Eleição Municipal e Partidos Políticos

No ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu (Consultas nº 1398 e 1407) – e o Supremo Tribunal Federal referendou (MS nº 26602, 26603 e 26604) – que os mandatos eletivos pertencem aos partidos políticos e não aos candidatos individualmente considerados. Em conseqüência, a desfiliação partidária acarreta, em regra, a renúncia ao mandato, eis que o partido político tem direito à sua manutenção. Tudo de modo a assegurar que a representação parlamentar partidária permaneça – durante toda a legislatura – proporcionalmente fiel à representação partidária decidida pelo eleitor.

 

Embora os partidos políticos sejam os verdadeiros titulares dos mencionados mandatos eletivos, admitem-se situações que justificam a mudança de filiação partidária sem prejuízo do mandato, a exemplo de comprovada perseguição política e mudança significativa de orientação programática do partido (ainda de acordo com o entendimento que o STF e o TSE extraíram dos princípios constitucionais).[1]

As eleições municipais de outubro próximo, portanto, serão as primeiras a ocorrer debaixo desse entendimento sobre a fidelidade partidária como um valor constitucional. É dizer: o eleitor, ao efetuar a escolha de seus representantes políticos municipais (Prefeito, Vice-Prefeito e Vereador), já sabe de antemão que, em regra, conferirá ao partido político, e não à pessoa física do seu candidato, o poder de lhe representar politicamente no âmbito municipal. Essa é a grande novidade do presente processo eleitoral.

Daí a importância de o eleitor procurar se informar melhor, não somente em relação à biografia e às propostas dos candidatos, mas sobretudo obter informações precisas sobre o programa de atuação de cada partido político, bem como de seu histórico de atuação, tanto no Poder Executivo como, sobretudo, no âmbito parlamentar. Qual a linha ideológica do partido político? Que ideais defende? Quais projetos de gestão administrativa apresenta? Que bandeiras de luta tem apresentado à sociedade? Como o partido político tem se comportado em votações de interesse da coletividade?

Isso porque, a rigor, de nada adiantará ao eleitor votar em um candidato pelo qual se sinta representado se, mais adiante, eleito, esse candidato resolva mudar de partido, desfiliando-se do partido pelo qual se elegeu. Nesse caso, o “trânsfuga” perderá o mandato, e o eleitor não será mais por ele representado, e sim por um outro vereador, que tenha sido eleito suplente pelo partido/coligação eleitoral (a não ser que demonstre, em específico processo na Justiça Eleitoral, a “justa causa” para a desfiliação, ou seja, a comprovada perseguição política ou mudança significativa de orientação programática do partido).

De igual modo, é preciso que o eleitor atente para o fato de que o seu candidato terá de votar (no caso de vereadores) de acordo com a linha traçada pelo partido, do contrário poderá ser expulso por contrariar as determinações partidárias, e assim também perderá o mandato.

Todo o cuidado, portanto, na hora de votar e sufragar um mandato executivo e legislativo para um determinado partido político ou coligação partidária. O protagonismo do eleitor na democracia representativa se dará por via do protagonismo dos partidos políticos.

Contudo, o que temos observado na atual campanha eleitoral? Os partidos políticos têm se preocupado em expor os seus programas, o seu histórico de atuação enquanto tais? Expor que, na votação de determinado projeto de lei, todos os membros da bancada parlamentar votaram uniformemente, a favor ou contra, por essa ou aquela razão? Apresentar ao eleitor o diferencial de sua atuação administrativa, enquanto gestor da coisa pública? Convencer o eleitor de que aquele partido possui uma forma honesta e íntegra de gerir o dinheiro do povo? Demonstrar as experiências administrativas já realizadas?

Infelizmente, não. O que estamos a assistir é uma campanha focada precipuamente na pessoa dos candidatos, nas propostas (quando apresentadas) dos candidatos, sem estabelecimento do liame partidário, como se não tivesse havido qualquer mudança no sistema da representação político-partidária em relação às eleições anteriores. Em especial na propaganda eleitoral no rádio e na televisão, destinada à campanha para vereador, o que estamos a assistir é aquela mesma exposição folclórica (salvo honrosas exceções) e inútil de candidatos que apresentam seu nome, seu número para votação e, quando muito, alguma proposta inexeqüível para um vereador (por exemplo, construção de praça, de centro esportivo, de ponte, de avenida …).

A “bola” está com os partidos políticos. Foi em nome do prestígio que a Constituição lhes deu que o TSE e o STF, interpretando-a progressivamente, assegurou o direito à preservação dos mandatos em caso de desfiliação partidária sem justa causa. Prestígio, esse, que os partidos políticos, à toda evidência, não estão sabendo aproveitar e, o que é pior, estão a desprestigiar.

Se vamos eleger, em verdade, um partido político para gerir a municipalidade e partidos políticos para nos representar no Poder Legislativo Municipal, o que os partidos políticos que disputam a eleição têm a nos dizer, enquanto tais?

 

Aniversário

 

Esta coluna completa um ano de existência. Em 12/09/2007, escrevi o primeiro texto, denominado “O apagão da transparência no Senado Federal”. Tratava da decisão do Senado Federal de realizar sessão secreta para julgamento do Senador Renan Calheiros, acusado de prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar. De lá pra cá, semanalmente, a coluna tem se dedicado à análise de temas jurídicos de repercussão no cotidiano da sociedade.

Agradeço inicialmente à Infonet, pelo convite para um desafio que se renova a todo instante. Em seguida, agradeço aos leitores e amigos, muitos dos quais, tanto através de e-mail como por via de comentário no próprio site, têm emitido opiniões e participado construtivamente das discussões propostas pela coluna.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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