MUSIQUALIDADE, por RUBENS LISBOA

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Cantora: FERNANDA TAKAI

CD: “ONDE BRILHEM OS OLHOS SEUS”

Gravadora: INDEPENDENTE

 

Nara Leão sempre foi uma cantora associada ao bom gosto musical. Quando explodiu nacionalmente com “A Banda”, primeiro grande sucesso de Chico Buarque, a artista franzina, nascida em Copacabana, começou a quebrar o tabu, até então reinante, de que uma boa cantora precisava ter necessariamente uma grande voz. A voz de Nara era pequena, frágil, mas nem isso a impediu de registrar músicas de harmonias bastante complexas.

Precursora em lançar compositores dos morros cariocas, foi também uma das porta-vozes da Bossa Nova, embora somente algum tempo depois tenha vindo efetivamente a gravar canções do aludido movimento musical.

Baseando-se no repertório de Nara, a cantora mineira Fernanda Takai, vocalista do grupo Pato Fu, acaba de lançar, de maneira independente, o seu primeiro CD solo intitulado “Onde Brilhem os Olhos Seus”, verso retirado da letra de “Seja o Meu Céu” (parceria de Robertinho do Recife e Capinam).

Produzido com competência por John Ulhoa, o disco (contendo treze faixas) recebeu a assinatura de Nelson Motta na direção artística, tendo sido dele, inclusive, a idéia inicial do projeto.

Fernanda, assim como Nara, corre meio que na contramão. À frente de uma banda que, bem ou mal, pode ser rotulada como de rock, destacou-se por suas interpretações contidas, diferentemente da maioria que opta pela gritaria. Com um timbre que beira o infantil e com potência vocal que não se caracteriza exatamente pela extensão, sabe compensar isso com interpretações graciosas que conquistam de cara os ouvintes mais exigentes.

Os arranjos são um capítulo à parte. Como beberam de outras fontes (Mutantes e Beatles estão entre as influências assumidas), Fernanda, John e Lulu Camargo (o terceiro integrante da trupe) revestiram as canções com roupagem bem diferente das gravações originais, o que lhes termina conferindo um charme especial. E mesmo as modernidades que pontuam aqui e ali (beats, loops e grooves) são utilizados, inteligentemente, como detalhes e não como pontos de partida.

Assim, transformaram em bons momentos a versão super pop de “Com Açúcar, com Afeto” (de Chico Buarque), o abolerado samba “Luz Negra” (de Nelson Cavaquinho e Irani Barros), o chorinho (agora fox-trote) “Odeon” (de Ernesto Nazareth e Vinicius de Moraes) e até a acelerada releitura de “Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos (de Roberto e Erasmo Carlos). Mas, sem sombra de dúvida, os melhores momentos ficam por conta das faixas “Diz Que Fui Por Aí” (de Zé Kéti e Hortênsio Rocha) e “Canta Maria” (de Ary Barroso), delicadas obras-primas.

O único convidado especial é Roberto Menescal que, com seu violão único, marca presença em “Insensatez” (de Tom Jobim e Vinicius de Moraes), outra canção que caiu muito legal na voz da cantora.

O belo e diferente trabalho gráfico do estojo do encarte vem embalar este trabalho muito bem-vindo que agiganta Fernanda, catapultando-a ao primeiro time das intérpretes brasileiras. 

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantor: JORGE VERCILLO

CD: “TODOS NÓS SOMOS UM”

Gravadora: EMI

 

Desde o começo identificado com a pecha de imitar Djavan, o cantor e compositor Jorge Vercillo necessitou de um certo tempo para conseguir alcançar, de fato, um grande sucesso radiofônico. Quando o fez, emplacou um hit após o outro e passou a ser um dos grandes vendedores de discos nacionais.

Depois do boom, lançou alguns trabalhos equivocados que praticamente nada acrescentaram à sua carreira até que resolveu diversificar um pouco a sua arte, demonstrando vontade de experimentar possibilidades.

É esta a constatação maior a que se chega ouvindo o novo CD que acaba de chegar às lojas através da gravadora EMI. Produzido pelo próprio artista e intitulado “Todos Nós Somos Um” (frase retirada de “Conversando com Deus”, espécie de livro auto-ajuda), enquanto sonoridade não traz, de fato, mudanças substanciais com relação aos seus álbuns anteriores. As costumeiras pegadas pop estão lá, como também se fazem presentes as influências djavaneanas que pipocam aqui e ali, seja no canto recheado de falsetes, seja em várias passagens melódicas, embora seja honesto constatar que agora a personalidade própria de Vercillo já aflora inquieta.

No entanto, no que diz respeito aos ritmos presentes nas doze faixas que compõem o repertório, constata-se uma diversidade nunca antes esboçada. É verdade que Vercillo vem, há algum tempo, abrindo o seu leque de parceiros numa tentativa clara e elogiável de evitar se repetir.

No CD recém-lançado, ele apresenta composições inéditas divididas com Fátima Guedes, Paulo César Feital, Marcos Valle, Jota Maranhão e Dudu Falcão, além de assinar sozinho as demais. Se a conhecida verve romântica continua intacta, o que se constata através de faixas como “Cartilha”, “Devaneio”, “Deve Ser” e “Ela Une Todas as Coisas” (esta integrante da trilha sonora da telenovela global “Duas Caras”), Vercillo mostra-se igualmente competente em incursões por ritmos nordestinos (“Camafeu Guerreiro” e “Xote do Polythema”, que conta com a participação especial de Guinga nos vocais). Os melhores momentos, no entanto, ficam por conta do ótimo samba “Tudo Que Eu Tenho” e da contagiante faixa-título, belíssimo rock de batida pop.  

Se não chega a ser um álbum maravilhoso, é um dos melhores já lançados por Vercillo e se torna recomendável por explicitar a vontade do artista em não se acomodar, o que se trata de grande mérito em um mercado fonográfico que prioriza (quase sempre) o lucro mais imediato.

 

 

N O V I D A D E S

 

·               O cantor e compositor sergipano Paulo Lobo está lançando seu segundo CD curiosamente intitulado “Loboratório”. No bojo, é um trabalho mais simples que o seu disco anterior, mas isso não significa que a qualidade não tenha se mantido. Paulinho (como é conhecido no meio musical sergipano) apresenta grandes momentos criativos e isso fica claro em faixas como a animada “Quer Saber?” (parceria com a sempre antenada Ilma Fontes), a bela bossa “Impressões Digitais” (com nítida influência caetaneana), o ótimo samba “Um Toque” (de inspirados versos) e a entregativa “Descontrole Remoto” (com programação de teclados a cargo do excelente Diogo Montalvão). A voz suave do cantor destaca-se especialmente em “Com Você ao Meu Lado” e a canção “Menos Mal” conta com a participação especial de Ronise Ramos, promissora intérprete de voz grave e potente. Gravado no Estúdio 3, o álbum traz ainda a faixa bônus “Por que Você Demora Tanto?” (maior sucesso do artista até hoje, depois de “Ruas de Ará”) em gravação original feita em Recife no verão de 1986. Paulo Lobo continua bacanérrimo!

 

·               Estreou semana passada, no Rio de Janeiro, o espetáculo “Três Meninas do Brasil” que reuniu, no mesmo palco, as cantoras Rita Ribeiro, Jussara Silveira e Teresa Cristina. Dirigido por Jaime Alem, o maestro de Maria Bethânia, o show deverá ser registrado em áudio e vídeo, dentro em breve, a fim de virar CD e DVD ao vivo que deverão chegar ao mercado, através da gravadora Biscoito Fino, no primeiro semestre do próximo ano. Revezando-se em solos, duetos e trios, as intérpretes mostraram, no repertório, canções de várias épocas e estilos, a exemplo de “Nu com a Minha Música” (de Caetano Veloso), “Pôxa” (de Gilson de Souza), “Maiúsculo” (de Sérgio Sampaio), “Mulher Nova, Bonita e Carinhosa Faz o Homem Gemer sem Sentir Dor” (de Zé Ramalho), “Chula Cortada” (de Roque Ferreira) e “Minha Tribo Sou Eu” (de Zeca Baleiro).

 

·               A gravadora Eldorado tem relançado, quando em vez, alguns títulos raros e muito interessantes. Um deles é o único disco gravado em vida pelo compositor paulista Henricão, artista pouco conhecido mas que emplacou algumas canções nas vozes de Elis Regina, Elza Soares e Carmem Costa. Suas criações mais conhecidas (e que estão no álbum ora comentado) são, sem sombra de dúvida, “Marambaia” e “Está Chegando a Hora”, mas seu talento se torna incontestável quando se ouvem pérolas como “Sou Eu”, “Andorinha”, “Não Faça Hora” e “Meu Crime”. Vale conhecer!

 

·               Andréia Dias é cantora corretíssima. Dona de voz com timbre mais que agradável, é super afinada e possui ginga e malícia em doses certas. Conhecida por seu trabalho nas bandas Glória e Donazica, ela acaba de lançar, através do selo Scubidu Records, o seu primeiro CD solo intitulado “Vol. 1”. Também como compositora, Andréia é uma grata revelação. Autora de todas as onze faixas do disco (somente em duas delas, divide parceria com Iara Rennó), sua verve criativa passeia pelo cotidiano e por críticas (ora sutis, ora vorazes) a coisas que, por vezes, passam despercebidas ao ser humano comum. Produzido por Guilherme Kastrup, o som do álbum namora um brega inteligente que dá gosto de ouvir e as canções passeiam pelo rock, pelo blues e pelas trilhas do pop contemporâneo, desaguando, em vários momentos, na batida malandra do samba. Dentre os destaques estão canções como “Asas”, “Bode” e “O Fio da Comunicação”. No entanto, os melhores momentos ficam mesmo por conta da hilária “Seu Retrato” e da deslavada “Não Mais que um Dia”. A única faixa dispensável é a barulhenta “Veia Urbana”, mas não chega a perturbar a boa imagem que se tem dessa auspiciosa estréia fonográfica.

 

·               A próxima novela das sete da noite da Rede Globo começou a ser formatada e já recebeu seu título definitivo: “Beleza Pura”, homônimo à música de autoria de Caetano Veloso, lançada originalmente no álbum “Cinema Transcendental”, de 1979 (aquele que tem a canção “Aracaju”). Para a abertura da trama, a regravação será feita pelo Skank.

 

·               O selo Sala de Som acaba de pôr nas lojas o novo CD do cantor Pedro Lima, mais conhecido por sua marcante atuação, durante quinze anos, junto ao grupo vocal Garganta Profunda com o qual chegou a gravar cinco discos. Intitulado “Futebol Musical Brasileiro Social Clube”, o álbum, que recebeu a assinatura de André Agra na produção, reúne em onze faixas temas inspirados no futebol. As canções, todas elas sambas, foram compostas por grandes nomes da nossa música, a exemplo de Gilberto Gil (“Meio do Campo”), Chico Buarque (“O Futebol”), Gonzaguinha (“Geraldinos e Arquibaldos”), Milton Nascimento (“Aqui é o País do Futebol, parceria com Fernando Brant), Zeca Baleiro e Fágner (“Canhoteiro”). Pedro tem possante voz grave que passeia com desenvoltura pelos animados arranjos, transformando esse álbum em uma agradável surpresa. Para completar, há ainda as participações especiais, nos vocais, de Zezé Motta, Nilze Carvalho, Carol Saboya e Neguinho da Beija Flor.

 

·               Jay Vaquer chega ao quarto CD apostando no seu lado de autor: todas as doze faixas do novo álbum são de sua autoria. Produzido por Dunga, “Formidável Mundo Cão”, um lançamento da gravadora EMI, mostra um cantor de grandes recursos vocais (a exemplo de sua mãe, a excelente Jane Duboc), mas que ainda precisa amadurecer e se diversificar no que tange ao quesito composição. Dentre as canções apresentadas, dá para destacar “Longe Daqui”, “Fomos”, “Alguém Em Seu Lugar”, “A Propósito” e “Estrela de um Céu Nublado”, esta contando com a participação especial, nos vocais, de Meg Stock (do grupo Luxúria).

 

·               E pela primeira vez Roberto Carlos não irá lançar o seu CD anual que costuma chegar às lojas no mês de dezembro. Acomodado, o Rei cada vez mais tem lá o seu tempo próprio. Quem sabe no próximo ano…?

 

·               E a nossa MUSIQUALIDADE deseja aos seus inúmeros leitores um Feliz e Santo Natal, com muita paz, amor e saúde!

 

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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