Recife (PE): oficina Francisco Brennand completa 50 anos

O mundo de Francisco Brennand completa 50 anos em 2021

Visitar a Oficina de Cerâmica Francisco Brennand não é somente conhecer um espaço de fabrico de lajotas, revestimentos ou objetos utilitários. Vai muito mais além. É ter a sensação de adentrar no imaginário de um dos gênios da arte brasileira que passeou pelo Movimento Armorial e criou um mundo de esculturas, objetos, formas, cores e sensações.

A Oficina Brennand criada em 1971 nas ruínas da olaria no Engenho Santos Cosme e Damião, no bairro da Várzea, em Recife (PE) e pelo mundo a fora, fundada pelo pai do artista no início do século 20, completa 50 anos em 2021, como materialização de um projeto de Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand.

Ainda do lado de fora, soldados saltimbancos fazem a segurança da propriedade

As formas do inconsciente encontradas através das leituras de Freud; o Ofá (arco e flecha) do orixá da caça, Oxóssi, e que se transformou no símbolo da arte do guerreiro Brennand; os cavaleiros saltimbancos; as cores do sertão brasileiro; a cultura mitológico, greco-romana, helênica; os animais nordestinos; o ovo e as aves fazem parte do imaginário do Criador que os têm como algo que remete à fertilidade, à imortalidade, à fecundidade, além da forte influência do cubismo e do pintor Pablo Picasso, e tantos outros itens que ele incorporou em sua arte, faziam e fazem do mundo sincrético do pintor, do escultor, do ceramista Francisco Brennand único e típico brasileiro.

O contato com a arte na entrada da oficina

Como num paradoxo, das mãos de Francisco nascia obras genuínas que transcendem o nacional e ganham o mundo em suas criações como ele mesmo escreveu no livro “Testamento 1 – O Oráculo Contrariado”, de 2005: “Aproximar a cerâmica do feitiço não é uma associação ocasional e sim uma realidade, embora uma realidade que me escapa, sobre a qual não tenho nenhum poder. Quando eu pinto, sou um artista ocidental. Quando faço cerâmica, não tenho pátria; minha pátria é o abismo pelo qual vou resvalando sem saber o que encontrarei no fundo. Como tenho arrefecido os meus ardores, sigo planando sobre os desfiladeiros”.

Os comediantes

E assim como num paradoxo o Criador fez seu mundo visitado no Recife transcender a fazenda da família para ganhar prédios públicos, largos, ruas e dimensões de mundo a fora, como um painel de cerâmica criado por ele em Miami (EUA) ou as esculturas do cais do Marco Zero do Recife. Mas a dica é começar a conhecer o mundo Brennand por sua oficina.

Corredor que dar acesso ao Templo Central e todas as obras entre colunas com roccas e cobras

A visita – Quando o visitante chega na fazenda do artista hoje ainda funcionando como oficina e ateliê, o som da natureza promovido pela restinga de Mata Atlântica transmuta para um ambiente bem único. Primeiramente, uma capela católica e logo depois vê-se as primeiras obras em formato gigante ainda no ambiente externo. O símbolo de sua obra no Ofá de Oxossi é visto em todos os lugares. Contam os condutores do local que a marca surgiu em uma ida do pernambucano à Salvador.

Personagens que mais parecem soldados em cerâmica fundida vitrificada estão por toda parte ainda no muro de tijolo aparente. Logo passa o muro, percebe-se os grandes galpões também de tijolinho típico da arquitetura rural alemão, vestígios de família.

A primeira obra ainda no jardim é “Os Comediantes”, quatro figuras de saltimbancos que mais parecem dar as boas-vindas. Logo em seguida fica uma fonte desenhada com formas arredondadas e de animais.

O Templo Central

A visita inicia por um corredor cheio de painéis gigantes, um dele com o nome “Mãe Terra”, além de cobras saindo de todo o percurso das paredes, colunas em cerâmica vitrificada de um lado e de outro que terminam em pássaros Roccas nas pontas. Esculturas de fartos peitos, aves, tatus, lagartos, formas antropozoomórficas que se embebedam em lagos e fontes, além de uma cúpula azul denominada de Templo Central com um “ovo primordial”, ao centro, que mais parece um templo místico. E assim Brennand construiu o seu mundo e faz o visitante imaginar. Cada um tem uma sensação diferente ao ter contato com a obra de Brennand.

Obras por toda a parte

E depois desse primeiro contato, a praça Burle Marx convida a visitar extensos painéis coloridos, fontes e chafarizes, projetados por Marx com esculturas do artista. Mais à frente ficam obras espalhadas por todos os lados, algumas delas fálicas, até chegar a um aconchegante “Academia”, uma galeria de arte com mais de 300 quadros de todos os períodos do Brennand pintor. Ele assina FB, Brennand, F.Breannand, o que faz as obras se enquadraram em períodos e certos temas.

O Templo Central

Ao sair, o visitante é convidado a percorrer sem pressa o “Salão das Esculturas” com mais de 1000 obras de arte ao logo do período criativo de Francisco. O “Anfiteatro” remete ao misticismo do artista, com figuras centrais e um ambiente bem assimétrico e luminosidade pensado para emergir num sincrético momento entre cânticos gregorianos, o Ofá de Oxossi e vitrais que parecem catedrais católicas.

A Praça Burle Marx

Mais ao lado esquerdo da propriedade fica o Templo do Sacrifício, um ambiente destinado às culturas devastadas e que representa as guerras vividas na região. O visitante ainda percorrerá a fábrica de cerâmica em que suas peças são fabricadas sob encomenda e exportada para todo mundo. No café, são disponibilizadas também peças de arte para aquisição. Por todos esses ambientes e obras, a Oficina de Cerâmica de Francisco Brennand é endereço cultural obrigatório para quem visita o Recife. Bora conhecer?

Salao das Esculturas

Dicas de viagem

Francisco Brennand (11/006/1927 a 19/12/2019), por vezes confundido com o primo Ricardo Brennand (27/05/1927 a 24/04/2020) –  esse último um colecionador –  era um inquieto criador que pôs em prática todo um imaginário com expressiva pernambucanidade do Movimento Armorial, até dar vidas à personagens, animais misteriosos e formas em conjunto com Ariano Suassuna, que se propunham a enaltecer uma arte erudita em suas mais diversas vertentes, mas com raízes tipicamente brasileira e embebecidos nas bases europeias.

Praça Burle Marx

A oficina de Francisco Brennand não fica em solo do Instituto Ricardo Brennand, mas próximo. Reserve um dia completo para conhecer os dois espaços. A oficina fica na propriedade Santos Cosme e Damião Rua Diogo de Vasconcelos, S/N – Várzea, Recife – PE e é aberta de terça a domingo das 10h às 17h.

Academia com exposição de mais de 300 obras

Paga-se para entrar R$ 30 e meia R$ 15. Professor e estudantes pagam meia.

Gastroterapia

Carne do Sol na chapa é bem nordestina

A carne do sol na chapa é bem apreciada na região Nordeste do Brasil. Suculente, macia, a carne é apurada geralmente ao sol, e ganha sal para apurar o gosto. Na chapa, a carne é embebecida de manteiga de garrafa do sertão e acompanhamentos, por vezes, um cheiro verde. Geralmente vem acompanhada de feijão verde, arroz e um vinagrete. Bom!!!!

Fotos: Silvio Oliveira @tonomundosilvio

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