A mídia brasileira e os Plebiscitos: uma reflexão

Desde a semana passada, os telejornais das principais emissoras de televisão do Brasil dedicam parte dos seus conteúdos de política internacional à divulgação do Plebiscito Popular que consultou, no domingo (9), a população da Catalunha sobre a independência da região. Uma edição da última sexta-feira de um telejornal da Record chegou a produzir uma reportagem de quase cinco minutos em que explicava a motivação da consulta pública, ressaltava o caráter popular do Plebiscito e detalhava as perguntas que constariam nas cédulas de votação. Um conteúdo apresentado de forma bastante didática, possibilitando ao telespectador brasileiro conhecer um pouco da longa e complexa história política e econômica que atravessa as relações entre catalães e espanhóis e discutindo o que significa um instrumento de participação direta – como o Plebiscito – numa sociedade democrática.

O interessante a observar (e questionar) é que o espaço que teve (e continua a ter) o Plebiscito catalão na programação da nossa TV nem de longe lembra a postura da mídia nacional com o Plebiscito Popular por uma Constituinte da Reforma Política, realizado entre 1 e 7 de setembro, aqui no Brasil. O Plebiscito sobre a independência da Catalunha foi popular, o brasileiro sobre a Constituinte da Reforma Política também. Do Plebiscito da Reforma Política participaram aproximadamente 7,5 milhões de pessoas, quase que a população total da Catalunha. Finalizado o Plebiscito Popular, a luta na Catalunha é pela realização de um Plebiscito oficial, assim como no Brasil. Porém, na tela das emissoras de TV brasileiras, enquanto um foi visibilizado, o outro foi ignorado.

E não por acaso. A mobilização popular que marcou até aqui a campanha do Plebiscito Constituinte – com o envolvimento direto de mais de 450 entidades e organizações da sociedade e formação de comitês em todos os estados – tem como motivação uma insatisfação não apenas com o sistema político, mas também com o sistema de comunicação do Brasil, afinal nem os espaços institucionais da política nem a programação do rádio e da TV representam a diversidade e o pluralismo do país. Tanto o sistema político quanto o conjunto dos meios de comunicação têm como característica histórica a ausência de participação social. Por isso, dar visibilidade a uma demanda por reforma política é dar espaço também a uma demanda por reforma da mídia, tudo o que não querem os concessionários de rádio e TV.

Falando em concessionários de rádio e televisão, um levantamento feito em 2012 revelou que, contrariando o artigo 54 da Constituição Federal de 1988, 271 políticos são, além de deputados, senadores, prefeitos, vereadores e governadores, também empresários da comunicação. Políticos-empresários que, ao longo da história, têm atuado no sentido de blindar tanto a mídia quanto as instituições do Estado da participação social, tendo como uma das estratégias a fabricação de discursos por meio de palavras de ordem que, sem o esclarecimento e aprofundamento necessários, servem apenas à interdição do debate público, como “censura” (quando o assunto é democratização da mídia) e “bolivarianismo” (quando o assunto é plebiscito ou reforma política). Aí fica tudo certo: os políticos radiodifusores não falam sobre democratização das comunicações e as suas emissoras de rádio e TV não pautam a reforma política.

É essa relação íntima entre sistema político e sistema de comunicação – que, cabe frisar, tem a propriedade de rádio e TV por políticos como apenas um dentre tantos aspectos – que nos faz entender porque a mesma mídia que aborda tanto o Plebiscito da Catalunha insiste em esconder o Plebiscito da Constituinte da Reforma Política.

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