Por que pensar a educação quilombola promove uma educação cidadã?

Professor Doutor Paulo Roberto Alves Teles

@prof_pauloteles

pauloteles_aju@hotmail.com

Fonte: Cena de candomblé, de Wilson Tibério. Disponível em <http://www.arte.seed.pr.gov.br/modules/galeria/detalhe.php?foto=411&evento=1>. Acesso 01 junho 2022.

 

A concepção de uma sociedade plural e diversificada em seus aspectos étnico-culturais é bastante recente no processo histórico brasileiro. Em termos oficiais, a Constituição de 1988 estabeleceu de maneira ampla em seu artigo 5º e, mais especificamente no capítulo III, seção II, artigos 215 e 216. Ainda assim, em termos de produção historiográfica, a inserção da História e Cultura Afro-brasileira no currículo oficial da rede de ensino somente foi assegurada a partir da Lei nº 10.639/2003, após quase dois séculos caracterizados pela produção de uma historiografia oficial eurocêntrica e, em vários aspectos, estigmatizante.

Somado a isso, além de enfrentar os dilemas de uma produção excludente, também se torna necessário desconstruir a visão de uma sociedade racialmente harmônica pensada a partir de uma visão que buscou homogeneizar a cultura e disfarçar as diferenças e contrastes socioeconômicos marcantes na sociedade brasileira; uma vez que o passado pode ser visto como algo ainda não superado, e o presente como a convergência desses elementos, estrutura e mitos como também, identidades, história e tradição.

Desse modo, é necessária a capacidade de estranheza do historiador perante o tempo em que ele está circunscrito, para que, através dela, seja possível realizar propostas interventivas não apenas de pesquisa como também de ensino e aprendizagem. Eis aqui o desafio apresentado para educadores e pesquisadores da área: a construção de um currículo voltado para a educação quilombola. Diante das possibilidades trazidas pelas recentes reformas educacionais, dedicar-se a compreender uma questão tão complexa como a quilombola nos remete ao entendimento sobre a necessidade de trazer à tona discussões sobre a identidade, sobre a memória, sobre os processos históricos que abrangeram a trajetória de luta e resistência dos povos afro-brasileiros contra a escravização e contra a mentalidade escravizadora.

Ao historiador, tal qual um artesão, cabe tecer esses fios, reunir os seus fragmentos, analisar a qualidade e a veracidade do seu material de pesquisa para, a partir disso, produzir o tecido historiográfico. Eis as habilidades exigidas do historiador, reunir as fontes e atribuir um sentido narrativo e historiográfico a elas. Aos professores de História, cabe se aproximar das comunidades quilombolas, selecionar obras, fontes orais e bibliográficas, como também construir currículos e metodologias de ensino e aprendizagem que atendam às demandas dos grupos remanescentes.

Por fim, mapear essas comunidades no estado de Sergipe, dissociar a ideia de educação quilombola da educação rural, construir redes de compartilhamento das produções culturais dessas comunidades a fim de compor um currículo base e construir formações continuadas para docentes da rede básica de ensino também são desafios a serem enfrentados. Reconhecê-los como necessários são passos importantes, ainda que introdutórios, para uma educação cidadã e democrática.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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