A velha mídia ganha fôlego

O episódio que culminou com a demissão do ministro Antônio Palocci dá fôlego à chamada grande imprensa, que desde 1989 vem passando por um processo lento e gradual de desacreditação. A segunda queda do homem que foi figura central nos dois governos petistas – era ministro da Fazenda na primeira gestão Lula quando foi denunciado pelo caseiro Francenildo num escândalo com lobistas – acontece menos de um mês após a denúncia de enriquecimento ilícito.

No dia 15 de maio de 2011 a Folha de S. Paulo revelou que Palocci, então coordenador da campanha presidencial do PT e prestes a assumir o posto de ministro da Casa Civil, comprou um apartamento de luxo em São Paulo por R$ 6,6 milhões. E um ano antes ele adquirira um imóvel comercial no valor de R$ 882 mil. Uma fantástica evolução patrimonial de 2000% em relação aos bens declarados em 2006 à Justiça Eleitoral.

Os apartamentos foram comprados em nome de uma consultoria, aberta pelo deputado em 21 de julho de 2006, pouco depois de ter sido demitido do Ministério da Fazenda e quando estava em plena campanha para o cargo de deputado federal. Ambos os imóveis já foram totalmente quitados. O objeto da empresa havia sido alterado de consultoria para administração de imóveis (segundo o ex-ministro, para gerenciar justamente esses dois imóveis recém-adquiridos pela própria empresa) dois dias antes da posse de Palocci na Casa Civil.

Foi uma vitória parcial da velha imprensa, que nunca engoliu o fato de a esquerda ter chegado ao poder com um operário, que fez um grande trabalho, ganhou a aprovação maciça do brasileiro e se credenciou a fazer sua sucessora. Todos se lembram que na campanha eleitoral de 1989, a primeira eleição livre para presidente da República após o longo e tenebroso inverno ditatorial de 21 anos, a Globo e a Veja criaram o mito do caçador de marajás, fazendo de tudo para destruir a reputação de Lula e, inversamente, exibir o playboy Fernando Collor como salvador da pátria. A edição do Jornal Nacional do debate no segundo turno é histórica.

E o serviço dos parciais jornalistas da velha imprensa foi facilitado algumas vezes, como no primeiro quadriênio de Lula, quando um grupo de aloprados petistas serviu de bandeja à sanha midiática o escândalo do mensalão. Ou "Esquema de compra de votos de parlamentares", nome dado à maior crise política sofrida pelo governo do presidente-operário. O neologismo mensalão, popularizado pelo então deputado federal Roberto Jefferson em entrevista que deu ressonância nacional ao escândalo, é uma variante da palavra "mensalidade" usada para se referir a uma suposta "mesada" paga a deputados para votarem a favor de projetos de interesse do Poder Executivo.

O mensalão foi o primeiro momento crítico da relação muitas vezes nada republicana entre a velha imprensa e o governo do PT. No segundo mandato, Lula navegou em águas mais tranquilas, atingiu uma popularidade nunca antes vista na história deste País e acertadamente indicou para sucedê-lo a ministra Dilma Rousseff, uma neófita nas urnas. Aí deu-se o segundo instante crítico da relação imprensa/poder.

A velha mídia voltou à sua sanha habitual, revelando como poucas vezes – e com nenhuma habilidade – que sua razão de ser está em servir à direita conservadora. Como muitos dos que a compõem fizeram no período ditatorial militar, quando a Folha de S. Paulo, por exemplo, emprestou carros do jornal para servirem à repressão. Mais recentemente, como para atenuar a própria culpa, o jornalão paulista da família Mesquita publicou um editorial afirmando que a ditadura brasileira foi tão amena que não passou de uma “ditabranda”. Tenha paciência!

Pois na eleição de Dilma, o episódio mais bisonho alimentado pela velha imprensa foi a suposta agressão sofrida pelo candidato demo-tucano José Serra, atingido por uma bolinha de papel. A Globo dedicou um bloco inteiro do seu sempre utilíssimo Jornal Nacional para provar que o objeto atirado no candidato numa visita ao subúrbio do Rio era pesado o suficiente para provocar um hematoma que o levaria ao hospital, o que de fato aconteceu, 20 minutos depois, completando toda a encenação daquele dia de campanha. E quem estava lá para analisar as imagens e comprovar a gravidade da agressão? O indefectível perito Ricardo Molina – tão desacreditado quanto o próprio candidato e que foi demitido da Unicamp em 2001, por “irregularidades administrativas”.

Mas aí veio o caso Palocci 2, que obnubilou um factóide que a velha imprensa tem tentado fazer cair no gosto popular. Desde que a presidenta Dilma adquiriu uma pneumonia que se tenta passar à opinião pública que a saúde dela é tão frágil que não teria condições físicas para dirigir os destinos do Brasil. A revista Época, da família Marinho, chegou ao ápice do agouro com a última edição de maio, que traz uma capa mórbida, exibindo foto de Dilma com os olhos levemente cerrados, sobre fundo preto, com a sentença condenatória: “Exclusivo – A saúde de Dilma”.

A reportagem tenta justificar o que vem no índice, “A saúde frágil de Dilma Rousseff”, mas os exageros são evidentes até para um aluno do ensino fundamental e não provam nada, além do fato de que não é anormal que uma mulher de 63 anos tenha diabetes, devidamente controlada, e tome medicamentos para hipotireoidismo. A revista escandaliza afirmando que “ha duas semanas, Dilma tomava 28 remédios”.

E relaciona – além dos medicamentos para diabetes e tireóide, e os antibióticos que tomou para curar a pneumonia – remédios poderosíssimos, como um para acidez no estômago, um analgésico comum,  um inalador, óleo de linhaça e curcumina, que são remédios naturais indicados para emagrecer, um antioxidade, um suplemento de fibras e cápsula de cartilagem de tubarão. Ou seja, o “coquetel de remédios” apresetado pela revista Época como algo muito grave, não passa de uma piada de mau gosto.

Mais uma pegadinha da velha imprensa brasileira, que acaba de ganhar fôlego graças ao ministro petista que ficou rico com tráfico de incluência. O episódio pelo menos serviu para mostrar a força da mulher. A presidenta decidiu solitariamente e discretamente demitiu o amigo e importante auxiliar, debalando a crise.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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