O homem e sua circunstância

"O homem é o homem e a sua circunstância". Independentemente do conhecimento sobre a importância de Ortega y Gasset na formação humanística e política de Marcelo Déda é difícil não identificar o quanto a máxima se adéqua à condição ora vivida pelo governante sergipano. Segundo o filósofo espanhol, é impossível considerar o ser humano como sujeito ativo sem levar em conta simultaneamente tudo o que o circunda, a começar pelo próprio corpo até o contexto histórico em que está inserido.

Pública e privativamente, Déda tem buscado forças onde parecia não possuir para mostrar capacidade de se adaptar às adversas circunstâncias financeiras, políticas e fisiológicas do momento e se impor à fase negativa para assegurar a sobrevivência do legado que soube como poucos construir em relativamente tão parcos anos de vida política. Mas a questão não é de simples adaptação camaleônica e nem se restringe ao plano pessoal.

Reconhecidamente influenciado por Antonio Gramsci, o governador é ciente da importância do líder para os seus liderados – o marxista italiano diz que o proletariado necessita de organização e esta não existe sem intelectuais. Guardadas as diferenças históricas, é isso. Na adversidade, Déda age como o líder que é.

Na semana passada, o governador interrompeu por duas vezes a sua mais do que necessária convalescença para reassumir o posto de comando de uma batalha importante para os destinos do Estado, do seu governo e do seu projeto político: a aprovação de um aporte financeiro de R$ 727 milhões fruto de um programa que o governo federal coloca à disposição dos Estados, financeiramente responsáveis, visando a ampliação da capacidade de investimentos do setor público das unidades federativas. Ou seja, ajudá-los a crescer.

Para afinar o discurso, primeiro ele se reuniu com o vice-governador Jackson Barreto e secretários e também com deputados estaduais aliados. Alguém diria que foi no conforto do Palácio de Veraneio, não fosse um incômodo para quem se encontra nesse estado de saúde, bombardeando um câncer com quimioterapia num hospital distante.

Dois dias depois, Marcelo Déda cumpriria esforço físico e de concentração maior, de sair do seu apartamento e se dirigir a um estúdio de rádio para, durante duas horas, pregar com suas autorizadas palavras a defesa do tal projeto. Apelou para os adversários e sensibilizou quando buscou mostrar ao povo de Sergipe que está gravemente enfermo, mas continua tendo no bem-estar do sergipano a sua maior preocupação. E o fez com humildade.

“O Estado é do povo. O que peço é que não me tirem o direito de trabalhar para o meu povo, de ir buscar dinheiro para o meu Estado”, afirmou, apelando: “Quero fazer um convite a três personalidades que poderão disputar a eleição para o governo em 2014. Quero pedir autorização a Jackson Barreto, a Eduardo Amorim e a João Alves para que eu possa telefonar para a presidenta Dilma Rousseff e marcar uma audiência no gabinete dela, em Brasília, para que os líderes do governo e da oposição sergipana entreguem o protejo aprovado. E que nós todos digamos à presidenta que Sergipe briga na eleição, mas sabe unir seus líderes pelo futuro e desenvolvimento de Sergipe”.

Diante da circunstância só Marcelo Déda poderia falar o que precisava ser tornado público, por mais que outros tenham se antecipado e apresentado explicações. Conhecendo-o e o reconhecendo, o povo não queria incomodar, mas exigia a explicação do líder que venceu seis eleições seguidas desde 1994, inclusive duas vezes para a Prefeitura de Aracaju e duas para o governo do Estado – derrotando sempre no primeiro turno o mesmo João Alves que voltou a vencer agora, renascido que foi pelo resultado favorável na capital dois anos atrás, quando o demista e seu grupo viram que era possível ganhar em Aracaju.

Enquanto Sergipe permanece um dos três estados – dentre 17 que podem buscar o financiamento –, onde a Assembleia Legislativa ainda não autorizou a contratação do empréstimo, o BNDES já aprovou seis operações de financiamento no Programa de Apoio ao Investimento dos Estados e Distrito Federal (Proinveste). Santa Catarina, Maranhão, Minas Gerais, São Paulo, Ceará e Tocantins já receberão os investimentos, nenhum deles inferior a R$ 250 milhões.

Anunciado pela presidenta Dilma Rousseff e regulamentado por resolução do Conselho Monetário Nacional em 5 de julho último, o Proinveste conta com dotação orçamentária total de R$ 20 bilhões e prazo de vigência até 31 de janeiro de 2013, data limite para a contratação dos financiamentos.

Os setores produtivos perceberam que Sergipe não pode ficar de fora dessa ciranda virtuosa. Nesta terça-feira, o governador em exercício, Jackson Barreto, reuniu-se com os representantes do PIB sergipano para reforçar o quanto o investimento é importante para quem gera riqueza. “É imprescindível que os empresários tomem conhecimento da grandeza deste programa, da importância da sua aplicação neste momento e, acima de tudo, da sua viabilidade diante da situação econômica que vivenciamos, já que vai gerar empregos, renda, impulso econômico, atingir objetivos na área social e oferecer mais qualidade de vida à população sergipana. Por isso é que enfatizamos que Sergipe não pode perder esta oportunidade”, rogou.

O presidente da Federação das Indústrias (Fies), Eduardo Prado de Oliveira, reconhece que o aumento da capacidade de investimento dos estados do Nordeste “é uma demanda legítima, pois todos carecem de maiores investimentos em áreas como educação, saúde, segurança pública, saneamento e transporte”.

Cobrando responsabilidade dos homens públicos, mas crente de que o Estado tem condições técnicas para captar recursos para novos investimentos, “especialmente em despesas de capital”, Eduardo Prado compreende que o Proinveste é uma alternativa encontrada pelo Governo Federal para apoiar a continuidade do desenvolvimento dos estados, “sem a sua ingerência direta, permitindo que analisem suas necessidades e façam as mais corretas aplicações”.

“Como atuamos na construção civil, que é um dos segmentos mais atingidos quando há crescimento econômico, acreditamos que esse impulso trará benefícios significativos na geração de empregos, aumento de renda e, consequentemente, maior demanda por imóveis, promovendo um aquecimento no setor”, opinou o empresário Luciano Barreto, presidente da Associação Sergipana de Obras Públicas e Privadas (Aseopp).

“Tenho certeza que a grande maioria dos empresários sergipanos ficou convicta dos benefícios que esse programa trará para o nosso estado”, resumiu Gilson Figueiredo, coordenador do Fórum Empresarial e presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Sergipe (FCDL).

O apelo do governador foi bem absorvido porque necessitava ser invocado nesse momento, a despeito de toda adversidade. A circunstância define a grandeza do político.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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