Julho das Pretas, por Eliane Aquino

Por Eliane Aquino
Vice-governadora de Sergipe 

 

Foto: Danillo França

Inúmeras pessoas da minha geração cresceram sendo as moreninhas, por falta de conhecimento e por sobra de preconceito da sociedade. Ainda hoje muitas crianças negras crescem no Brasil sem se reconhecerem dentro dessa identidade e isso precisa mudar. Eu mesma fui crescendo sem me enxergar negra. Era apontada como a moreninha ou como a “cor de jambo” e isso fez com que eu não tivesse uma identidade sólida sobre a minha origem, já que não há ancestralidade ou história do povo “moreno” ou “cor de jambo” e sim do povo negro.  Com o passar do tempo me viam como indígena (sangue que, com muito orgulho, também corre em minhas veias), mas as lacunas ainda eram grandes.

 

Parece que parte da sociedade ainda possui o desejo de querer nos embranquecer, diminuindo a força, a inteligência e a capacidade do povo negro. Parecem desejar, conscientemente ou não, nos afastar da nossa ancestralidade. E esse debate do autorreconhecimento é extremamente importante. Não nasci uma mulher empoderada, fui me construindo e me empenho todos os dias para não ter medo de encarar desafios e para lutar por um mundo menos desigual. Mas, mesmo tudo isso não impediu minha visão de ser coberta por muitos anos pelo manto do racismo estrutural nosso de cada dia.

 

Minha autodescoberta só foi possível graças a tantas mulheres fortes que vieram antes de mim e que estavam dispostas a descortinar esse véu ilusório da falsa identidade branca. E é nesse sentido que, sempre que posso, trago à pauta a importância de mostrarmos a todos, desde a infância, que os seres humanos são plurais, mas também o quanto é essencial buscarmos nosso autorreconhecimento sendo mulher negra, então, é ainda mais relevante que se tenha uma análise de como você se vê e de como a sociedade lhe impõe ser vista.

 

Nossa negritude precisa ser celebrada e permitida. Não aceito, e sugiro que você também não aceite, ser colocada em caixinhas. Podemos, e devemos, ser o que quisermos. Com o cabelo que quisermos, com as roupas que quisermos, dançando como quisermos. Nossos corpos são nossos e de mais ninguém. Precisamos nos fortalecer, nos unir, nos APOIAR e reconhecer.

 

Por tudo isso, desejo que ano que vem tenhamos uma Câmara de Deputados verdadeiramente plural, com uma real representatividade de muitas mulheres negras que se comprometam com ações afirmativas para reduzir o abismo brutal gerado pelo preconceito e discriminação. Que tenhamos quem tenha voz e vez para nos representar, para enfrentar o racismo estrutural já enraizado em nosso país, para lutar por maiores possibilidades de ingresso no mercado de trabalho, com salários justos e condições dignas; para lutar por um acesso real à saúde e educação de qualidade; para respeitar a diversidade religiosa e cultural.

 

Precisamos de homens e, principalmente, mulheres comprometidos em trabalhar pelo povo e para o povo, apoiando Lula na reconstrução do nosso país e, principalmente, buscando corrigir  os graves retrocessos que ocorreram em todas as áreas do nosso país, especialmente no que diz respeito à assistência social e aos direitos sociais. Chega de deixarmos que os outros nos inventem. Precisamos saber de onde viemos e também que podemos chegar aonde desejarmos. Lembrando sempre que, depois que rompemos as cordas da opressão, ninguém mais nos segura!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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