Pequenas Mentiras

Eu estava numa loja de departamentos, na fila dos caixas para pagar umas compras. Na minha frente, um senhor e uma criança com um carrinho na mão. O menino estirou o bracinho e entregou à operadora do caixa o seu presente, pois estava todo prosa, satisfeito por comprar, ele mesmo, aquele automóvel.

A sua satisfação era tão grande que pediu a seu pai o dinheiro para, também ele, efetuar o pagamento. Recebeu duas notas de vinte reais. Naquele mesmo momento, aparece no visor da registradora, o valor: sessenta e nove reais e noventa centavos. O pai, assustado, disse: mas lá está anunciado, na plaquinha, que o preço é apenas trinta e nove reais e noventa centavos?

Vamos verificar, disse a moça do caixa. Pediu um pouco de calma e compreensão aos da fila, chamou o fiscal que foi à seção de brinquedos e voltou logo, trazendo na mão outro carrinho, este sim, o que custava trinta e nove reais e noventa centavos. Aquele que o garoto pegou custava, realmente, sessenta e nove reais e noventa centavos.

Nesse momento foi criado um pequeno conflito entre o pai e o filho, pois enquanto o pai achava muito caro o carro escolhido pelo filho, este só queria se fosse aquele mesmo. Não abria mão.

Foi quando o pai, por falta de argumento para convencer o pimpolho, e levado pela terrível técnica que a todo o momento, nós adultos, praticamos, deu um mau exemplo e mentiu para o filho, dizendo que aquele carro estava quebrado e que não tinha outro na loja

“Tá não, você está me enganando, eu vi e ele não está quebrado, eu quero é este mesmo e pronto…”, respondeu o garoto, o que fez com que o pai, para não passar mais vergonha, simplesmente se calasse, curvando-se à autoridade do filho que o flagrou mentindo. Complementou o pagamento e saíram os dois emburrados e discutindo.

Citei esse incidente, para evidenciar o mal provocado pelo fato de termos sempre uma mentira pronta para nos desonerarmos de certas situações. Desgraçadamente, não temos a coragem e nem o costume de dizer a verdade em determinadas ocasiões e, imediatamente, inventamos uma mentira para nos safarmos destes pequenos embaraços.

“Não! Isso não vale nada não. Só faço isso para me livrar da aporrinhação desse menino. Ele acaba esquecendo e fica tudo bem…”. Dizemos nós, em determinadas ocasiões.

Fica não, amigo. Ele não esquece. Ele registra tudo. E mais tarde responderá mentindo para você e para o mundo.

Uma cena que presenciei há alguns dias parece provar que todas estas mentiras voltam em forma de desculpas ou, como se diz por aí: “para se livrar de chateação”. Numa de minhas caminhadas à noite, por volta das vinte horas, escutei o seguinte diálogo de uma garota de mais ou menos uns quatorze ou quinze anos, que atendendo, bastante irritada, a um telefonema de sua mãe, disse: “mãe eu estou no shopping com Gabriela.”

Ela não estava no shopping. Ela estava com o seu namorado, o qual exibia, inclusive, uma garrafa de bebida, num lugar um pouco esquisito para namorar, um parque, que naquela hora, é quase deserto.

Não pretendo julgar o que estavam fazendo ou que iam fazer. Quero apenas mostrar que ela mentiu. O que, convenhamos, é quase uma normalidade. Ela não estava no shopping. Ela repetiu certamente as mentiras que aprendeu com alguém.

Nós pais, formadores da personalidade dos nossos filhos, nem imaginamos a nossa responsabilidade e o quanto representam as pequenas mentiras e os maus exemplos que a todo o momento estamos dizendo e praticando. Lá na frente, quando o resultado começar a aparecer certamente lamentaremos e, no desespero, surge a indagação: onde foi que eu errei? E a equivocado resposta, na ânsia de apaziguar a nossa angústia, a essa altura já  esquecidos daqueles maus exemplos dados e das mentiras ditas, tentamos mais uma vez mentir, desta feita, para nós mesmos e dizer: tenho certeza que não foi isso que eu ensinei ao meu filho.

 

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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