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“Se for de paz, pode entrar”, dizia Jorge Amado ao receber os seus convidados em sua lendária casa no bairro boêmio do Rio Vermelho, em Salvador. Hoje a frase estampa o tapete de boas-vindas da casa, transformada em Memorial Casa do Rio Vermelho, aberta ao público em 2014 com concepção do artista e desingner Gringo Cardia. A energia é tamanha que parece ser Jorge e Zélia os guias. As baianidades de seus personagens, aguçados de amores com cheiros de dendê, sorrisos cotidianos de personagens das ruas, trejeitos, sons e cores do cotidiano, festas e a religiosidade estão presentes neste roteiro. O post é um convite a conhecer a intimidade de Jorge Amado e Zélia Gattai, e seus personagens.
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No número 33 da rua Alagoinhas abriga uma residência ladeada por altos muros e frondosas árvores vistas ainda do lado de fora. Não poderia ser a localidade diferente: o bairro Rio Vermelho, em Salvador, área que transborda histórias de pescadores, abriga a Casa de Iemanjá, as famosas baianas do acarajé e, sim, a residência onde morou Jorge Amado e sua Zélia Gattai.
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Os azulejos artesanalmente fabricados por Udo Knnof que adornam o muro frontal já demostram muita arte pintados por Carybé – artista amigo, cujas peças tão espalhadas pela casa. O tapete de entrada traz uma frase Amadiana: “Se for de paz, pode entrar”. E assim, o Memorial Casa do Rio Vermelho dá as boas-vindas à intimidade de Jorge e Zélia.
Já na escada de entrada, o visitante sente o cheiro de ervas plantadas no jardim, a frente de uma imagem de Jorge. O jardim transborda em energia, tranquilidade e a sensação de que os guias serão os próprios donos da casa.
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Jorge e Zélia passam a comandar a visita que começa pelos tradicionais jardins com bancos de mosaico proposta pela artista Lina Bo Bardi, quando Zélia e Jorge ainda eram vivos, onde foram lançadas as cinzas de Jorge e Zélia, além de símbolos religiosos, animais, o Exu, e dos sapos presentes em toda a casa. Nas tendas do jardim, vídeos aguçam as sensações com histórias temáticas do casal, como “Jorge Amado e o candomblé”, além de falas de amigos, como Caetano, Nelson Pereira dos Santos, Jards Macalé e Sônia Braga, entre outros.
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O visitante adentra a sala e se depara com móveis simples em alvenaria, mas com toque de bom gosto, despojamento e funcionalidade, além de objetos – a máquina de escrever, os óculos, os apontamentos feitos à caneta dos romances – e muita obra de arte dos amigos que se hospedaram por lá, a exemplo da porta totalmente adequada por Carybé e porcelanas de Picasso. Parece que tudo celebra, festeja e aguça os sentidos. E assim Jorge e Zélia vão desenhando sua casa como o “Templo do Amor”, frase dita pela neta Maria João, sobre a relação da avó com a Casa do Rio Vermelho, templo em que viveram por cerca de 40 anos.
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Da sala, parte-se para o quarto de hóspede, local em que se recebia bem os amigos como Neruda, Glauber Rocha, Tom Jobim, Polanski, Sartre e Simone de Beauvoir, numa cama de alvenaria decorada com azulejos. Lá também estão expostos algumas camisas que marcaram o perfil de Jorge: coloridas, festivas e estampadas.
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De lá o visitante adentra em um dos cômodos mais sensacionais e que estão os cheiros e sabores dos romances de Jorge Amando: a cozinha. A chef Dadá interage com o público com o sorriso registrado da baiana, aguçando o paladar entre pratos de bobo de camarão, vatapá, moqueca, xinxim, acarajé, passarinha frita, bolinho de estudante, punheta, entre outros. Dadá ensina a preparar, cujas receitas o visitante pode interagir e mandar para o próprio e-mail.
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O segundo quarto de hóspedes vem depois. O lugar foi transformado em sala de leitura, com vídeos de personalidades (de Sônia Braga, Margareth Menezes, Mariene de Castro, Maria Bethânia a Ivete Sangalo) lendo trechos de obras de Jorge, acompanhados por fotografias e ilustrações. Alguns cômodos seguintes, a exemplo da biblioteca, ganharam projetos museográficos com vídeos, efeitos sonoros, fotos e exposição de objetos de uso pessoal dos ilustres moradores.
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Já o antigo escritório virou biblioteca, com algumas das principais traduções dos seus livros, um vídeo que resume algumas obras, máquinas fotográficas que pertenciam a Zélia, gravuras do baiano Calasans Neto, cordéis e repentes para se ouvir.
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A área externa é onde o visitante se depara com milhares de ladrilhos de azulejos doados por Udo Konff, além de mais obras de arte pelas paredes e a piscina central, entre jardins onde também se deparam com muitas imagens de sapos, animal que Jorge Amado criava em sua casa.
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O ambiente passa para a intimidade do casal, quando se adentra os quartos dos filhos e de Jorge e Zélia. Em estantes, cartas bem preservadas de ilustres personalidades mundiais, além de roupas e assessorias. É sensacional passar pelo quarto e também ver as pinturas do sergipano Jenner Augusto em vidros de portas e janelas.
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O passeio finaliza em um cômodo externo onde são expostos souvenires de mais de 110 países visitados por ele. O banquinho de azulejo do cômodo é pura energia para finalizar toda essa intimidade. Jorge e Zélia lá se despedem.
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Dicas de viagem
A Casa funciona das terças a domingos, das 10h às 17h. Às segundas-feiras não funcionam nem nos dias 24, 25 e 31 de dezembro, 1 de janeiro e durante o carnaval. O valor do ingresso é R$20 público em geral, R$ 10, estudantes e pessoas a partir de 60 anos, mediante a apresentação de documento comprobatório. Entrada gratuita às quartas-feiras. São aceitos cartões de débito, crédito e espécie, na portaria do Memorial. Crianças menores de 6 anos têm gratuidade.
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Comprada em 1960 com dinheiro da venda dos direitos do livro “Gabriela, Cravo e Canela”, de Jorge Amado, para a MGM, a casa mais tarde se transformou no título do livro de Zélia Gattai publicado em 2002 contando a história vivida pelo casal quando residiu no imóvel. No local, os escritores receberam visitas ilustres, como Glauber Rocha, Pablo Neruda, Tom Jobim, Dorival Caymmi, Roman Polanski, Jack Nicholson, Sartre e Simone de Beauvoir, só para citar alguns;
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A dica é percorrer sem pressa os cômodos e assistir aos vídeos. A visita guiada dura, em média, 40min e depois o visitante fica a vontade. Pode-se fazer visitar quer não sejam guiadas, mas vale a pena aguardar o grupo. É uma boa oportunidade para entender um pouco melhor a dinâmica da casa e descobrir curiosidades;
A cozinha inicial da casa era pequena e depois de alguns anos o casal comprou o terreno vizinho e construiu uma nova cozinha, mais outro quarto de hóspedes, hoje transformado em uma sala de projeção;
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Há uma lojinha com itens interessantes, como os livros dos escritores, chaveiros, camisas, entre outros;
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Um bom local para se passar um tempo é o gaveteiro que fica no quarto da filha do casal, contendo cartas do período em que Jorge estava exilado (ele foi preso 11 vezes e passou 19 anos entre países como França, Chile, Rússia, Polônia, Uruguai e Argentina). Há correspondências de Drummond, Yoko Ono, Caymmi, Monteiro Lobado, Oscar Niemayer e Érico Veríssimo, além de cartas para os netos.
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Onde se hospedar: Ao visitar Salvador, uma dica de hospedagem custo/ benefício, pertinho dos principais meios de transporte e que pode ser um bom apoio para se conhecer todos os atrativos da capital baiana é o Real Classic Bahia, situado na R. Fernando Menezes de Góes, 165. Em frente ao hotel fica o Jardins dos Namorados, um belo calçadão com vista para o mar e que no entardecer enche de baianos e turistas. A noite, a diversão é garantida. Telefone de contato (71) 3028-1600;
Como chegar: a Casa fica numa área residencial do Rio Vermelho, não servida por transporte público. O estacionamento na rua é difícil também. O melhor é ir e voltar de táxi desde o seu hotel ou desde a parte comercial do Rio Vermelho, que é bem servida por transporte público.
Gastroterapia
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O acarajé no largo do Rio Vermelho ou da Mariquita é um, sem sombra de dúvida, a dica para este roteiro. O bolinho de feijão fradinho tipicamente baiano e frito no azeite do dendê e recheado com vatapá, caruru, camarão e cortadinho de tomate, cebola e pimentão. Exposto em tabuleiros, as baianas vestidas a caráter também vendem passarinha (o baço do boi frito), doces, peixe frito, bolinho de estudante e a punheta. Não deixe de apreciar também do doce de tamarindo, fruta com sabor forte e azedinho.
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Fotos: Silvio Oliveira
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