“Olhar Brasil” promete mudar a cara do audiovisual em Aracaju

Aracaju soube no mês de abril que terá um dos núcleos do programa federal “Olhar Brasil”. O programa promete revolucionar a cena audiovisual nacional, tentando descentralizar a produção cinematográfica brasileira. À frente do projeto em Aracaju está a comunicadora Indira Amaral, atual primeira dama do município, que em entrevista ao Portal Infonet explica um pouco da realização do projeto e como serão as atividades. Indira é formada em Rádio/TV pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), tem especialização em edição de vídeo, e é diretora geral da revista de audiovisual ImagineSE, que chegou à sua terceira edição essa semana. Confira entrevista:

Portal Infonet – Como surgiu o projeto “Olhar Brasil” e de quem partiu a iniciativa pra implantação em Aracaju?

I
ndira Amaral – O projeto “Olhar Brasil” é um programa do Ministério da Cultura, através da Secretaria do Audiovisual. Faz parte de uma série de programas que essa secretaria vem fomentando, a exemplo do “Revelando Brasis” e do “DocTV”. É dentro dessa política de fomento à produção de audiovisual que foi feito esse programa, prevendo a instalação de 11 núcleos pelo país. Os lugares para abrigar os núcleos foram selecionados através de um edital público lançado em 2005. Então eu e Beto Matuque, produtor, tomamos conhecimento e elaboramos o nosso projeto, em parceria com a Funcaju. Fizemos a inscrição pra concorrer ao edital e fomos selecionados.

Infonet – Como você soube do edital?

IA – Eu estava numa reunião em Brasília, sobre o programa Ponto de Cultura, e nessa ocasião eu tive conhecimento do edital. O que me chamou a atenção foi um dos critérios principais do edital, que era a carência de instrumentos públicos para a produção do audiovisual na região. Nessa hora eu pensei, “ninguém mais carente nessa área do que Aracaju” (risos). Quando eu vi que nós preenchíamos todos os critérios, e esse, em especial, eu percebi que tínhamos condições de passar. O programa na verdade prevê uma lógica de descentralização da produção do audiovisual. Assim que eu voltei procurei a Funcaju e as entidades parceiras do projeto. Em dois meses o projeto estava todo pronto.

Infonet – Em que consiste o projeto?

IA – Inicialmente ele tinha uma avaliação da produção audiovisual local, um diagnóstico da produção no Estado, que era uma exigência do edital. E também uma proposta de apoio à produção independente e formação de profissionais. Para cumprir isso nós apresentamos uma proposta de cursos modulares e de cessão dos equipamentos para realização de produções locais. No edital estão especificados os recursos para a compra de equipamento e para os cursos de formação. Em contrapartida, os parceiros do projeto localmente entram com os recursos físicos, financeiros e humanos para a instalação do núcleo. O que viabilizou a aprovação do projeto foi a parceria com a prefeitura municipal, que hoje entra com essa infra-estrutura. Além de equipamento e recursos para os cursos, o Governo Federal também entra com o auxílio técnico, que vai ser do Centro Técnico de Audiovisual (CTAv) do Rio de janeiro. Estamos estudando também um convênio com a Cinemateca Nacional para disponibilização de acervo audiovisual.

Infonet –Como é a proposta do curso de formação?

IA – O curso de formação dura um ano e é dividido em quatro módulos, balanceando conhecimentos técnicos e teóricos. A idéia é que o estudante passe a se envolver em todas as especialidades da produção do audiovisual. Além disso, previmos parcerias e convidamos algumas entidades na formatação do projeto. Entraram aí a Casa Curta-SE, O Sindicato dos Jornalistas, o Centro de Cultura e Arte da UFS, a Associação dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos, a Secretaria de Comunicação do município, a Ong Missão Criança Aracaju e a TV Cidade. Esses são parceiros que vão ajudar na gestão no núcleo, como co-gestores junto com a Funcaju.

Infonet – Como vocês souberam da escolha?

IA – Nós recebemos uma carta avisando que tínhamos sido selecionados para o projeto, e também que Aracaju tinha sido escolhida para ser a cidade de lançamento do programa. Foi uma conquista e, ao mesmo tempo, uma responsabilidade muito grande. Aracaju seria a vitrine do programa para o país inteiro. E mais uma alegria foi a marca nacional do projeto, que é de um designer sergipano, o Mingau.

Infonet – Quais foram as principais medidas depois da aprovação?

IA – Essa é uma fase que ainda não está completa, por causa dos trâmites oficiais e burocráticos. Basicamente por causa da regularização dos documentos para a realização do convênio. Entregamos tudo em julho, mas não está totalmente fechado por conta do calendário eleitoral. A legislação prevê que o governo federal não pode repassar recursos para os municípios até seis meses antes das eleições. Por conta disso o convênio está nos últimos encaminhamentos pra que logo após as eleições nós finalizemos todos os processos. Agora nós estamos numa fase de produção das grades de funcionamento dos cursos e do núcleo. Queremos trazer o máximo que a gente tiver de experiência na área de cinema, tanto local quanto nacionalmente, pra que possamos ter acesso ao conteúdo prático e teórico produzido nos centros, onde há uma produção cinematográfica mais consistente. Então estamos numa fase de montar disciplinas e escolher professores. Sempre com critérios de excelência, ou seja, os melhores nomes possíveis para ministrar os cursos. No final de agosto devemos divulgar a grade do primeiro módulo.

Infonet – Para qual público está voltado o projeto?

IA – A partir da definição das grades do curso nós procuramos firmar o maior número de parcerias possíveis, para abranger um maior número de pessoas. Mas focamos os produtores locais, os estudantes de comunicação e os profissionais que já atuam no mercado. Tem um critério básico na seleção: ter no mínimo o Ensino Médio. Mas nós estamos discutindo com os membros do Conselho Gestor as participações de crianças, pra que possamos atender uma turma de jovens em situação de risco. A idéia é possibilitar a esse jovem a perspectiva de uma carreira profissional na área de produção audiovisual. É a possibilidade de conhecer e poder optar por isso. Daí a importância da parceria com a Ong Missão Criança. Como é um projeto que consome recursos públicos, achamos que deve ter um retorno social. Não só do ponto de vista do que a gente vai produzir, mas também de tratar da sociedade.

Infonet – E as outras parcerias?

IA – Nós estamos conversando com o Sindjor e a Asforc para oferecer cursos aos profissionais que já estão no mercado, promovendo uma atualização, reciclagem e agregação de conhecimento. Principalmente porque o audiovisual é uma cadeia. Você tem conhecimento técnico, que está sempre se atualizando, e o teórico que está sempre em debate. E nós temos uma faixa de jornalistas que podem, por exemplo, se especializar em crítica audiovisual e cinematográfica. A Casa Curta-SE também é uma grande parceira, que já trabalha com esse segmento, então podemos ter uma ajuda mútua. Com a TV Cidade nós temos o compromisso de divulgação do material produzido pelo núcleo. É uma veia importante porque abre o canal para um público grande. Nessa linha procuramos parcerias com outras TVs também. Com o Cultart é interessante o contato transversal com o mundo das artes, por que quando você fala em cinema, fala em artes plásticas, em literatura, em artes visuais. Na verdade, as parcerias obedecem a uma ordem de compartilhamento de conhecimento e gerenciamento em rede. Quer dizer, o núcleo vai ser resultado de todas as energias somadas. Então, nos cursos, nós oferecemos uma grade mínima e o resto vai ser de acordo com essas parcerias. Com vistas até em expandir as atividades. 

Infonet – Os cursos serão gratuitos?

IA – Os do núcleo sim. E os de parcerias a idéia é que também sejam. Nós queremos facilitar ao máximo o acesso a esse conteúdo. De antemão nós vamos buscar que todos os cursos sejam gratuitos.

Infonet – Quais são as suas perspectivas para implantação de um núcleo como esse em Aracaju?

IA – Eu acho que o núcleo vem suprir uma carência que a gente já vinha sentindo, mesmo através de realizações como o Curta-SE. O problema é que a gente vê poucos trabalhos sergipanos nas telas. Isso é resultado de uma falta de política de investimento na cultura, e particularmente no audiovisual, que é uma área cara. O que temos em Aracaju hoje são uma série de produtoras, relativamente bem equipadas, canais de TV muito bem equipados, cursos superiores de Comunicação em universidades particulares e na federal, mas não há produção. Tínhamos na década de 70 uma produção relativamente boa em 16mm e Super-8. Mas entre década de 90 e o início do século XXI quase não se ouviu falar em produção local. São pouquíssimos os que conseguiram, até heróicos. E mais iniciativas de difusão do que de produção. Nós nunca tivemos aqui uma produção de cinema. Diferente de Pernambuco e Paraíba, que tem longas. Até mesmo a Bahia nas décadas de 60 e 70. A Paraíba volta a uma cena muito forte hoje em dia. E eu acho que o núcleo é a ponta que faltava pra gente detonar um processo de expansão da produção em Sergipe. O pontapé que faltava pra gente realizar produções, com conhecimento técnico e teórico, pra agregar qualidade e minimizar as dificuldades em produzir. Além de incentivar as produções independentes, e de realizar parcerias, o núcleo vai funcionar com um Cineclube e uma DVDteca. Tudo isso é pra possibilitar que os estudantes possam conhecer e estudar Cinema.

Infonet –Quando você acha que a gente vai começar a sentir os resultados da implantação do núcleo?

IA – Já em 2007, quando um módulo do curso já vai estar concluído e estaremos com o equipamento e a estrutura funcionando. E é uma possibilidade também dos próprios produtores se juntarem. Estimular que outras iniciativas aconteçam. Temos de ter essa agitação em torno do audiovisual pra que ela cresça. Precisamos dessa efervescência!

Infonet – E você vê o audiovisual como inclusão social?

IA – Sim. A lógica da inclusão social é o reconhecimento do cidadão como parte integrante da sociedade. E você só se reconhece se você se vê. O audiovisual é essencialmente isso, uma forma que a gente tem de se mostrar e de se ver. É uma atividade essencialmente inclusiva. Precisamos, daqui há alguns três anos não só dizer “olha os pernambucanos na tela”. Precisamos ver o olhar sergipano. Nós estamos falando de inclusão social, e talvez pensemos somente no menino da periferia, a imagem ícone. Também é isso. Mas dentro da cena nacional do audiovisual nós não somos excluídos. Precisamos entrar no meio do processo. E hoje um dos principais vieses da inclusão social é a cultura, que possibilita que jovens que só tinham perspectivas marginais, sejam resgatados para um papel mais ativo na sociedade. O audiovisual é mais uma pontinha nesse movimento que já existe.

Infonet – Como você vê a cena sergipana atual?

IA – Acho que Sergipe tem uma vocação para a área de curtas. E isso se mostra em programas como o “Revelando Brasis” e o “Doctv”, que tem projetos sergipanos aprovados. Acho que a cena melhorou muito de uns anos pra cá, Mas ainda é uma cena incipiente. Nós ainda não temos referências estabelecidas, estamos em formação. Alguns trabalhos chamam atenção como o da Gabriela caldas, e o selecionado pelo DocTv. E essas pessoas que estão fazendo ainda são muito novas, estão encontrando a sua linguagem. O cinema brasileiro em geral é um cinema que ainda está crescendo, mas é diferente. Se você acompanhar festivais e ver filmes que tem oportunidade de circular, verá que os brasileiros sempre são bem premiados, como o recente “Cinemas, Aspirinas e Urubus”, de diretor e produtor pernambucanos.

Infonet – O que te incentivou a abraçar esse projeto?

IA – Eu sou formada em Rádio e TV pela UFS, e fiz especialização em Edição de Vídeo pela escola de Comunicação e Artes do Senac de São Paulo. Participei de várias entrevistas e da produção de dois documentários e alguns curtas aqui. Eu sempre tive muita paixão pelo fazer do audiovisual, e tive sempre muita atuação na área de cultura. Eu fui do Centro Acadêmico da UFS, e fui Secretária de Comunicação da UNE, na época que fundamos a Bienal Cultural. Então minha atuação sempre foi com comunicação e cultura.

Por Ben Hur Correia e Andreza Azevedo

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