Móveis dos palácios

Os móveis dos palácios permanecem, enquanto os seus ocupantes partem.
Se os tamboretes e assentos, imponentes tronos ou confortáveis poltronas, as simples cadeiras palacianas pudessem ter vida, registrariam bastante, e bem poderiam testemunhar os acordos traçados, as tramas ali tecidas, os conciliábulos sinistros bem urdidos e obscuros, por escondidos e nunca vindo à luz, descobertos.
Os móveis, se não acobertam, contemplam tudo, mesmo sem poder reclamar de quem lhes trata, bem ou mal, em sua humilde serventia.
No máximo, em sua assentia, os móveis podem ranger, expressar um esgar indefeso, reclamar de um peso ou sobrepeso suportado, resistindo até com galhardia, a tristeza e a vileza de abrigar quem jamais o mereceria, por mal proceder e degenero.
Se os móveis por uso se dilaceram, cumprem sua missão até o fim sem se degenerarem.
Degeneros à parte, há homens picaretas, outros proxenetas e capazes de qualquer treta, verdadeiros protozoários que no seu parasitismo, exibem-se chupistas em sôfrego pragmatismo, porque, em sua ação, são apenas exploradores e papa-jantares de todos os cenários e manjares, nunca percebidos nem desvendados, por posarem como  verdadeiros móveis de todos os palácios.
São eles os insubstituíveis medalhões, os grão-vizires servis a todos os governos, cetros e coroas, em assunção, revezamento rotineiro ou mesmo quando há deposição, sem lhes conceder na queda um mínimo de fidelidade, lealdade ou solidariedade.
Fidelidade? Para que, se isso restou démodé e até para o cônjuge, o amor jurado infinito restou durável quando conveniente?
Lealdade? Para que, se mesmo jurando a Deus, há a certeza do perdão remido no final, mesmo em falso arrependimento e em paga de rala penitência?
Solidariedade? Existe isso em tempos bicudos, em que por farinha pouca sempre se diz que é bom se esfalfar para comer o bom pirão primeiro?
Pois é! Os governos se alternam e tudo obedece a máxima notável do Príncipe Don Fabrízio Salina: “é preciso que tudo mude para permanecer igual”.
Don Salina, só para lembrar, é o decadente nobre, personagem de “Il Gatopardo”, obra fundamental de Tomazo de Lampedusa, encenada no cenário conturbado do Rissorgimento”  italiano, que bem se aplica aos nossos dias, todos os dias, na República Brasileira.
Não está assim desde a recente eleição e a posse do governo Bolsonaro?
Não se esperava que o governo Bolsonaro fosse um marco de mudanças radicais?

 

Não era seu o discurso eleitoral denunciando que vivêramos praticamente vinte e quatro anos de governos “de esquerda”;  uns envergonhadamente como o de Fernando Henrique Cardoso, o guru “Sorbonnard “ das esquerdas descabeçadas, outros mais bem definidos como o do notável líder sindical Lula da Silva, passando pelo da feroz guerrilheira Dilma Rousseff, e até por Michel Temer, o “enfant gâté”  do antigo MDB, que se assumira sempre assim, desde a origem por nascedouro, entre “moderados e autênticos” contra a ditadura?
A mudança, no meu entender e de muitos, se faria agora, afinal o Capitão Bolsonaro fora eleito contra tudo e contra todos, com um discurso bem definido e diferenciado.
E esperar-se-ia, por ousada promessa, dita arrogante e petulante por seus críticos, que o seu governo baniria toda a companhia “esquerdista” que vigera e mandara por tantos anos seguidos, e agora todos estariam, em tese expelidos, por magna decisão eleitoral.
Eleição no Brasil, todavia, vale tanto quanto campeonato de futebol.
O eleitor depois da apuração dos votos igual ao torcedor derrotado que sai cabisbaixo da arena, logo refaz o fôlego tramando recuperação num próximo título por revanche
Ora, campeonato de futebol é coisa farta em terra pátria!
Temos os campeonatos estaduais em dois turnos com direito a título e troféu, depois vem a Copa Brasil em grupos A, B, C, D e o escambau, Campeonato Brasileiro, Taça Libertadores da América, Sul Americano, etc, etc, matérias para muitos comentários e videoteipes.
Assim, o campeão de ontem não vale nada! “O que foi não é nada!”, como diria o poetar das aves rápidas que passam sem deixar rastros.
No caso do pleito eleitoral o comportamento é parecido com o voo dos urubus; elege-se um Presidente da República com maioria absoluta de votos em dois turnos, comemora-se a vitória com alaridos de carnaval ou denúncias de fraude em carência de VAR, demora-se um tempo enorme para a posse do eleito, e com menos de seis meses de empossado, escaramuças são feitas para desobedecer as suas determinações, quiçá provocar seu impeachment, num eterno retorno de sucessivos golpes parlamentares e/ou jurídicos.
E os “móveis dos palácio”, em resistência ativa ou passiva, esforçam-se em se mostrarem indispensáveis, daí os novos Ministros serem boicotados na sua ação; não podendo demitir para afastar obstáculos, nem desatar nós tentaculares da máquina pública.
Enquanto isso o tempo passa, o tempo voa, e a inércia vence tudo, criando ferrugem em roldanas e mancais, o que é uma boa!
E nessa inércia mais que boa, não se pode trocar um Diretor, um Chefe, permutar um Embaixador, porque todos viraram ostras bem agarradas no poleiro público.
E haja falta de semancol para quem posa assim!
Tinha sentido, por exemplo, um homem como Joaquim Levy , por maior mérito possível que o apresente,  ser o dirigente maior do BNDES, entidade sempre acusada de esconder “caixas pretas” de concessões secretas nunca desvendáveis?
No meu viver, conservo móveis, uns mais antigos, quarenta e seis anos só comigo, outros mais novos, mas não tão novos.
Eu os conservo porque são só meus, até por herança. Não preciso renová-los por serem companheiros de várias gerações de minha vida.
Quanto aos “móveis do palácio”, é bom renová-los periodicamente.
O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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