situação pouco se importava. A ordem era passar por cima e aprovar o aumento.

Mas não foi apenas isso. Na sessão de ontem, os vereadores de Aracaju conseguiram se superar e defender o aumento da tarifa com base em uma série de argumentos falsos.

Vereadores como Manuel Marcos (DEM) e Anderson de Tuca (PRTB), por exemplo, afirmaram que o aumento da tarifa era “necessário” para garantir o aumento do salário dos trabalhadores. Ora, por mais de dez anos (entre 2000 e 2011) o valor da passagem aumentou em 150%, mas a situação salarial e as condições de trabalho dos funcionários das empresas de transporte quase não mudaram. O aumento da tarifa nunca teve como reflexo o pagamento dos direitos trabalhistas, mas apenas o enriquecimento dos empresários do setor de transporte coletivo.

O vereador Jony Marcos (PRB) chegou a afirmar que seria um “caos para as empresas” caso a tarifa não aumentasse, pois “não houve aumento no ano passado”. De fato, aumento da tarifa não houve, mas o Imposto sobre Serviços (ISS) pago pelos empresários diminuiu consideravelmente. Ou seja, os empresários não deixaram de lucrar com o congelamento da tarifa.

O vereador Valdir Santos (PTdoB) disse que aquela era a primeira vez que a Câmara tinha a oportunidade de discutir o tema. Parece que o vereador esqueceu da Sessão Especial, proposta pelo vereador Iran Barbosa (PT) e realizada em 11 de março, em que o Setransp não enviou nenhum representante para discutir abertamente com o legislativo e com a população o valor da tarifa e a qualidade do serviço de transporte. Foi nessa sessão que o Movimento Não Pago denunciou uma série de irregularidades nas planilhas de custos apresentadas pelos empresários e propôs não o reajuste, mas sim a redução da tarifa para R$ 1,82. Proposta que, diga-se de passagem, foi solenemente ignorada pela ampla maioria da Câmara.

Como havia escrito em artigo no mês de janeiro, quando o assunto é transporte público em Aracaju as aparências enganam.

E, mais uma vez, a enganada e prejudicada foi a população de Aracaju que pagará uma tarifa alta por um serviço precário. Um serviço que apenas enriquece os empresários, em troca de ônibus velhos, superlotados, sem horários definidos, sem qualquer controle social e com trabalhadores desrespeitados em seus direitos. Enquanto isso, o prefeito João Alves Filho se exime do debate e continua posando de político preocupado com a população.

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