Usina Nuclear em Sergipe

Na coluna de 17/02/2010, comentamos que o noticiário local dava conta de que o Governador do Estado de Sergipe reafirmara ao Ministro de Minas e Energia o interesse do Estado na instalação, em seu território, de uma usina nuclear.

 

Desde então, esse noticiário se intensificou, com ratificação (pelo Governo do Estado de Sergipe) desse pleito junto ao Ministério de Minas e Energia.

 

A novidade é que o debate em torno do tema já não desconsidera solenemente, como até então, a existência de um fator jurídico impeditivo, a priori, da concretização dessa meta governamental. É que, conforme apontamos, a Constituição do Estado de Sergipe proíbe expressa e peremptoriamente a construção de usinas nucleares em nosso território (Art. 232, § 8°):

 

Art. 232. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Estado, ao Município e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

(…)

§ 8° Ficam proibidos a construção de usinas nucleares e depósito de lixo atômico no território estadual, bem como o transporte de cargas radioativas, exceto quando destinadas a fins terapêuticos, técnicos e científicos, obedecidas as especificações de segurança. (grifou-se)

 

Com efeito, essa norma jurídica da Constituição Sergipana, apontada pelo advogado sergipano José Rollemberg Leite Neto (em sua série de artigos sobre os vinte anos da Constituição do Estado) como uma de suas passagens inovadoras e dignas de registro (in “Nesta data querida”, que pode ser lido em http://justoagora.zip.net/arch2009-10-04_2009-10-10.html), continua em vigor, produzindo integralmente seus efeitos jurídicos.

 

É verdade que a mencionada norma pode ser objeto de emenda à constituição, a fim de remover a apontada proibição. Mas, aí, haverá necessidade de iniciativa política nesse sentido e debate sobre o tema na Assembléia Legislativa, o que, em outras palavras, envolve discussão política séria com envolvimento de toda a sociedade sergipana (Há realmente interesse econômico na atração desse investimento? Qual a segurança desse tipo de empreendimento, levando-se em conta as possibilidades de acidentes ou desastres? O Estado possui estrutura de defesa civil e de saúde pública para atuação emergencial em caso de incidentes na usina nuclear? Os potenciais ganhos econômicos compensam os riscos eventualmente existentes? Há boas alternativas energéticas que tragam menos riscos à segurança da população?).

 

Por outro lado, houve quem apontasse a possível inconstitucionalidade da previsão do § 8° do Art. 232 da Carta Sergipana. É que, nessa linha de interpretação, haveria invasão da competência da União para cuidar da matéria, conforme preconiza a Constituição Federal em seus Arts. 21, inciso XXIII e 22, inciso XXVI[1]. Houve até mesmo a indicação de precedente do STF na matéria (ADI 329), embora esse precedente não se refira a uma situação inteiramente idêntica à de Sergipe.[2]

 

Ainda que possa haver plausibilidade jurídica nessa tese da inconstitucionalidade formal, por invasão da competência legislativa privativa da União para tratar da matéria, repita-se mais uma vez: a norma está em vigor, produzindo todos os seus efeitos jurídicos. O Governo do Estado possui dois caminhos para remover esse obstáculo à materialização de sua pretensão: a) propor a revogação da norma, mediante emenda à constituição do estado, a ser objeto de deliberação pela Assembléia Legislativa; ou b) propor, no STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de declaração formal de inconstitucionalidade do § 8° do Art. 232 da Constituição de Sergipe. Do contrário, estará praticando, livre e conscientemente, ato que atenta diretamente contra a Constituição do Estado.



[1] “Art. 21. Compete à União: (…) XXIII – explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza (…)”

“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (…) XXVI – atividades nucleares de qualquer natureza”.

[2] Naquele caso, o STF declarou inconstitucional norma da Constituição do Estado de Santa Catarina que subordinava a construção (no território daquele estado) de instalações industriais para a produção de energia nuclear à autorização da Assembléia Legislativa, ratificada por plebiscito. A norma da Constituição de Sergipe não condiciona a construção de usinas nucleares em nosso território à aprovação da Assembléia Legislativa. Ela simplesmente proíbe tal construção, independentemente de qualquer autorização que a Assembléia Legislativa queira da para tal construção.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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