Café Pequeno-“Rosebud”

Outro dia fiz todo mundo morrer de rir quando, numa tradicional rodada de caranguejo na Atalaia, declarei que o meu maior  sonho era ter um galinheiro.

 

O tom solene e ingênuo  da  declaração causou espanto. Acredito que esperavam de mim algo mais grandioso.

 

Mas, polêmicas à parte, existem certas recordações infantis que jamais se apagarão, e o quintal de vovó Maria é uma delas.

 

Vovó Maria, avó paterna de meu pai, era uma mulher do mato, nascida e criada nas brenhas da Samba do Riachão do Dantas.

 

Quando papai ficou melhor de vida construiu, para ela, uma casa vizinha a nossa, e a trouxe para viver conosco.

 

A casa toda em mosaicos tinha dois quartos, um pequeno pátio interno e um banheiro, com banheira, que não passava de enfeite.

 

Lá conheci fogão à lenha, comi carne de carneiro cozida em panela de barro e aprendi a brincar de cozinhado.

 

No quintal vovó tinha um abacateiro e plantações de tomate, hortelã, alfavaca e arruda, pois também era benzedeira. Não tinha espinhela caída ou mau-olhado que ela não desse jeito.

 

Todo Natal a gente montava o presépio com casinhas de caixa de fósforo, areia e tufos de capim. E o menino Jesus fosforescente era o centro das atrações.

 

Um ano Gusto meu irmão, muito sabido, pediu de presente o santinho que ela prometeu para quando morresse. Ele não titubeou: -Ô vovó, então, morra logo!

  

E tinha, é claro, um galinheiro com poleiro onde cuidávamos das galinhas, dando milho, botando para por ovo e acompanhando, em tardes sem fim, a evolução da vida.

 

E, assim como o Cidadão Kane, também tenho o meu:” –Rosebud”  particular, sendo inevitável a lembrança de:

 

Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo…

 

Começos inesquecíveis de um inexorável fim!

 

Redescobrindo Sergipe-Foto Ana Libório

 

 

 

 

 

 

 P.S-Rosebud é o mote de um dos grandes enigmas do cinema:”Cidadão Kane” de Orson welles e “Muitos anos depois diante do pelotão de fuzilamento…” de Cem anos de Solidão de Garcia Marques é considerado por Sérgio Rodrigues um dos Inícios Inesquecíveis da literatura.

Aliás, sobre Cem Anos, um amigo do meu filho costuma dizer que o mundo está dividido entre os que leram e os que não leram Cem anos de Solidão…

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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