Das Greves e do Corretivo Liberal

O palavrão “Black Bestas” não é meu. Vi-o no artigo “Copa sem culpa” de Rodrigo Gentile, Folha de São Paulo (5/6) que ali já se encontra com aspas.

Nominado jocoso e brando, enquanto cognome preciso, concede aos Black Blocs uma concisão irônica a tantos broncos e tolos, aí amontoados os eternos fracassados, os despreparados de tudo, os rotineiramente reprovados nos bancos escolares e outros certames da vida, que à parte excedente desclassificação científica, funcional e produtiva tem sido louvados e decantados pela grande imprensa nacional, que resiste em lhes retratar com tintas precisas o que de fato representam: a versão mais bronca da vanguarda do atraso, perigosamente renascida.

Dito assim parece que me anima um julgamento hostil ao romantismo dos jovens que sonham com um mundo melhor, afinal por consequência de uma paz duradoura em democracia plena, os moços se acham insatisfeitos com tudo, da educação risonha e franca, idílio da preguiça e da ojeriza aos livros, à saúde de qualidade, se possível sem médicos especialistas, nem mestres qualificados.

Porque longe de louvar e procurar o estudo e a qualificação, o grito na passeata prefere substituir o médico especialista pelo paramédico grevista, o decente professor pelo assaz negligente (des)educador, achando que é possível adquirir qualidade sem esforço de capacitação, usando um atalho oportunista em reinvindicação sindical e decisão por assembleia da própria categoria corporativa.

E quando tais categorias decidem, o aprovado por voto de simples maioria assume importância superior a qualquer missão ditada por gaia ciência, excelência filosófica ou racionalidade euclidiana, afinal nem Eratóstenes, Pitágoras, Jacobi ou Boole, no ábaco, na ponta do lápis ou no computador de mais recente velocidade e precisão conseguiriam calcular em melhor exatidão o reajuste salarial realmente merecido.

Porque o reajuste merecido, como a honra e a honestidade preceituam, deveria advir com o ócio (des)criativo devidamente abatido e financeiramente descontado, para todos os efeitos funcionais.

Infelizmente, nestes tempos de rara responsabilidade econômico-financeira não existe nenhum governante processado ou mesmo indiciado por má gestão dos recursos públicos porque remunerou tantos grevistas em proliferação patogênica, com estabilidade assegurada.

Eis assim o Estado cada vez mais doente: na saúde, na educação, na segurança; tudo o que bem se deseja e se promete a cada eleição.

Ou seja, a estabilidade no serviço público não pode conviver com o direito de greve ilimitado como tem sido condescendência de todas as siglas partidárias que empalmam a coisa pública.

E a coisa está assumindo patamares impensáveis de anarquia com greves inclusive de setores essenciais como brigadas policiais, transportes essenciais, perícias e necropsias, agentes de carceragens, só faltando por hora, pelo menos não houve ainda uma paralização de coveiro.

Se eu estou pessimista ao contemplar o entorno cenário, que dizer da decisão tomada há quase dez dias do Superior Tribunal de Justiça considerando abusiva a greve de professores e servidores das nossas Universidades Federais, decisão que sempre cabe recurso em maior apelo rebarbar, sem desvelo, nem despelo, por invocação constitucional?

E por que não outras protelações hipócritas, um recurso procrastinatório à corte interamericana de São José de Costa Rica, por exemplo?

Quem o sabe nesta terra de tantos “Black Bestas”, proliferando como amebas, em desafio a Avicena, Galeno, e Averróis, a Kant, Galileu, Espinosa e outros sóis, em rejeito de mal feito, veneno, quebranto e hipocrisia?

Black Blocs protestando em passeata e no grito do piquete, arrasando tudo, querendo só afagos da polícia, denunciando a picaretagem do bom esculápio, que ouse cumprir sua missão ditada por jura de Hipócrates, hoje mais um hipócrita vaiado pelas palavras de ordem vazias das desembestadas categorias, unidas como tropel de bestas.

Bestas e Black bestas que estão a requerer a coragem de quem lhes organize o agir a vergastes de mangual.

É aí que me vem à mente um velho artigo que escrevi no Jornal de Sergipe, mais precisamente em 29 de setembro de 1989, bodas de prata a completar, justamente quando o Direito de Greve era neonatal em 1º aniversário, enquanto ingênua conquista pétrea da “Constituição Cidadã”, que se constituiu na melhor pedrada assestada no povo e somente contra o povo pelas corporações sempre distanciadas do povo, por encasteladas no serviço público.

Naquele artigo, com título “Faz Greve quem tem Competência”, eu reclamava dos três meses de greve na nossa Universidade Federal de Sergipe, paralização que começou com professores, depois por funcionários, e na prática prosseguia porque os gestores universitários estavam inertes e indecisos sem saber como proceder para remendar o ano letivo violado, afinal o Diretório Central dos Estudantes (DCE) não queria o retorno das aulas, igual à Associação de Docentes (ADUFS), hoje tudo documentado em exemplo de real bagunça e irresponsabilidade, inserido e aprovado nos anais do Conselho do Ensino e da Pesquisa (CONEP), que decidira por idêntica patuscada.

Uma anarquia que só terminou porque um abaixo-assinado por outros estudantes ( há sempre aqueles que gostam de estudar) recorreu que outro Conselho, o Conselho Universitário, o CONSU, derrubasse o despautério anárquico do CONEP, ordem que foi inserida, com o meu voto indutor, inclusive, sendo imediatamente iniciadas as aulas.

Mas, dizia eu naquele momento (páginas 111 a 113 de meu livro “Despercebido,… mas não Indiferente”) que aos professores caberia o ônus da paralização com a perda das férias no comum recesso de verão. E isso seria fatal para novas greves, afinal por obrigação de ministrar as aulas não dadas, o ônus só atingiria os mestres sem arranhar sequer qualquer desconforto aos servidores.

Lamentavelmente, e aí cabe um parêntese, porque muitos falam em pesquisa, ensino e extensão, mas só o professor é o responsável exclusivo pela sua real qualidade. O funcionário tem outra tarefa, digna como todas, até a mais humilde, mas não tão nobre como a do docente, porque não é sua a responsabilidade na formação dos jovens.

Daí o parêntese introduzido porque sempre denunciei a auto-emasculação da docência nas nossas Universidades com os professores se intitulando “trabalhadores da educação”; um mero desfazimento ético, em pose de humilde dissimulação por farsa igualitária.

Igualitarismos à parte, a greve que pensei ser primeira e última, de lá para cá vem acontecendo todo ano, sem mudança, por vinte e cinco anos.

E ano a ano, tem sido um desafio a todos os Presidentes: Sarney, Collor, Itamar, FHC, duas vezes, Lula, duas vezes também, e até Dilma, em véspera de reeleição. De lá para cá, quando deve estar em recesso de aulas, Julho, Janeiro e Fevereiro, a Universidade sempre está recompondo os conteúdos pedagógicos não ministrados, às vezes ao atropelo e sem maior zelo, inviabilizando cursos especiais de verão, com o ano letivo deslocado do civil.

Sem falar que mais das vezes alguns professores usam outros procedimentos para a conclusão programática, utilizando-se de expedientes de estudos orientados, para reduzir-lhes as horas-aula a ministrar, preservadas as férias trabalhistas, tudo em desserviço à formação dos jovens.

Agora, o Governo Federal ousou, vejam que terrível! E o terrível está aqui consignado porque a greve na Universidade sempre fora estimulada pelo nascente Partido dos Trabalhadores, aquele que mais denunciava nos piquetes o resquício autoritário recente.

Pois bem! O PT no governo está tomando juízo; ousou pedir ao STJ e conseguiu a decretação da abusividade da greve das Universidades Federais, baseando-se num acordo mantido com a “categoria” em 2012, combinação que segundo um dos sindicatos não contara com a sua aprovação, e para tanto já está requerendo derrubar a liminar, numa promessa que será longo o litígio.

Ou seja, a greve nas Universidades públicas e no serviço público em geral continua um desafio à hombridade dos homens.

Também, que emprego permite remunerar anualmente, uma paralização por três meses por greve, mais um mês de férias funcionais intocáveis, recesso escolar entre períodos letivos, cinco a seis meses de descanso no ano civil?

Por acaso o trabalhador frui tal beneficio, algo que no mínimo representa um aumento indireto de 17/12 na remuneração anual?

Infelizmente é isso o que acontece com os sindicatos rugindo e soltando fogo como dragão de maldades: “Somos muitos, somos fortes!” Um reconhecimento de própria fraqueza, afinal querem a nossa solidariedade enquanto sociedade.

Numa democracia, ora bola, é preciso dizer que o império é da lei, jamais das corporações, por mais que se ousem como feras indomáveis.

O que estamos a viver é muita tibieza dos nossos homens públicos que vivem se agachando em diarreia sem ferir a pústula que gangrena a coisa pública.

Um dia, sei lá Deus quando? O bom senso irá reinar e a punição ameaçada hoje pelo STJ de conferir multa aos sindicatos grevistas deixará de ser uma inútil perfumaria.

Dia virá que um governante dotado de verdadeira coragem cívica ousará lancetar este tumor mediante receita firme liberal, tudo aquilo que bem anima as instituições que tem dono e regra: basta descontar o salário dos faltosos, demitir os arruaceiros e sua liderança piqueteira, e apresentar aos insatisfeitos a porta da rua como melhor serventia da casa.

Mas, enquanto isso não vem, o povo continuará como massa de manobra de Black Blocs ou “Black Bestas”, comendo quiabo cru, ou tomando suco de caju, e “a elite branca”, que não usa, nem precisa dos serviços públicos, mandando presidente ou presidenta tomar papa de mandacaru.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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