MUSIQUALIDADE, por Rubens Lisboa

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Cantora: ROBERTA SÁ

CD: “PRA SE TER ALEGRIA”

Gravadora: MP,B / UNIVERSAL

 

Roberta Sá, sem sombra de dúvida a cantora que mais deu certo dentro desse imenso universo fonográfico nacional nos últimos cinco anos, nasceu bem longe do eixo Rio-São Paulo. Natural de Natal (RN), mudou-se para as terras cariocas aos nove anos, tendo subido em um palco, pela primeira vez, sete anos após, interpretando a canção “Qualquer Coisa”, de Caetano Veloso. Depois de passar uma temporada de dez meses nos Estados Unidos, voltou ao Brasil e, já infectada definitivamente pelo vírus da música, matriculou-se no curso de canto da renomada professora Vera Maria do Canto e Melo. Aos vinte anos, passou no teste para a segunda edição do programinha global “Fama”. Em seguida, com muita coragem, gravou uma demo com cinco músicas e enviou-a para várias gravadoras. Uma cópia, no entanto, fez questão de deixar na portaria do prédio do novelista Gilberto Braga. A gravadora Som Livre, a pedido dele, dias depois, ligou para Roberta encomendando a gravação de “A Vizinha do Lado” (de Dorival Caymmi), a qual foi incluída na trilha sonora da telenovela “Celebridade”. Ato contínuo, com a intervenção da também cantora Fernanda Abreu, ela assinou contrato com a gravadora MP,B e o resto da história todo mundo conhece: lançou, em 2004, o ótimo CD “Braseiro” que foi muito bem recebido pela crítica, fazendo despertar a curiosidade geral em torno de seu nome, e dois anos após, em 2007, o aclamado “Que Belo Estranho Dia Pra Se Ter Alegria”, um dos álbuns mais vendidos daquele ano.

Impulsionada, pois, por um mercado ávido em ganhar dinheiro, Roberta acaba de sucumbir à proposta de lançar o seu primeiro DVD. Assim, no dia 3 de abril deste ano, na casa de espetáculos Vivo Rio (RJ), a cantora realizou um show que, devidamente registrado, acaba de chegar às lojas também em formato CD sob o título “Pra Se Ter Alegria – Ao Vivo no Rio”.

Roberta é cantora pronta. Merece todo o sucesso que vem fazendo, muito por ter os pés no chão, não tendo se deslumbrado com a fama imediata. Mas o seu talento inato também se faz incontestável, tanto para cantar (possui uma voz belíssima, de timbre aveludado e afinado) quanto para escolher as músicas que inclui no seu repertório. O fato, contudo, é que ainda não era a hora de ela se meter em um registro ao vivo. Não que o resultado não tenha ficado legal, nada disso… A questão é que, com apenas dois discos de carreira, fica mesmo muito difícil ousar. E isso fica claro quando se observa que, das quatorze faixas do recém-lançado álbum, apenas duas soam inéditas em sua voz: as medianas “Agora Sim” (dela em parceria com Carlos Rennó e o maridão Pedro Luís, presente nos vocais da contagiante “Girando na Renda”) e “Samba do Balanço” (de Machadinho, que conta com a participação especial de Marcelo D2). As demais surgem em arranjos bem parecidos com os já por ela anteriormente gravados (destaque para a obra-prima “Samba de Um Minuto”, de Rodrigo Maranhão, a deliciosa “Áh, Se Eu Vou” de Lula Queiroga, e a suave “Novo Amor”, de Edu Krieger), com a diferença de que, em alguns momentos, programações eletrônicas e barulhinhos bons pipocam aqui e ali. A sensação, assim, é infelizmente de “mais do mesmo”.

Talvez ciente disso é que Roberta entrou em estúdio e gravou mais quatro músicas, as quais o ouvinte poderá baixá-las da internet. São elas: “Mambembe” (com Chico Buarque), “Peito Vazio” (com Ney Matogrosso e Trio Madeira Brasil), “Eu Já Não Sei” (com o cantor português António Zambujo) e “Modinha” (com o violonista Yamandu Costa) – nenhum dos registros, contudo, chega a impressionar.

Trata-se, enfim, de um trabalho eminentemente para os fãs mais aficcionados e que tem por mérito registrar o momento de crescente (e merecida) popularidade de Roberta Sá. Sigamos!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantora: FLÁVIA BITTENCOURT

CD: “TODO DOMINGOS”

Gravadora: INDEPENDENTE

 

Maranhense, a cantora Flávia Bittencourt ganhou dos pais como presente de Natal, aos cinco anos, um piano branco, instrumento que a apresentou ao mundo mágico da música. Alguns anos mais tarde, mas ainda em São Luís, ela iniciou suas aulas de canto e teoria musical, o que a fez compor, em 1996, sua primeira música que se intitulou “Maria, Marista” e, concorrendo em uma gincana estudantil, terminou por obter o primeiro lugar. Dois anos depois, ela começou a cantar na noite e, paralelamente, passou a se interessar mais profundamente pelos ritmos maranhenses característicos.

Mas foi 1999 o ano que marcou definitivamente a carreira de Flávia: apresentou-se em um show juntamente com Geraldo Azevedo, realizou em seguida o seu primeiro espetáculo solo e, movida pela receptividade obtida, resolveu se mudar para São Paulo, não sem antes trancar a Faculdade de Farmácia que até então ainda cursava. Foi em Sampa que, de fato, as primeiras oportunidades concretas começaram a surgir, tanto que ali passou a realizar shows de abertura para apresentações de Alcione, Adriana Calcanhotto e Zeca Baleiro.

Contudo, foi somente em 2005 que ela lançou o seu primeiro CD. Intitulado “Sentido”, o álbum recebeu indicação para o Grammy Latino e foi selecionado para o Prêmio TIM de Música. Daquele eclético repertório constavam composições de César Teixeira, Chico Maranhão e Josias Sobrinho, entre outros.

Com o pontapé inicial dado de maneira bastante positiva, Flávia precisava sedimentar o seu nome no panteão da música nacional e, ciente disso, decidiu por gravar um segundo trabalho, o qual acaba de chegar às lojas de maneira independente. Trata-se de “Todo Domingos”, disco dedicado à obra do compositor Dominguinhos. Contendo treze faixas, todas compostas pelo sanfoneiro ao lado de parceiros como Gilberto Gil, Anastácia, Manduka, Toinho, Guadalupe e Djavan (a exceção é a canção “Seu Domingos”, de autoria da própria Flávia), o CD mostra uma cantora segura, não obstante a decisão de, logo num segundo trabalho, mergulhar no cancioneiro de um artista único, parecer precipitada: estava no momento era de Flávia abraçar temas novos para ter um repertório próprio.

Mas não há como deixar de reconhecer que o resultado do tributo soa acima da média. As canções escolhidas para compor o recém-lançado trabalho mesclam, sabiamente, grandes sucessos (como “Eu Só Quero um Xodó”, “Tenho Sede” e “Abri a Porta”) com alguns ótimos lados B (a exemplo de “Contrato de Separação”, “São João Bonito” e “Diz Amiga”, faixa que conta com a participação especial do homenageado). E Flávia mostra-se uma intérprete com recursos vocais consideráveis, conforme se pode comprovar através da complexa “Arrebol”. E também é fato que músicas como a deliciosa “Sete Meninas”, a bonita “Retrato da Vida” e a pungente “Lamento Sertanejo” ganham novas e inspiradas tintas na sua voz. Completam o set list a bonita toada “Quem Me Levará Sou Eu” e a suingante “O Babulina” (tema em que Dominguinhos homenageia o colega Jorge Ben Jor).

Flávia Bittencourt é promessa que tem tudo para se consolidar como um nome de respeito entre as nossas vozes femininas. Quem viver, verá!

 

 

N O V I D A D E S

 

 

·                     Na próxima semana, Maria Bethânia lançará seus dois novos CD’s. Um deles (“Tua”) será voltado para os temas ligados ao coração; o outro (“Encanteria”) remeterá ao aspecto sincrético-religioso que a cantora tão bem conhece. Em tempo: a canção que deu título ao segundo dos citados álbuns foi gravada originalmente por Gloria Bomfim, ialorixá que em 2007 lançou o CD “Santo e Orixá”, totalmente composto por canções de autoria de Paulo César Pinheiro.

 

·                     E o selo Discobertas do pesquisador musical Marcelo Fróes acaba de pôr nas lojas mais um produto dentro da série “Letra & Música” que tem como objetivo homenagear grandes compositores nacionais e internacionais. Desta feita é a vez de Zé Ramalho que ganha uma compilação de sua obra autoral nas vozes de artistas que surgiram na mesma época que ele, tais como Alceu Valença (“A Dança das Borboletas”), Geraldo Azevedo (“Táxi Lunar”) e Fagner (“Eternas Ondas”). Mas são as cantoras Amelinha e Elba Ramalho que ficam responsáveis pela maior quantidade dos fonogramas escolhidos. Enquanto a primeira, sua ex-mulher, mostra os grandes sucessos “Frevo Mulher” e “Mulher Nova, Bonita e Carinhosa Faz o Homem Gemer Sem Sentir Dor”, além de “Galope Rasante” e “Lua Semente”, a prima paraibana de Zé desfia canções como “Banquete dos Signos”, “Ave de Prata” e “Chão de Giz”. As curiosidades ficam por conta das insuspeitadas versões de Vanusa e Cássia Eller para os clássicos “Avôhai” e “Admirável Gado Novo”, respectivamente. Completa a seleção a gravação de Teca Calazans para a pouco conhecida “Desejo de Mouro”.

 

·                     A produção do novo CD que Milton Nascimento já está gravando será assinada por Wagner Tiso e por Marco Elizeo, jovem músico de Três Pontas (MG). O repertório incluirá músicas inéditas do próprio Milton, além de criações de compositores novos e daqueles associados ao Clube da Esquina.

 

·                     Em breve nas lojas, a trilha sonora da ótima telenovela global “Viver a Vida” será certamente alavancada pela faixa “A Mulher que Eu Amo”, inédita canção de Roberto Carlos. Também fazem parte do CD temas gravados por Gal Costa (“Mar e Sol”), Tânia Mara (“Gostava Tanto de Você”), Ana Canãs (“Esconderijo”), Simone (“Migalhas”) e Maria Gadú (“Shimbalaiê”).

 

·                     Da Ghama, guitarrista que integrou, durante anos, a banda Cidade Negra, acaba de lançar, de maneira independente, o seu primeiro CD solo (intitulado “Violas e Canções”), aventurando-se também como cantor. De recursos vocais limitados e apoiado por backings, o artista apresenta quatorze faixas, a maioria calcada no reggae (destas se destacam “Tesouro Perdido” e “Um Só Coração”). Não é um trabalho ambicioso e o resultado soa aquém do esperado, tanto que os melhores momentos ficam por conta das regravações das batidíssimas “Na Rua, Na Rua, Na Fazenda” (de Hyldon) e “Não Chores Mais” (de Vincent Ford na versão de Gilberto Gil). Da Ghama assina a produção do disco e apresenta parcerias com Marcos Valle, Bernardo Vilhena, Liah e George Israel, entre outros. Fora da área do reggae, aparecem “Ciranda” (na verdade, um samba que traz Arlindo Cruz como convidado), “Amor Matador” (tema latino-cigano de autoria de Alexandre Lima e Amaro Lima) e “Cair em Si” (canção menos inspirada da lavra de Djavan).

 

·                     E enquanto ainda divulga o show relativo ao seu CD “Inclassificáveis”, Ney Matogrosso já informa que chegará às lojas, no próximo mês, mais um CD seu. Trata-se do quase acústico “Beijo Bandido” que trará entre outras, no repertório, as canções “A Bela e a Fera” (de Chico Buarque e Edu Lobo), “Invento” (de Vitor Ramil) e “A Cor do Desejo” (de Júnior Almeida e Ricardo Guima).

 

·                     O ano de 1977 foi especial para o então jovem e emergente cantor Emílio Santiago. Pela primeira vez, ele conhecia o sabor do reconhecimento popular com o sucesso da canção “Nega” (de Vevé Calazans), integrante de seu disco “Comigo É Assim”, e concomitantemente lançava também o álbum “Feito para Ouvir’”, um dos melhores (mas também menos conhecidos) de sua extensa discografia. É este belo trabalho que acaba de chegar às lojas, pela primeira vez em formato CD, através do selo Dubas. Com arranjos a cargo do pianista Laércio de Freitas, Emílio mostra que a sua voz de timbre único já, àquela época, se encontrava pronta, tanto que desfia com sinceridade comovente canções de complexas tessituras melódicas como “Beijo Partido” (de Toninho Horta) e “Olha Maria” (de Tom Jobim, Chico Buarque e Vinicius de Moraes). Outros grandes momentos ficam por conta de “Última Forma” (de Baden Powell e Paulo César Pinheiro), “Mentiras” (de João Donato e Lysias Ênio) e “Maria” (de Gilberto Gil), a qual teve como musa inspiradora a cantora Maria Bethânia.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


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