Sindrome de Morgagni-Stewart-Morel: um achado no mundo da Medicina

Sempre me sinto feliz, sabes por quê?  Porque não espero nada de ninguém,
Esperar sempre dói, os problemas não são eternos, sempres têm solução;
O único que não se resolve é a morte; A vida é curta, por isso, ame-a!
Viva intensamente e recorde; Antes de de falar escute;
Antes de escrever, pense;
Antes de criticar, examine; Antes de ferir, sinta; Antes de orar, perdoe; Antes de gastar, ganhe;
Antes de render, tente de novo; Antes de morrer, viva!”( William Shakespeare )

Trata-se de uma doença ou síndrome que também é conhecida com os nomes de endocraniose hiperostósica, síndrome de Stewart-Morel ou hiperostose endocrânica, é uma doença relativamente antiga, porém muito pouco conhecida, pois há muito tempo que, na mesa de autópsia, tem sido encontrada hiperostose do frontal combinada com obesidade. Os primeiros casos descritos no vivo, no entanto, datam somente de 1930.

Sabemos que é uma patologia relativamente rara, como podemos observar ao estudarmos algumas estatísticas que pesquisamos. Alguns autores como Morel, Moore e Stewart dedicaram-se a um estudo retrospectivo, analisando e revendo radiografias de crânios, protocolos de autópsias e histórias clínicas, o que nos permite, atualmente, saber que a síndrome é de conhecimento antigo, porém pouco divulgado. Com auxílio do interessante trabalho de Moore2, publicado em 1935,pudemos descrever de forma esclarecedora  alguns dados históricos.

Em 1765, alguns cientistas relataram o primeiro caso conhecido da doença, encontrado na autópsia de uma mulher de 75 anos, muito obesa e de aspeto extremamente masculinizada. Em 1924,outro grande pesquisador Europeu, publicou um trabalho sobre hiperostose do crânio baseado no exame radiológico de 9 crânios com pouca ou nenhuma história clínica de doença; Foi somente em 1926 é que foi publicado um trabalho  sobre os transtornos envelhecidos encontrados em um crânio, com 5 radiografias de crânios encontrados em museus. Este mesmo pesquisador, em 1936, descreveu mais um caso de hiperostose frontal interna. Em 1928,foram publicados os protocolos de autópsia de 3 casos com o estudo de alguns espécimes encontrados em peças encontradas em museu. Nesse mesmo mesmo ano, foram descritos os osteofitos intracranianos do tipo hiperostose frontal interna, respeitando a porção orbitária do osso frontal, em 32 casos encontrados entre 188 crânios do Museu de Cirurgiões de Edinburgo.

Nesse período foi feita a descrição do primeiro caso diagnosticado no vivo, num idoso de 81 anos, internado no Asilo de Inválidos de Genebra. Além deste caso, foram acrescentados os protocolos de 15 autópsias praticadas no mesmo Asilo. Nesse ano, foi publicado o segundo caso com diagnóstico em vida, em uma paciente de 66 anos que apresentava ainda cegueira psíquica por apresentar hemianopsia dupla; Já no ano de 1931, pesquisadores relataram um caso, em um homem de 60 anos, com adiposidade e transtornos mentais; E posteriormente em 1939 foram relatados 4 casos9.Novamente em 1935 foi descrito um magistral trabalho cem uma revisão extensa dos negativos radiográficos do Departamento de Raios X da Escola de Medicina da Universidade de Washington, de 1911 a 1934, relacionando-os com as histórias clínicas de 72 casos encontrados entre os 5.955 revisados.

Neste histórico é justo lembrar alguns poucos trabalhos publicados sobre o tema no Brasil, no que respeita à bibliografia existente em 1936 foi  publicado em São Paulo um caso de hiperostose frontal interna, com cefaleia ( dor de cabeça ), poliúria ( urinando muito ) e obesidade severa. Em 1940,foi publicado no Rio de Janeiro outro caso, com o quadro clínico das escleroses ósseas endócrinas.

Dos trabalhos citados analisaremos com minúcia os de Moore que são os melhor documentados. No primeiro, a que já aludimos, ele classificou a calcificação patológica em 3 tipos – sessil, nodular e mixto – podendo confinar-se a alteração à porção escamosa ou orbitária do frontal ou extender-se a ambas. Das 72 histórias clínicas revistas, 97,2% eram de mulheres, com longa evolução da moléstia; 50,8% delas engravidaram de 1 a 21 vezes; em 97,2% dos casos havia sintomas neuro-hipofisários; em 62,7% cefaléia; em 44% obesidade, em 8,5% convulsões; em 5,8% transtornos tiroidianos; em 3,4 a reação de Wassermann era positiva no sangue. Polifagia polidípsia, poliúria e transtornos do sono foram observados em 81,9% dos casos. Quanto à idade, os casos distribuíam-se da seguinte forma: de 0 a 10. nenhum caso; de 10 a 20 (12 casos); de 20 a 30 (11 casos); de 30 a 40 (15 casos); de 40 a 50 (16 casos); de 50 a 60 (20 casos); de 60 a 70 (5 casos) e de 70 a 80 (3 casos).

No segundo trabalho14 resume suas pesquisas sobre 20.000 radiografias de cabeça, 193 observações clínicas e 660 crânios dissecados. Encontrou 3 casos com acromegalia. Os sintomas, em ordem decrescente de frequência, foram: cefaléia, obesidade, perturbações visuais, epilepsia, falta de memória, vertigens, transtornos do VII par, neuralgia essencial do trigêmio, além de outros sintomas de menor frequência e realce. Neste trabalho, as hiperostoses cranianas são classificadas em 4 tipos: hiperostose frontal interna (nodular ou sessil); nébula frontal (limitada ao díploe); hiperostose calvária difusa (aumento de volume e densidade de toda a abóbada craniana); hiperostose fronto-parietal (aumento de espessura da porção escamosa do frontal e parietal).

SINTOMATOLOGIA E DIAGNÓSTICO

O que podemos definir é de que os primeiros casos de hiperostose frontal interna foram achados de autópsia ou de diagnóstico retrospectivo pela revisão de radiografias, históricas clínicas e de protocolos de autópsias. Curiosamente os primeiros casos descritos no vivo também resultaram de alguns diagnósticos encontrados de forma acidental, ou seja ao ser praticado o exame radiográfico do crânio em casos de cefaléia intensa e rebelde, de acessos epilépticos, de transtornos nervosos ou mentais ou de acromegalia ( hiperprodução de GH-hormônio de crescimento ). Depois da divulgação dos casos e do melhor conhecimento do assunto, já é possível fazer um diagnóstico clínico dessa síndrome ou pelo menos um diagnóstico de suspeita. Não há um quadro típico que permita o diagnóstico certo antes da radiografia, porém um conjunto de sintomas pode fazer-nos suspeitar da síndrome. Podemos pensar nesse diagnóstico com muita probabilidade, diante de um individuo com cefaléia, obesidade ou tendência a ela, distúrbios menstruais, nervosos e mentais.

Dos principais sintomas, podemos citar em primeiro lugar a hiperostose, sintoma capital que lhe dá o nome; Em relação as radiografias, importante informar que devem ser tomadas de frente e perfil para permitirem ajuizar sobre a extensão e a forma da hiperostose. É muito importante frisar que  devemos observar cuidadosamente toda a parede craniana cuja espessura normalmente varia de 3 a 8 mm, segundo a idade, a porção escamosa e a porção orbitária do frontal, o díploe. Trata-se de uma simples aposição óssea sobre a taboa interna, sem rarefação, osteoporose ou descalcificação e sem sinais tumorais ou inflamatórios. A hiperostose pede ser regular ou irregular, simétrica ou assimétrica, em forma nodular difusa ou em placas mais ou menos extensas.

Sabemos que alguns pesquisadores distinguem três tipos de hiperostose na parede interna da calota:

a) hiperostose frontal interna com aposição óssea papilar ou verrucosa, dispondo-se sobre a porção orbitária do frontal, simetricamente em ambos os lados da linha média, mais acentuada na região frontal e na vizinhança do sulco da meníngea média ou sutura coronária;

b) girlandas ou placas na lâmina interna do frontal, na lâmina quadrilátera, nas apófises clinóides, podendo combinar-se com hiperplasia hipofisária e, mesmo, adenoma intraselar, com sintomas acromegálicos ou acromegalóides;

c) reação disostósica de tipo lacunar com dilatação do espaço diplóico e alterações do crânio, como pode observar-se na moléstia de Paget. Podemos observar, também, osteofitos do seio esfenoidal e etmoidal, assim como da região da sela e da parede interna do frontal e reações plásticas, sob a forma de tecido ósseo ou calcificações da dura-mater.

Transtornos nervosos e mentais são encontrados em 70% dos casos, já a dor de cabeça ( cefaléia ) é considerado o sintoma mais constante na Síndrome pois está presente em cerca de 62,7% dos casos, sendo de preferência frontal ou orbitária, mas podendo também ser occipital. Sua intensidade geralmente é variável, mas podendo também  assumir algumas vezes, o tipo de enxaqueca, com vômitos e enjoo. Geralmente há crises com recrudescência paroxística. A cefaléia geralmente não acalma com os analgésicos comuns.

Frequentemente os pacientes se queixam de vertigens e tonturas, porém não são raros os casos que se acompanham de acessos epilépticos de intensidade variável. Assinala-se também transtornos visuais, da marcha e do equilíbrio, ataxias, nevralgias, irritabilidade e transtornos neurovegetativos. Os transtornos mentais são frequentes, sendo assinalados em cerca de76% dos portadores da Sindrome, geralmente se apresentam com alterações de humor, de carácter e da personalidade, depressão, lentidão intelectual, falta de memória, às vezes, verdadeiras psicoses, como esquizofrenia e manias.

A obesidade é outro sintoma frequente (em cerca de 76,7%),sendo geralmente do tipo hipófise-genital, troncular e na raiz dos membros, atingindo os seios, o abdômen e as nádegas. Às vezes é do tipo masculinizado ou então pode se localizar na metade inferior do corpo como verificamos em alguns estudos europeus dessa Síndrome. A obesidade é geralmente um sinal tardio, aparecendo anos depois de ter iniciado a moléstia, mas devemos salientar também de que também é possível observar magreza de tipo hipofisário .

Os transtornos menstruais foram observados em 76% dos casos, podendo também ocorrer dismenorreia, oligo, hipo ou amenorreia; frequentemente insuficiência genital e redução de libido. No entanto, em algumas estatísticas observa-se que cerca de 50,8% das pacientes engravidaram de 1 a 21 vezes,podendo inclusive encontroarmos hiperostose em 30% das grávidas pesquisadas.

Além desses sintomas, tem sido observado principalmente nos casos em que a hiperostose se acompanha de acromegalia com ou sem tumor hipofisário, outros distúrbios tais como a polidípsia, poliúria, diabete insípido e, mesmo, diabetes melitus, geralmenteo insulinoresistente (hipofisário ?);convém referir de que distúrbios tiroidianos foram encontrados em 5% dos casos.

Tomando em consideração algumas estatística vemos que a frequência varia segundo o serviço ou tipo de assistência hospitalar. Tomando sobre o total de radiografias de crânio temos o índice de 1,2%. Tomando o total de radiografias (96.076) de alguns serviços, temos 0,075%.Pesquisadores acharam o índice de 1,4% nas autópsias do Asilo de Genebra; Sendo que a idade de maior frequência vai dos 30 aos 60 anos em algumas estatísticas. Na Áustria foram examinados 200 crânios pertencentes a indivíduos entre as  idades de 30 a 95 anos e afirma que a hiperostose aumenta desde 45-50 anos, sendo muito evidente aos 65-80 anos. Algumas estatísticas encontraram um maior número de casos entre 35-40 anos, sendo que na quase totalidade dos casos, tratava-se de mulheres (  98% ).

São muito escassos os dados de laboratório que possuímos acerca desta doença, mas em alguns casos pode haver hipercalcemia, hiperglicemia e tendência a acidose, sendo que alguns cientistas encontraram a reação de Wassermann positiva em 3,4% dos seus casos.

A moléstia tem curso longo e lento, aumentando e agravando-se os sintomas com a idade; podendo haver períodos de remissão aparente, pelo menos em relação a alguns sintomas.

Em relação a pesquisa pela anatomia-patológica,as informações que possuimos são extremamente escassos, por isso informamos apenas as  lesões encontradas concomitantemente com a hiperostose; Em alguns casos havia também tumor da região hipotalâmica, em outros havia obesidade generalizada e infiltração gordurosa dos músculos esqueléticos e, nas células da parede do ventrículo, um excesso de pigmento e gordura tão intenso que dava aparência granulosa às células; Já em outros pacientes havia também obesidade generalizada, infiltração gordurosa dos músculos esqueléticos, além de desaparecimento dos elementos celulares da hipófise e invasão pelo tecido fibroso (é necessário frisar que se tratava de velhos com aderência da dura-mater à hiperostose.

Em alguns estudos foi observado aumento de volume da hipófise com proliferação de células eosinófilas no lobo anterior, quer na sua porção anterior quer na posterior, assumindo aspeto de adenoma ( tumor benigno ). Tem-se descrito ainda meningiomas calcificados e calcificações das meninges. Alguns casos são acompanhados de acromegalia sem lesões hipofisárias.

É interessante frisar que em todos os casos com aderência da dura-mater à hiperostose, não foram encontrados sinais de inflamação ou de neoplasia ( benigno ou maligno ), quer no osso, quer nas meninges. Trata-se de uma simples aposição periostal na face interna do crânio, sempre na táboa interna, sem sinais de destruição óssea ou descalcificação (somente raramente se observou porosidade ao nível da hiperostose) nem de inflamação ou de tumor ósseo. O díploe pode estar diminuído ou desaparecido, mas em alguns casos foram encontradas lesões histológicas celulares na região infundíbulo-hipofisária (lobo posterior).

Muito se tem discutido sobre o mecanismo e a causa da hiperostose frontal interna, alguns pensavam que na posição decúbito-dorsal, o peso do cérebro fazia tração pela dura-mater sobre a superfície interna do frontal, provocando a calcificação, já outros opinavam que a hiperostose, elemento primitivo, exercia pressão indireta sobre a região infundíbulo-hipofisária, acarretando os outros sintomas.

Os Europeus consideravam esta moléstia como uma forma de moléstia de Paget localizada; aliás, na Áustria já se afirmava em 1929, que a reação disostósica de tipo lacunar com dilatação do espaço diplóico (3.° tipo da classificação de Pende) e alterações da calota, lembravam a doença de Paget, outros incluem na endocraniose hiperostósica, além dos osteofitos dos seios esfenoidal e etmoidal e da região da sela, as reações plásticas, às vezes em forma de tecido ósseo ou de calcificações da dura-mater; nestes casos pensa-se numa reação inflamatória da vizinhança por sinusites, tomando díploe e dura-mater.

Curiosamente um estudioso Sul Americano foi quem pensou em uma causa endócrina para explicar a síndrome, pois ela se instala quase que exclusivamente em mulheres, sendo frequentes os transtornos hipofisários e de outras glândulas endócrinas. A síndrome seria, talvez, devida a uma alteração hipofisária,convém considerar de que em todos os casos se verificou aumento de volume da hipófise e proliferação de células eosinófilas no lobo anterior, com aspeto de adenoma. Infelizmente um pesquisador alemão descreveu um caso com diabete mellitus insulinoresistente.

Em resumo a hiperostose frontal interna é frequentemente acompanhada de síndrome de Cushing ( hiperplasia da glândula adrenal ), de acromegalia com ou sem tumor hipofisário, tudo fazendo pensar em que a origem primária seja hipofisária. Aliás, alguns autores já consideram a hiperostose frontal interna como a terceira síndrome hiperpituitária do adulto. Para reforçar a argumentação a favor da teoria endócrina como causa da síndrome de Morgagni, citamos a interessante experiência de um cientista espanhol,que injetou extrato hipofisário com hormônio cetógeno em ratos e provocou a formação de lesões ósseas cranianas semelhantes às da hiperostose frontal interna;Além disso outros sinais clínicos fazem pensar numa interferência infundíbulo-hipofisária na origem dessa doença; neste mesmo sentido depõem as lesões encontradas pelo espanhol na parede do 3.° ventrículo.

Infelizmente o tratamento é meramente sintomático. Em certos casos graves, principalmente naqueles que se acompanham de repetidos ataques epilépticos ou quando ocorrem transtornos oculares por compressão, é recomendada a intervenção cirúrgica. A radioterapia profunda pode ser empregada com relativo êxito, assim como o tratamento antisifilítico nos casos em que haja indicação.

Alguns estudiosos dessa Sindrome sugerem a cálcio-ionoforese por via transóculo-ocipital e a administração de hormônio paratiroideo, mesmo nos casos com epilepsia. Nos casos de insuficiência hipofisária utiliza-se a hormonoterapia ovariana,já nas obesidades masculinizadas, sugerem o uso de hormônio tiroidiano e estrógenos em altas doses.

Prezados Leitores curtam um pouco essa curiosa patologia clínica e vejam como existem tantas doenças diferentes em torno de nossas vidas e que devem sofrer muito pelas dificuldade em fazer um tratamento minimamente resolutivo.

Boa Semana, Saúde e muita Paz…

MAKTUB!!!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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